27 de setembro de 2012

O refluxo da grosseria e o retorno da polidez

Voltando aos nossos assuntos concernentes à cortesia, recordo-lhes que no post do dia 9 p.p. (Revolução Francesa e a supressão do ornato nos trajes) foi destacado a influência dos trajes na Revolução de 1789 e como esta odiava o ornato, pois isso favorecia a desigualdade natural desejada por Deus. 

Para hoje seguem novos trechos do livro “A HISTÓRIA DA POLIDEZ — de 1789 aos nossos dias”, nos quais o autor, o Prof. Frédéric Rouvillois. Depois de tratar de uma como que agonia da polidez (no período da Revolução Francesa), mostra que em seguida ocorreu entre os franceses uma enorme apetência pelo retorno das boas maneiras, um horror pela impolidez grosseira imposta pelos revolucionários em nome do mito igualitário. 
“O ataque contra a polidez tem início no momento em que a Revolução Francesa se radicaliza, no fim de 1790, se acentua no verão de 1792, quando os sans-culottes ingressam na cena política, e culmina sem dúvida no começo do ano II, nos meses seguintes à queda dos girondinos. É então que são feitas as proposições mais audaciosas, que se generaliza o tratamento por tu e que se trata de punir aqueles que, não respeitando o novo ‘decoro’ democrático, se mostram, ainda, homens do passado, amigos do Antigo Regime. A escalada de poder de antipolidez revolucionária acompanha, portanto, o processo de radicalização. 

No entanto, o movimento se esgota rapidamente. Sofre, como uma chicotada, a queda dos hebertistas e da extrema-esquerda da Revolução, eliminados pelo comitê de saúde pública no fim de março de 1794, e o subsequente refluxo do partido dos sans-culottes. 

É nesse momento que um certo Bouin, num libelo intitulado Reflexões sobre os abusos de autoridade cometidos pelo comitê revolucionário da seção do templo, denuncia como perigosa para a Revolução aqueles que a ‘encaram como algo que nos leva a um estado de grosseira e rusticidade’, notadamente ao tratar com rudeza e por tu as mulheres, ‘em relação às quais o tratamento tu é inconveniente em todos os sentidos, pouco generoso e pouco moral’. 

Ocorre então a estocada de Parthe: ‘Sem dúvida, esse tratamento é a linguagem da igualdade, mas por que empregá-lo em relação às mulheres, que, em todos os outros níveis, nós nos recusamos a encarar como nossas iguais, já que não lhes concedemos os mesmos direitos?’. [...] 

Esse refluxo da antipolidez se acelera após o termidor e a queda de Robespierre — tornando-se então o fato de zombar da ‘civilidade’ jacobina uma forma de tomar partido, e um meio também de exorcizar a malfadada lembrança do Terror. [...] 

Retorno do tratamento proibido durante a Revolução Francesa 
Muito cedo, os antigos usos recuperarão seu direito de cidadania... Predição rapidamente confirmada, sobretudo no nível da linguagem, com o retorno dos termos interditos senhor ou senhora... 

Pouco a pouco a palavra cidadão tende a parecer irrisória e ridícula, e muitos não a empregam senão para os subalternos, como para lhes acentuar a inferioridade, o que tem por efeito exasperar os ‘patriotas’.(1) Antes sacralizado, o título se torna risível. 

Em fevereiro de 1798, o deputado bretão Jean-René Gomaire propõe adotar uma lei visando abolir o uso das palavras seu e senhor nas letras de câmbio, onde elas tendem a reaparecer cada mais com mais frequências; no dia 16 de abril, uma comissão especial produz um primeiro relatório que renova, com todas as firulas, a antipolidez jacobina: ‘Certamente’, concede o relator, Gerla, ‘eu não pretendo banir a polidez do comércio da sociedade, mas a urbanidade republicana não tolera as fórmulas de um regime escravo’, como senhor, que significa padrão, e, portanto implica ideias ‘incompatíveis com nosso pacto social’. Daí a necessidade de ir ainda mais longe, estendendo a proibição a ‘toda sorte de relações sociais’.(2) A proposta será adotada por unanimidade pelo conselho. Mas as coisas não param por aí. 

Num segundo relatório, datado de 22 de julho do mesmo ano, Gerla declara com ênfase que é preciso cogitar sanções; e, a esse propósito, desenvolve o lado desesperado de seu intento. É preciso, escreve ele, agir com severidade, principalmente contra o uso verbal, o uso cotidiano desses termos. Isso é preciso ao mesmo tempo porque a maioria republicana ‘aguarda medidas penais com impaciência’, a fim de que o mal não prospere, e para ‘propagar’ o uso do título cidadão entre todos aqueles que ‘hoje o desdenham’.(3) 

À falta de uma lei que não será adotada, o governo republicano, apegado a seus símbolos, exige ainda, em 1799, que as camareiras dos teatros parisienses digam cidadão aos espectadores, em vez de senhor.(4) 

Nesse época, um comissário de administração ou um agente público que empregue esse termo suspeito (senhor ou senhora) é passível de perseguições. Mas nada disso acontece: o uso antigo retorna numa irresistível restauração que de resto suscita inúmeros incidentes, como em 1795, quando um jovem vendedor de refrescos é chamado às falas por um padeiro que ele havia chamado de cidadão. 

Apesar das ordens, ninguém mais se incomoda, mesmo em público, ao empregar as palavras interditas ou ao conspurcar os títulos obrigatórios: apenas um ano após a queda de Robespierre, o autor de um panfleto antijacobino não hesita em introduzir seu libelo com o uso desta frase, que soa como uma afronta ao igualitarismo: ‘Recebi, senhor, a carta infinitamente polida que vós me fizestes a honra de endereçar...’.(5) 

A velha e aristocrática polidez francesa 
Assim como a palavra cidadão, e pelas mesmas razões, o tratamento tu não sobreviverá por muito tempo ao termidor. No dia 13 de março de 1795 (23 do ventoso do ano II), no Café de Foy, eclode um pequeno tumulto porque alguém ousou tratar por tu a um general.(6) [...] 

A antipolidez igualitária e democrática parece ter desaparecido na prática — mesmo entre os republicanos militantes e na classe operária, e só as individualidades excepcionais, os ‘desbocados das fábricas’, continuam a afetar uma grosseria de princípio, diluviana e contestatária. Em 1869, Ernest Renan, revertendo a perspectiva, vê exatamente aí a garantia de que esse país [França] jamais se tornará (verdadeiramente) republicano: ‘A monarquia’, escreve ele, ‘responde às necessidades profundas da França. Nossa amabilidade só é suficiente para fazer de nós maus republicanos. Os charmosos exageros da velha polidez francesa, a cortesia que nos põe aos pés daqueles com quem nos relacionamos é o contrário dessa secura, que dá ao democrata o sentimento perpétuo dos seus direitos. A França não se sobressai senão no raro, não ama senão o distinto, não sabe realizar senão o aristocrático’.(7) 

Se a antipolidez persiste é, portanto, de modo marginal, no interior de grupos mais radicais, ou em certos momentos de crise. 

Tentativas de retorno da trilogia revolucionária 
A revolução de 1848, notadamente nos primeiros dias, parece, porém, estar a ponto de reatar com a antipolidez dos sans-culottes. É o que se ressente Balzac, ao escrever à madame Hanska, que estava na Polônia, em carta de 26 de fevereiro de 1848: ‘Paris está em poder da canalha mais vil. Penso em preparar minha partida, pois as medidas mais revolucionárias se sucedem com rapidez. Qualquer cidadão é guarda nacional. Enfim, já foi pronunciada a trindade fatal: LIBERDADE, IGUALDADE, FRATERNIDADE. Toda gente se trata por tu’.(8) 

Em Paris, no clima de insurreição que sucede à queda da Monarquia de Julho, aqueles que a si próprios se qualificam de ‘montanheses’, a exemplo de seus modelos de 1793, não usam o termo senhor senão como forma de insulto, para se dirigir aos suspeitos de serem reacionários, inimigos da república. É o que relata certo Chenu, ex-capitão da guarda do chefe da polícia montanhesa, Caussidière. Interpelado por um subordinado, que o trata por ‘senhor chefe’, ele imediatamente o corrige: ‘Diga cidadão’. Um pouco depois ameaçado de ser substituído, o cidadão chefe se exalta: ‘O primeiro que vier tomar o meu lugar, eu acabo com ele na porta. Pois eu quero que esses senhores’ — e ele sublinha a palavra — ‘fiquem sabendo que ninguém substitui Caussidière [...] Tu, capitão, tu vais me organizar militarmente um exército revolucionário’.(9) O fortalecimento do partido da ordem e a repressão a esses partidos extremistas, após as jornadas de junho, porão um termo a isso”. 
________________ 
Notas: 
(1) Cf. F. Brunot, Histoire de la langue française, t. IX, 2ª parte, p. 686. 
(2) Gerla, Rapport sur proposition d´abolir l´usage des mots sieur et monsieur dans les lettres de change, De l´Imprimerie nationale, germinal do ano VI, pp. 3, 5. 
(3) Second rapport sur les anciennes qualifications, De l´Imprimerie nationale, termidor do ano VI, pp. 5, 8-9. 
(4) Cf. F. Brunot, Histoire de la langue française, t. IX, 2ª parte, p. 687. 
(5) Tous les parties dévoilés, C.F.Patris, 27 do fruidor do ano III, p. 1. 
(6) A. Soboul, Les Sans-Culottes parisiens en l´na II, p. 657. 
(7) Domestic Manners of the Americans, New York, Knopf, 1949, p. 186; ed francesa: Baudry, 1832. (8) H. de Balzac, Lettres à Mme Hanska, Les bibliophiles de l´original, 1971, t. IV, p. 212. 
(9) A. Chenu, Les Conspirateurs, Garnier Frères, 9ª ed., 1850, pp. 87, 92.

24 de setembro de 2012

Guerra às diferenças, uma investida fútil


§  Leo Daniele

Na História da humanidade, exceto nos períodos de decadência, sempre existiram abundantes diferenças, mas em nossos dias estamos vivemos uma radical e truculenta guerra a elas. 

Por exemplo, as diversidades de idades estão relativizadas. O que antigamente era “um homem feito”, hoje frequentemente é, como disse alguém, um “adulto de bolso.” Ou seja, um adulto infantilizado. Quase não conta mais, para os efeitos práticos, que a pessoa tenha ou não atrás de si muitos anos de sabedoria acumulada. Ou, se conta, é para que lhe seja negado emprego por “excesso de idade”, o que, conforme o ramo, já começa a acontecer aos 30 anos. Por mais que coloque de lado qualquer ideia de dignidade e procure parecer jovem, esportiva, risonha, a pessoa não conseguirá ter pleno trânsito, nem na sociedade em geral, nem mesmo entre seus coetâneos. Pleno trânsito quase só possuem os que, por sua condição, têm pouca experiência da vida. 

Afirmou Plinio Corrêa de Oliveira: “Ter a hierarquia do conhecimento invertida é uma experiência completamente nova em nossa sociedade. Por assimilarem a mídia digital com mais rapidez, crianças e jovens hoje têm uma autoridade em relação aos adultos que nunca tiveram”.[1] Por exemplo em termos de cibernética, quase sempre os mais jovens brilham, enquanto os adultos desbotam. 

Fala-se em promover um “homem pardo”, ou um “homem bege”, a saber, a média cromática entre o branco, o preto, o vermelho e o amarelo. Um homem indeterminado, sem raça definida, destituído o quanto possível de características próprias. Assim, a pretexto de acabar com o racismo, seria corrigido um “erro” da natureza. Ora, a natureza é uma obra de Deus. Quem assim pensa, julga ter altura para corrigir a Deus? 

A palavra “unissex”, tão corrente, mostra a tendência à fusão dos sexos, tanto quanto o permita a natureza. A voga do homossexualismo está para os sexos como o “homem bege” está para as raças. E o absurdo chocante do casamento homossexual é apresentado como “normal”, postas de lado absurdamente as diferenças mais primárias e mais evidentes. 

Na França, está sendo aberto o casamento e a adoção aos casais do mesmo sexo como "uma exigência da igualdade", exigência esta publicada no famoso jornal católico La Croix.[2] 

O meio termo em todos os campos é a grande obsessão. Observa Edgar Morin: “O homem se efemina: fica mais sentimental, mais terno, mais fraco. Ao pai autoritário sucede o pai maternal, ao marido-chefe o companheiro [...] Inversamente, a emancipação masculiniza certas condutas femininas: a autodeterminação sociológica adquirida pela mulher se torna autodeterminação psicológica [...] A mulher está presente por toda parte, mas a mãe envolvente desapareceu.”[3] 

Quase não se notam mais as diferenças entre pais e filhos, esposas e concubinas, homens normais e tarados, sóbrios e bêbados, professores e alunos, patrões e empregados, ricos e pobres, índios e “cara-pálidas”, bem educados e cafajestes, civilizados e bárbaros, padres e leigos, história e devaneio, fato e versão, realidade e ficção, música e ruído, obras de arte e brincadeiras de mau gosto. Por vezes, fico pensando que ‒ por mãos humanas e por vezes mãos sacerdotais ‒ até o sagrado vai sendo despido de seus véus de mistério, para poder habitar no vale poluído de uma humanidade em liquidação de si mesma. 

Manifestações de uma tendência ainda mais extremada apontam para amortecer as diferenças existentes entre os homens e os bichos. Fala-se cada vez mais em “direitos” dos animais, constroem-se hotéis para gatos (gatil), escovam-se os dentes de cachorros[4], promove-se suas luxuosas núpcias,[5] depois da morte seus corpos são enterrados em “cemitérios” com direito a lápide e flores, etc. De acordo com o projeto de Código Penal, o abandono de um cão é punido com de 1 a 4 anos de prisão, enquanto o abandono de incapaz, pelas regras atuais, merece apenas de 6 meses a 3 anos de prisão. O cão vale mais. Parece uma brincadeira de péssimo gosto![6]

Assim como muitas doenças apresentam uma fase aguda, à qual sucede um período crônico, talvez se possa dizer que o igualitarismo tem uma fase aguda e uma crônica. Hoje as duas modalidades da doença atacam o organismo humano ao mesmo tempo. A fase aguda, ainda presente, seria representada sobretudo pelo socialismo. Mas agora estaríamos em presença do igualitarismo em sua fase crônica, e portanto mais insidiosa. Pois, como se sabe, tratando-se de doenças, a fase crônica é muitas vezes de cura mais difícil que a aguda. E, além disso, mais difícil de diagnosticar e perceber. 

Os autores pós-modernos, analisando a situação de seu ângulo, chegam a conclusões semelhantes. Por exemplo, Edgar Morin também recorre a uma metáfora médica. Ele fala de um período de neurose, a que se seguiu outro de necrose.[7] Estaríamos no segundo período. É outra maneira de expressar a mesma realidade. 

Tudo se vai tornando amorfo, o que traz uma consequência importante. Os homens individualmente e em conjunto deveriam ser uma imagem de Deus mas, com sua conduta, a humanidade está se jogando na negação dessa imagem. Seria como um paredão de pedra que, em vez de devolver, sob a forma de eco, as palavras pronunciadas, fizesse ouvir sons desagradáveis, injúrias e palavrões. 

A síncope da ordem, o colapso da família, a gangrena da massificação progressiva, a perda de respeito pela vida, a degradação do convívio social, tudo isso configura uma forma de revolta que consiste em conspurcar aquilo que deveria ser uma imagem de Deus. Mas independente do fato bruto e inelutável da existência das diferenças, há quem as pretenda negar. Ou então pregar a “indiferença às diferenças”. 

Não é isso viver fora da realidade? 
____________________ 
Notas:
[1] “Isto é”, 9-4-2000. 
[2] Christiane Taubira, ministra da Justiça da França (La Croix, 10-9-12). 
[3] Ibid.., I, 140 e 152. 
[4] “O Estado de S.Paulo”, 1-2-99, A9. 
[5] “Mulher gasta R$ 500 mil em casamento de cachorros” (O Estado de S. Paulo, 13-7-12). 
[6] “O homem, dotado de alma espiritual, foi colocado por Deus acima da escala dos seres vivos, como príncipe e soberano do reino animal” – Pio XII, Alocução de 30-11-1941. 
[7] Edgar Morin, Cultura de Massas no Século XX. 2. Vols., “Neurose” e “Necrose” (Rio: Forense Universitária, 3ª ed., 1999).

21 de setembro de 2012

STF, Código Penal e Comissão da Verdade


Daniel F. S. Martins 

Um dos mais renomados juristas brasileiros, de fama internacional, o Prof. Ives Gandra da Silva Martins proferiu na capital paulista uma substanciosa conferência intitulada: Estamos nas mãos de uma minoria que julga segundo suas opiniões próprias? — Por que o Supremo Tribunal Federal tomou decisões que chocam a consciência da maioria cristã dos brasileiros? O evento, promovido no dia 20 de setembro pelo Instituto Plinio Corrêa de Oliveira, lotou o auditório do Club Homs, na Avenida Paulista. 

O conferencista dividiu em três partes sua exposição, ao longo da qual deu uma visão de conjunto da situação jurídica nacional e mostrou as analogias existentes entre o atual projeto de Código Penal e o malfadado Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3), decretado por Lula da Silva em 2009.  
Da esquerda para a direita: Dr. Celso Vidigal, Dr. Eduardo de Barros Brotero, Dr. Adolpho Lindenberg, Prof. Ives Gandra, Dom Bertrand de Orleáns e Bragança e o Cel. Paes de Lyra
Na primeira parte da exposição ele examinou o perfil do Supremo Tribunal e sua transformação na última década, em seguida, comentou os recentes julgamentos anticonstitucionais proferidos por aquela Corte. Por fim, fez uma análise do projeto de novo Código Penal e das últimas decisões da chamada Comissão da Verdade.

Segundo o jurista, sempre pairou em torno do STF uma aura de respeito. Como “guardiões da Constituição”, seus membros desempenhavam o papel de “legisladores negativos”, isto é, só decidiam o que não podia vigorar por ser contrário à Carta Magna. Com a ascensão de Lula da Silva à presidência a Suprema Corte mudou de figura, renovando em pouco tempo seu quadro. Contando-se os oitos anos dos dois mandatos desse presidente e com o primeiro ano de mandato de Dilma Roussef, no decurso de nove anos foram nomeados 11 ministros! A partir dessa reformulação, segundo Ives Gandra, o STF começou a desempenhar o papel de “legislador positivo”, isto é, exorbitou de suas funções e passou a legislar positivamente — papel este reservado ao Legislativo — e mesmo contra a Constituição Federal... 

A nova “turma” passou a julgar casos de extrema gravidade moral e de consequências desastrosas para toda a Nação, mudando de fato a legislação antes em vigor. Em 2008, a Suprema Corte aprovou a pesquisa com células-tronco embrionárias, autorizando assim a morte de milhões de embriões humanos — seres humanos, portanto —, sob a alegação de que apenas pode ser objeto de proteção da lei “aqueles que fazem parte do registro civil” (sic). Em 2011, para estarrecimento da população, passou por cima da Carta Magna e equiparou a união entre homossexuais à união entre homem e mulher. Em 2012, a mesma corte aprovou o aborto de fetos anencefálicos, contrariando a Constituição e, sobretudo, a Lei de Deus e a Lei natural. 
O palestrante mencionou de passagem o julgamento do “mensalão”, ora em curso, que tende a devolver ao STF parte de seu prestígio, o qual fora seriamente comprometido após os mencionados julgamentos. Esperamos que seus membros não usem agora da recuperação parcial desse prestígio para aprovar novas barbaridades em futuro próximo... 

Com vistas a mostrar o mais recente perigo jurídico que ameaça o Brasil, o eminente jurista comentou diversos artigos dentre os 544 do projeto de novo Código Penal, ressaltado como a família, a propriedade e toda a sociedade sofrerão dramáticos efeitos. Os que desejarem aprofundar a matéria, podem fazê-lo através do artigo publicado em Catolicismo em Setembro/2012, disponível também na internet através do site www.catolicismo.com.br

Ao final, o conferencista afirmou que as recentes decisões da Comissão da Verdade vão além do PNDH-3. Tal comissão, ao invés de apresentar aquilo que seu próprio nome indica, declarou que investigará apenas os crimes “contra os direitos humanos cometidos pelos agentes de Estado”, evitando tratar dos crimes praticados pelos guerrilheiros e terroristas na história recente do Brasil. 


O príncipe Dom Bertrand de Orléans e Bragança encerrou a sessão, expondo como por detrás de todas essas manobras jurídicas existe uma verdadeira conjuração de alcance internacional, a qual tenta destruir tudo o que resta da civilização cristã, “fruto do sangue infinitamente precioso de Nosso Senhor Jesus Cristo”. Citou a esse respeito os ensinamentos de Plinio Corrêa de Oliveira. Cabe a nós reagir e fazer nossa parte para frear esse processo, ressaltou o Príncipe Imperial do Brasil. Para isso, uma das formas, a que convidamos o leitor é participar das campanhas e protestos realizados através do site www.ipco.org.br

PÓS-CONFERÊNCIA

16 de setembro de 2012

Palestra do Dr. Ives Gandra da Silva Martins

Palestra imperdível com o renomado jurista, Dr. Ives Gandra. 

Faça agora sua inscrição clicando em: http://ipco.org.br/home/

Recebi o convite para participar de uma conferência que está sendo promovida pelo Instituto Plinio Corrêa de Oliveira e aqui estendo esse convite aos diletos Amigos de nosso blog, pois o tema esta estreitamente vinculado aos nossos assuntos em prol da família. Eis as informações a respeito:

Quando? 

  • Dia 20 de setembro de 2012 (quinta-feira) a partir das 19 horas 


Onde? 

  • Clube Homs – Av. Paulista, 735 (a 100 metros do metrô Brigadeiro – há estacionamento pago no local) 


Quem é o Dr. Ives Gandra? 

  • Doutor em Direito e um dos mais renomados juristas do Brasil com reconhecimento internacional. É autor de mais de 40 livros individualmente, 150 em co-autoria e 800 estudos sobre assuntos diversos, como direito, filosofia, história, literatura e música, traduzidos em mais de dez línguas em 17 países. 
  • Não perca por nada esta palestra! 
  • O Dr. Ives Gandra irá falar com total conhecimento de causa sobre temas bastante atuais. Ele fará uma análise crítica sobre o julgamento do Mensalão e algumas decisões polêmicas do STF, tais como: 
  1. Autorização para utilização de embriões congelados para experiências com células tronco embrionárias; 
  2. O Supremo reconhece que os casais homossexuais têm os mesmos direitos e deveres que os casais heterossexuais; 
  3. O STF reconhece que o aborto de anencéfalos não é mais crime. 
Conto com sua participação. 
Inscreva-se com um click aqui: 


14 de setembro de 2012

“Onde há uma batida de coração, há esperança"

O periódico carioca “O Dia”, de 11-9-12, publica uma notícia que não vi em nenhum outro órgão de comunicação. Por isso, aqui divulgo tal notícia intitulada “Bebê nasce saudável após 12 pedidos de aborto negado”. 

Trata-se do caso de Pipa Reed [foto], uma jovem britânica de 26 anos, de Burton-on-Trent (Staffs). Estando grávida, os médicos concluíram que seu bebê tinha apenas 3% de chance de sobreviver. Assim, por 12 vezes, eles fizeram a infame proposta que JAMAIS se faz a uma mãe: que ela deveria praticar o aborto. Como mãe, negou todas as vezes, dizendo "Onde há uma batida de coração, há esperança". E ela tinha toda razão! 

Após algumas complicações e procedimentos cirúrgicos, a criança nasceu. Mãe e filho voltaram para casa, onde o recém-nascido, Jacob Reed [foto], tem apresentado uma melhora diária, deixando os médicos cada vez mais surpresos... 

Quantos e quantos casos de médicos inescrupulosos, baseados em diagnósticos falhos, aconselham esta infâmia a uma mãe?! Aconselham abortar crianças que nasceriam saudáveis!

Se eu tivesse o endereço dessa jovem mãe, a recomendaria processar tais “médicos”! Estes deveriam ter seus diplomas cassados!

11 de setembro de 2012

CÓDIGO PENAL — O rolo compressor do Projeto Sarney

O senador José Sarney "agiu de modo semelhante a Pilatos" 
O rolo compressor do Projeto Sarney 
(Reforma do Código Penal pretende esmagar o que resta de valores cristãos) 
(www.providaanapolis.org.br) 

Em 27 de junho de 2012, uma Comissão de Juristas entregou ao presidente do Senado, José Sarney, o anteprojeto de reforma do Código Penal. Seria de se esperar, que o texto fosse submetido à apreciação da sociedade para receber críticas e sugestões[1]. 

Isso, porém, não ocorreu. Em 9 de julho de 2012, apenas 11 dias depois, o Senador José Sarney subscreveu o anteprojeto convertendo-o em projeto de lei: o PLS 236/2012. Ao assinar o projeto, Sarney agiu de modo semelhante a Pilatos. Declarou-se, “por uma questão de consciência e religião”, contrário à eutanásia, ao aborto, ao porte de drogas e seu plantio para uso, mas não retirou nada disso do texto que subscreveu. Lavou as mãos, disse que era inocente do sangue de Cristo, mas decretou a sentença injusta. Favoreceu a presidente Dilma que, embora favorável ao aborto, havia prometido na campanha eleitoral não enviar ao Congresso qualquer proposta abortista. 

O anteprojeto – agora convertido em projeto – foi muito mais audacioso que o de 1998. Pretendeu reformar não só a parte especial do Código Penal, mas também a parte geral e a imensa legislação penal extravagante. E tudo isso no curto prazo de seis meses![2] O resultado foi um conjunto de 544 artigos cheios de falhas graves. 
Animais e pessoas 
Segundo a linha ideológica do PLS 236/2012, o ser humano vale menos que os animais. A omissão de socorro a uma pessoa (art. 132) é punida com prisão, de um a seis meses, ou multa. A omissão de socorro a um animal (art. 394) é punida com prisão, de um a quatro anos. Conduzir um veículo sem habilitação, pondo em risco a segurança de pessoas (art. 204) é conduta punida com prisão, de um a dois anos. Transportar um animal em condições inadequadas, pondo em risco sua saúde ou integridade física (art. 392), é conduta punida com prisão, de um a quatro anos. Os ovos, larvas ou espécimes da fauna silvestre não podem ser vendidos, adquiridos, transportados nem guardados, sob pena de prisão, de dois a quatro anos (art. 388, §1º, III). Os embriões humanos, porém, podem ser comercializados, submetidos à engenharia genética ou clonados sem qualquer sanção penal, uma vez que ficam revogados (art. 544) os artigos 24 a 29 de Lei de Biossegurança (Lei 11.101/2005). ________________________________________ 
Terrorismo e invasão de terras 
O terrorismo é criminalizado (art. 239). Mas as condutas descritas (sequestrar, incendiar, saquear, depredar, explodir...) deixam de constituir crime de terrorismo se “movidas por propósitos sociais ou reivindicatórios” (art. 239, §7º). Os invasores de terra são favorecidos, uma vez que “a simples inversão da posse do bem não caracteriza, por si só, a consumação do delito” (art. 24, parágrafo único). 
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Prostituição infantil 
Atualmente comete estupro de vulnerável quem pratica conjunção carnal com menor de 14 anos (art. 217-A, CP). O projeto baixa a idade: só considera vulnerável a pessoa que tenha “até doze anos”. Isso vale para o estupro de vulnerável (art. 186), manipulação ou introdução de objetos em vulnerável (art. 187) e molestamento sexual de vulnerável (art. 188). Deixa de ser crime manter casa de prostituição (art. 229, CP) ou tirar proveito da prostituição alheia (art. 230, CP). Quanto ao favorecimento da prostituição ou da exploração sexual de vulnerável, a redação é ainda mais assustadora: só será crime se a vítima for “menor de doze anos” (art. 189). Deixa de ser crime, portanto, a exploração sexual de crianças a partir de doze anos. 
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Drogas
Quanto às drogas, somente o tráfico permanece crime (art. 212). Deixa de ser crime o consumo pessoal de drogas (art. 212, § 2º). Presume-se que a quantidade de droga apreendida destina-se a uso pessoal quando ela é suficiente para o consumo por cinco dias (art. 212, § 4º).
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Aborto 
Quanto ao aborto, o projeto reduz ainda mais as penas já tão reduzidas. O aborto provocado pela gestante ou com seu consentimento, atualmente punido com detenção de um a três anos, passa a ter pena de prisão de seis meses a dois anos (art. 125). O terceiro que provoca aborto com o consentimento da gestante, atualmente punido com reclusão de um a quatro anos, passa a sofrer pena de prisão de seis meses a dois anos (art. 126). Se o aborto for provocado sem o consentimento da gestante, o terceiro é punido com prisão, de quatro a dez anos (art. 127). Curiosamente, ele recebe um aumento de pena de um a dois terços se, “em consequência do aborto ou da tentativa de aborto, resultar má formação do feto sobrevivente” (art. 127,§1º). Esse parágrafo parece ter sido incluído para estimular o aborteiro a fazer abortos “bem feitos”, evitando que, por “descuido”, ele deixe a criança com vida e má formada.

As maiores mudanças, porém, estão no artigo 128. Ele deixa de começar por “não se pune o aborto” e passa a começar por “não há crime de aborto”. O que hoje são hipóteses de não aplicação da pena (escusas absolutórias) passa a ser hipóteses de exclusão do crime. E a lista é tremendamente alargada. Basta que haja risco à “saúde” (e não apenas à “vida”) da gestante (inciso I), que haja “violação da dignidade sexual” (inciso II), que a criança sofra anomalia grave, incluindo a anencefalia (inciso III) ou simplesmente que haja vontade da gestante de abortar (inciso IV). Neste último inciso o aborto é livre até a décima segunda semana (três meses). Basta que um médico oupsicólogo ateste que a gestante não tem condições “psicológicas” (!) de arcar com a maternidade.
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Eutanásia e suicídio assistido 
“Matar por piedade ou compaixão” (eutanásia) passa a ser um crime punível com prisão, de dois a quatro anos (art. 122), muito abaixo da pena prevista para o homicídio: prisão, de seis a vinte anos (art. 121). Porém, o juiz pode reduzir a pena da eutanásia a zero, avaliando, por exemplo, “os estreitos laços de afeição do agente com a vítima” (art. 122, § 1º). Também o auxílio ao suicídio, em tese punível com prisão, de dois a seis anos (art. 123), pode ter sua pena reduzida a zero, nos mesmos casos descritos para a eutanásia (art. 123, §2º). 
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Renúncia ao excesso terapêutico 
O artigo 122, § 2º parece inspirado na doutrina, aceita pela Igreja, de que o paciente pode renunciar a tratamentos desproporcionais aos resultados, que lhe dariam apenas um prolongamento penoso e precário da vida[3]. A redação, no entanto, é infeliz: fala em deixar de fazer uso de meios “artificiais” para manter a vida do paciente em caso de “doença grave e irreversível”. Ora, a medicina é uma arte e todos os seus meios são artificiais. Do modo como está escrito, o parágrafo pode encobrir verdadeiros casos de eutanásia por omissão de cuidados normais devidos ao doente.
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Infanticídio indígena 
Há tribos indígenas que costumam matar recém-nascidos quando estes, por algum motivo, são considerados uma maldição. De acordo com o projeto, tais crianças ficam sem proteção penal, desde que se comprove que o índio agiu “de acordo com os costumes, crenças e tradições de seu povo” (art. 36). 
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“Preconceito” de gênero 
De todos os males contidos no projeto, o mais difícil de corrigir são as cláusulas onde foi inserida a ideologia de gênero, que considera o homossexualismo (e talvez também a pedofilia e a bestialidade) como uma legítima “opção” sexual ou “orientação” (ao invés de desorientação) sexual. O PLC 122/2006 (projeto anti-“homofobia”) da Senadora Marta Suplicy (PT/SP) foi todo inserido no PLS 236/2012. Está no alvo do projeto o bispo diocesano que não admite um homossexual no seminário ou que o afasta do seminário após descobrir sua conduta (art. 472, V), o dono de hotel que se recusa a hospedar um “casal” de homossexuais (art. 472, VI, a) e a mãe de família que demite a babá que cuida dos seus filhos após descobrir que ela é lésbica (art. 472, II). Poderá talvez ser acusado de “tortura” o pregador que, ao comentar um texto bíblico desfavorável ao homossexualismo, “constranger alguém” do auditório, causando-lhe sofrimento “mental” (art. 468, I, c). 

Segundo o projeto, tais condutas são motivadas por “preconceito” de “gênero”, “identidade ou orientação sexual”. São crimes imprescritíveis, inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia (art. 474 e 468, § 7º). 

A perseguição religiosa está preparada e tende a ser violenta. No entanto, o motivo mais grave que nos deve levar a rejeitar tais cláusulas não está nas suas consequências práticas, mas nos princípios em que se baseiam. Toda pessoa, ainda que pratique condutas sexuais reprováveis, como a pedofilia, o estupro, o incesto, a bestialidade ou o homossexualismo, continua sendo pessoa. E é somente na qualidade de pessoa que ela tem direitos. A deformidade moral que a atinge não pode acrescentar-lhe direitos. Quem aceitaria que alguém, ao assassinar um pedófilo, recebesse, além da pena devida ao homicídio, uma pena extra por demonstrar “intolerância” ou “preconceito” contra a pedofilia? É justamente isso que pretende o projeto. Agravar a pena de todos os crimes, se eles forem praticados por “preconceito” de “orientação sexual e identidade de gênero” (art. 77, III, n). Essa inadmissível agravante genérica aparece também em crimes específicos, como o homicídio (art. 121, §1º, I), a lesão corporal (art. 129, § 7º, II), a injúria (art. 138, § 1º), o terrorismo (art. 239, III), o genocídio (art. 459), a tortura (art. 468, I, c) e o racismo (art. 472). 
Deus se compadeça de nós.

Anápolis, 11 de setembro de 2012
Pe. Luiz Carlos Lodi da Cruz 
Presidente do Pró-Vida de Anápolis 
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[1] Assim aconteceu com o anteprojeto de Código Penal de 1998, que depois de publicado pelo Ministério da Justiça, ficou por um bom tempo sujeito às críticas da sociedade, inclusive dos Bispos. Porém, nunca chegou a tornar-se projeto de lei. 
[2] Em 16/06/2011 o Senador Pedro Taques (PDT/MT) apresentou o Requerimento 756/2011 solicitando a criação de uma Comissão de Juristas para reformar o Código Penal no prazo de 180 dias. O requerimento foi aprovado pelo plenário em 10/08/2011. A Comissão começou a trabalhar em 18/10/2011. 
[3] Cf. JOÃO PAULO II, Evangelium Vitae, n. 65.

9 de setembro de 2012

Revolução Francesa e a supressão do ornato nos trajes

Sob o pretexto da “simplicidade” a Revolução Francesa tentou extirpar o requinte e os ornatos elegantes que distinguiam as pessoas
Dentro de nossa campanha “Não deixe a cortesia morrer”, retomamos hoje ao tema desenvolvido pelo escritor francês, Prof. Frédéric Rouvillois, em seu livro “A HISTÓRIA DA POLIDEZ — de 1789 aos nossos dias”.

No post abaixo, do dia 26 último (“Uma infernal Revolução para extirpar a memória do Antigo Regime”), tratamos do empenho dos mentores da Revolução Francesa em abolir qualquer forma de cortesia que lembrasse os bons modos da “Velha França”, e de que maneira, no processo revolucionário do século XVIII, colaboraram vários movimentos — entre os quais o nascente movimento feminista radical — para a implantação do trato igualitário em todas as relações sociais. 

No presente post transcrevo trechos nos quais o autor mostra o papel do vestuário na Revolução Francesa — trajes desprovidos de belos ornatos, para contribuírem na propagação das ideias igualitárias. 
Com a Revolução Francesa o vestuário "simplificado" perdeu a elegância do Antigo Regime
“Assim como se manifesta de forma ostensiva nas relações sociais, a antipolidez revolucionária pretende também reger os comportamentos individuais, quer se trate de aparência quer de atitudes.

Tal é o princípio que domina, nessa época [segunda metade do séc. XVIII], a filosofia do vestuário. Em tal matéria, a simplicidade tornou-se a regra. A vestimenta, observa Prévost, deve ser sempre apropriada não em nome da elegância, mas da higiene. Se cada nação tem suas modas, ‘é mais digno do homem livre não seguir nenhuma que seja molesta ou faça o corpo adotar posições incômodas’.

Mas o que importa aqui, por trás da vestimenta, é a ideologia, que impõe evitar os ornamentos, pois ‘é dessa espécie de magia que se serviam os tiranos para nos submeter’.(1)



Vestuário "Revolução Francesa"
Vestuário "Ancien Régime"
Potencialmente, o traje é repleto de significado, em sua forma, sua cor e seus ornamentos. É por essa razão que, na grande tradição da utopia, certos revolucionários sonham em impor um uniforme comum às crianças, e, no limite — por que não? —, a todos os cidadãos. [...]

Certamente, admite Prévost, alguma elegância é permitida, mas dentro de limites muito estritos, porque, entre os republicanos, ‘o supérfluo dos trajes’ é uma ofensa ao Estado, e o luxo, um crime contra a sociedade.(2)

Em outras palavras, vestir certos trajes em certos lugares ou em determinados momentos pode ter conotações explicitamente políticas e contra-revolucionárias. A municipalidade de Saint-Georges-La-Montaigne, pequena vila do departamento de Vienne, decreta assim que qualquer um que, aos domingos e em festas, se vista de maneira mais aprumada ou mais esmerada que nos dias de trabalho, infringindo desse modo as novas normas do tempo, impostas pelo calendário republicano, será considerado suspeito e, em caso de recidiva, perseguido como tal.(3) [...]

Em Châtillon-sur-Seine, certo Huguenin, funileiro de profissão, foi condenado a dez dias de prisão por ter vestido, no domingo, ‘um belo traje de tecido verde-maçã, com belos botões nacarados’.‘Não sou eu que estou na prisão, mas meu traje’.(4) Esse rigor, porém, nem sempre é praticável, e em Paris, por exemplo, relata um espião, em janeiro, depois em fevereiro de 1794: ‘Os espetáculos se ressentem ainda do velho domingo, a afluência do povo é maior e a vestimenta mais apurada’, sem que seja possível usar de severidade...(5) [...]

 Em contrapartida, perfume e maquiagem, acessórios luxuosos e narcísicos, são julgados politicamente suspeitos. Em ‘A cidade do sol’ — utopia comunista escrita no início do século XVII pelo italiano Campanella — pune-se com a morte, como culpados de embuste, aqueles que usam máscaras sobre o rosto. Sob a Revolução Francesa não se vai tão longe, mas reprova-se esse gênero de prática, mesmo depois do fim do episódio robespierrista; assim, o bom pai de família republicana, posto em cena por Henriquez, repreende asperamente sua filha, maquiada demais para ser honesta.(6)

Alguns meses depois, em dezembro de 1793, um espião relatava, a esse propósito, uma opinião que ele parecia endossar: ‘Desejar-se-ia que o uso do pó-de-arroz, indigno dos sans-culottes e dos republicanos, fosse severamente proscrito em toda a extensão da República’.(7)

De fato, o contraste com o Antigo Regime salta aos olhos...
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Notas: 
1. Prévost, Véritable Civilité républicaine a la usage des citoyens des deux sexes présentée à la Convention nationale, Rouen, Imprimerie Pierre Lecomplte, ano II da República, p. 3. 
2. Prévost, Véritable Civilité républicaine, op. cit., pp. 3 e 4. 
3. Citado por N. Pellegrin, Les Vêtements de la liberté, Aix-en-Provence, Alinéa, 1989, p. 73. 
4. Ibid., p. 98. 
5. Citado por P. Caron, Paris pendant la Terreur, op. cit., t. II, p. 320, e t. III, p. 284. 
6. L.-M. Henriquez, Principes de civilité républicaine, op. cit., p. 8. 
7. Relatório Latour-Lamontagne, citado por P. Caron, Paris pendant la Terreur, op. cit., t. II, p. 68.

3 de setembro de 2012

Ressurgimento na Europa da “Roda dos Expostos”

Representação do uso da “Roda dos Expostos”. A mãe deixava seu bebê, girava a “roda”, tocava o sino e retirava-se. Do outro lado, uma irmã de caridade recolhia a criança, que passava a ser de responsabilidade da Irmandade para cuidados, alimentação e educação.
Devido a uma viagem de uma semana, não me foi possível digitalizar mais algumas páginas do livro "A História da Polidez" e encontrar fotos para ilustração do tema que temos desenvolvido em posts anteriores. Assim, ofereço hoje um artigo que me pareceu importante aqui publicá-lo, pois muito relacionado com nossas atividades em defesa da instituição da família. Tal artigo o redigi para Catolicismo, uma revista mensal de cultura e atualidades, e publicado na edição deste mês.

*          *          * 

A redescoberta da "roda"...

Criadas no século XII, em plena Idade Média, as “Rodas” para salvar recém-nascidos ressurgem em países europeus. Instituídas no Brasil no século XVIII, elas funcionaram durante muito tempo, mas foram desativadas e hoje encontram-se em museus. 

Paulo Roberto Campos

Escondida pelas trevas da noite, uma mulher aproxima-se de uma praça, olha para todos os lados e, percebendo que não havia ninguém, deposita um “pacote” sobre um banco e desaparece na escuridão. Ao amanhecer, alguns transeuntes encontram o “pacote”, abrem-no, e se deparam com uma surpresa: um bebê. 

Muitos casos semelhantes são investigados e esclarecidos pela polícia. Esta descobre que muitas mães deixam seus pequeninos em algum lugar que é ermo durante a noite e movimentado durante o dia, a fim de que passantes logo encontrem seus bebês. Elas têm a esperança de que seus filhos poderão ser assim salvos e receber um tratamento condigno. 

Ainda recentemente, na cidade paulista de Guarulhos, um casal, voltando à noite para casa, escuta um gemido próximo a um poste. A jovem pergunta ao noivo: “Você ouviu isso?”“Sim, deve ser o gato” (havia um nas proximidades). Dão alguns passos e escutam outro gemido, que parecia sair de dentro de um saco. — “Não, isso não parece gemido de gato”. Então se aproximam, mas ficam na dúvida quanto ao procedimento a tomar. Alguns instantes depois, eles ouvem claramente o choro de uma criança. Abrem o saco e... surpresa: um lindo bebê. Levado às pressas ao hospital, sobreviveu. Muitas pessoas estão na fila, querendo adotar esse recém-nascido. 

Fatos análogos têm-se multiplicado nas babeis deste mundo neopagão. Não é raro o noticiário dar conhecimento de bebês deixados nas ruas, em portas de igrejas, de casas, etc. Muito piores são os casos de mães que lançam seus recém-nascidos em terrenos baldios, rios e lagoas, e até mesmo no lixo! Como evitar tanta impiedade? E como resolver o problema das mães que, por quaisquer razões, se julgam sem condições de cuidar do fruto de suas entranhas? 

Reinventando uma moderna “Roda” 
Antiga "Roda dos expostos"
da Basílica da Misericórdia de Lisboa
Uma recente notícia acende uma luz sobre a questão. Incapaz provavelmente de resolver o triste problema, poderá ao menos minorá-lo. Tal notícia nos chega através da BBC.(*) Relata que um sistema criado na Idade Média — nascido em 1188 em Marselha (França) —, agora ressurge com força na Europa: a “Roda de bebês enjeitados”. Quem diria! Um costume medieval do século XII renascendo nos primórdios do século XXI... 

Eis um trecho da notícia da BBC: “Diferente das rodas de bebês enjeitados de outros séculos, o equipamento moderno difere dos cilindros de madeira instalados em paredes de conventos ou igrejas medievais. [foto acima] 

“Nos equipamentos antigos os bebês indesejados eram depositados pela parte de fora e depois girados para dentro dos estabelecimentos. 


A atual "roda", denominada babyklappe, usada na Alemanha
e outros países. Na foto, jovem alemã faz demonstração
sobre o funcionamento
“Embora tenha a mesma finalidade, o novo sistema consiste em uma espécie de berço aquecido, monitorado por enfermeiras e disposto em locais próximos a hospitais com fácil acesso da população”. [foto à direita]

Esses modernos “bercinhos”, protegidos por uma escotilha de aço, com sistema de alarme e vídeo e na temperatura ideal, contêm cobertores para o bebê e uma carta dirigida aos pais, explicando que eles poderão buscar a criança de volta caso se arrependam da decisão. Todo esse processo é confidencial, ninguém fica sabendo quem depositou o recém-nascido no “bercinho”. 

Vários países europeus estão “reinventando” a “Roda”. Alemanha, Bélgica, Eslováquia, França, Holanda, Itália, Lituânia, Polônia e República Tcheca adotaram-na há já alguns anos. Mais recentemente, a Hungria, que alterou a sua legislação para legalizar o sistema com as mesmas leis estabelecidas para os casos de adoção. 


Eis o que declara a respeito Gabriele Stangl, do Hospital Waldfriede, de Berlim: “O sistema conta com todas as facilidades de uma maternidade comum. Uma vez que o bebê é depositado no berço improvisado, um alarme soa e chega uma equipe de médicos para checar o estado de saúde do recém-nascido”. Assim, ele recebe todos os cuidados até ser encaminhado para adoção. Enquanto a criança não for adotada, os pais têm o direito de recuperá-la — o que não é raro acontecer —, mas depois que for adotada, eles perdem seus direitos. 

A notícia da BBC narra ainda o caso de uma mãe que “engravidou muito jovem e não tinha o apoio do pai da criança, ficou em estado de choque após o nascimento e decidiu colocar o filho na ‘roda’. Ela, entretanto, se arrependeu uma semana depois”. 

A fúria da ONU contra a “roda salvadora” de inocentes 
Essa prática que ressurge na Europa deveria ser bem vista por todos os que desejam evitar o abandono de crianças nas ruas. Inclusive deveria ser muito bem vista pela ONU. Entretanto, com sua jactância de candidata frustrada a governo mundial, as Nações Unidas descarregam sua fúria contra as modernas “rodas” que poderão salvar muitos recém-nascidos do abandono e prevenir o crime do aborto.  Segundo a mencionada notícia da BBC, o Comitê das Nações Unidas para os Direitos das Crianças critica o sistema de acolhimento de recém-nascidos como sendo “contra os direitos humanos das crianças” e “um retrocesso às práticas medievais”.

Será que a ONU não vê no aborto um atentado contra os direitos humanos da criança por nascer? E o direito fundamental à vida que têm todos os seres humanos? Então, a fim de não se retroceder no tempo, é melhor matar o inocente? 

Ademais, só porque é “medieval” é ruim? Quantas maravilhas nasceram na Idade Média! Um só exemplo: a arte gótica que atrai e encanta pessoas de todo o mundo ao visitarem as deslumbrantes catedrais medievais. 


Em qualquer caso, incentivando a prática do aborto, a ONU retrocede a um período bem anterior à Idade Media, ou seja, ao antigo paganismo, quando os fenícios adoravam o deus Moloch. [representação ao lado] Como se sabe, esse povo acreditava aplacar a cólera do “deus” oferecendo-lhe em sacrifício muitos recém-nascidos. Enquanto a estátua de metal do ídolo incandescia em decorrência da fornalha acesa em seu interior, bebês eram jogados em seus braços e rolavam para dentro do monstro, morrendo carbonizados. 

Com suas bilionárias e macabras campanhas pró-aborto, a ONU faz em nossos dias o papel de Moloch que sacrifica milhões de vítimas inocentes por meio da prática abortiva no mundo inteiro. Além do aborto, a ONU impulsiona o controle artificial da natalidade em muitas nações. 

Um pouco da história: as “Rodas” estabelecidas no Brasil 
Maquete da "Roda dos Expostos" em tamanho natural
(Museu da Santa Casa de Salvador - BA)
Em nosso País, a instituição da “Roda dos Expostos” — também conhecida como “Roda dos Enjeitados”, “Janela de Moisés” e “Roda da Misericórdia” —, trazida de Portugal, foi estabelecida nas Irmandades das Santas Casas de Misericórdia. Primeiramente na de Salvador (1734) [representação à direita], depois no Rio de Janeiro (1738), Recife (1789) e em São Paulo (1825). Conta-se que algumas outras cidades brasileiras também adotaram o sistema até meados do século passado, mas não encontrei documentos. Hoje há relíquias dessas “Rodas” em alguns museus. (Vide texto no final) 

A decisão era dolorosa para muitas mães traumatizadas, pobres ou pressionadas por familiares que consideravam o recém-nascido uma “criança indesejada”. Essas mães preferiam deixar seus pequeninos nas “Rodas dos Expostos”, onde eles seriam bondosamente acolhidos pelas irmãs de caridade, batizados, bem tratados e educados, até que famílias os adotassem. 

Depoimentos maternos
No Museu da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo estão bem guardados vários bilhetes deixados pelas mães na “Roda dos Expostos”. [foto à esquerda] Elas explicam o motivo que as levaram a abandonar ali seus bebês. Geralmente eram casos de crianças nascidas fora do casamento — considerados como desonra para a família — ou por falta de condições financeiras para cuidar do filho. 

Eis um desses bilhetes, deixado em maio de 1922 junto a uma pequenina de nome Maria José: “Sou filha de um pecado que não tem perdão. Minha mãe repudia-me, mas alguma alma generosa poderá querer saber o meu destino”. 


Também havia casos de mães que colocavam seus filhos na “Roda”, mas tinham esperança de um dia poder recuperá-los e levá-los de volta para casa. Para isso deixavam algum objeto (medalhinhas, fitinhas coloridas, anéis etc.) a fim de que pudessem ser identificados. Um exemplo é o bilhete que acompanhou o recém-nascido Antonio Moreira de Carvalho, deixado na “Roda dos Expostos” em 27 de junho de 1922: 


A antiga "Roda dos Expostos" que se encontra
no Museu da Santa Casa de São Paulo (SP)
 
“Recebam-me. Chamo-me Antonio. Sou um orfãozinho de pai, porque ele me abandonou, e também minha mãe. Ela é muito boa e me quer muito bem, mas não pode tratar de mim. Estou magrinho assim porque ela não tem leite, é muito pobre, precisa trabalhar. Por isso, ela me pôs aqui para a irmã Úrsula tratar de mim. 

“Não me entreguem a ninguém porque minha mãe algum dia vem me buscar. [...] Estou com sapinho e fome. Minha mamãe não sabe tratar de sapinho e não sabe o que me dar para eu ficar gordinho. Minha mãe também agradece os bons tratos que me derem”. 

Na “Roda dos Expostos” da Santa Casa de Misericórdia de Salvador (BA) também estão guardados muitos bilhetes que acompanharam os pequeninos desvalidos. Um deles era de um menino em cujo braço direito vinha amarrada uma fita azul com este bilhete: “17 de dezembro de 1881. Vae este menino, nascido hoje para a Roda. É filho legítimo de uma pobre viúva, que não tem nenhum recurso para criá-lo; que faça tenção se Deos quizer ir tirar seu filho. O menino vae com uma fita azul amarrada no braço direito, uma camisa liza, touca de meias, coberta de tacos. A mãe d´este menino está no Hospital. Marcolina do Monte, cabra, solteira, mora na Rua da Misericórdia”.

“Parto Anônimo”
Crianças no antigo "Asílo dos Expostos"
no bairro do Pacaembu (SP)
Outra solução para a questão em foco seria “desengavetar” e pôr em prática o Projeto-Lei 3220/08, intitulado “Parto Anônimo”, que remediaria o problema. A mulher ficando grávida contra a sua vontade, ou contra o desejo de familiares, e não admitindo a hipótese de matar seu bebê por meio do aborto, o “Parto Anônimo” permitiria que ela gerasse a criança com segurança e ao nascer a entregasse para alguma instituição, como um hospital-maternidade, um asilo, etc. A instituição manteria o anonimato a respeito dos pais e se encarregaria de encaminhar a criança para adoção. Há filas de pessoas desejosas de adotar uma criança, mas a burocracia tem dificultado enormemente esse procedimento.

O médico Renato Costa Monteiro, de 85 anos, foi uma das 4.696 crianças abandonadas na “Roda dos Expostos” da Santa Casa de São Paulo. O Dr. Monteiro afirma com veemência que o “Parto Anônimo” se caracteriza como uma opção para as mães que não apresentam condições de criar seus filhos. É triste, mas "diante dos acontecimentos que presenciamos ultimamente, pode [o Parto Anônimo] ser uma alternativa para evitar esses dramas". 

Por que não restaurar as “Rodas dos Expostos”? 
Se nossas autoridades desejassem realmente resolver — ou pelo menos minorar — o gravíssimo problema de crianças abandonadas e sinistros casos de aborto, por que não seguir este excelente sistema nascido na Idade Média e que vem ressurgindo em países do primeiro mundo? Quantos crimes deixariam de ser cometidos! Quantos infanticídios evitados! Então vamos insistir na reinstalação das “Rodas salva-vidas” — pelo menos para evitar o pior! 
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Notas: 
(*) BBC, Londres, 26-6-12. Obras consultadas: Museu da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, “Laserprint Editorial”, S. Paulo, 2009 e Ações Sociais da Santa Casa de Misericórdia da Bahia, “Contexto & Arte Editorial Ltda”, Salvador, 2001.  

Edifício da Santa Casa de Misericórdia da capital paulista

Palavras do Provedor 

A seguir, a declaração do Dr. Kalil Rocha Abdalla [foto abaixo], Provedor da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo(*) e grande incentivador do Museu daquela instituição, desde o início sob a coordenação da Sra. Maria Nazarete de Barros Andrade. A ela — cujo incessante trabalho pelo aprimoramento do Museu nos compraz registrar — agradecemos a gentil acolhida de dois colaboradores de Catolicismo, mostrando-lhes o Museu, bem como fornecendo algumas fotografias e informações necessárias para a redação do presente artigo. 
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“O Museu da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, foi organizado em junho de 2000 e só aberto para visitação a partir de sua inauguração em 21 de março de 2001; reúne uma série de documentos, fotos, medalhas, aparelhos e instrumentos de uso médico e de uso farmacêutico, além de possuir uma grandiosa Pinacoteca, com retratos de grandes homens e mulheres, colaboradores que doaram não apenas bens materiais, como prontificaram-se a ajudar o próximo.

A peça de destaque do Museu é a Roda dos Expostos ou Excluídos, confeccionada em pinho de Riga, com um cilindro que gira em torno de um eixo e com uma abertura na lateral onde as crianças eram colocadas. A peça guarda a história de milhares de crianças abandonadas aos cuidados da Santa Casa; esta provia a elas educação e moradia até que completassem a maioridade, encaminhando-as para um futuro esperançoso. A Roda dos Expostos é constante tema de pesquisas acadêmicas e foco de muitos artigos, entrevistas e reportagens”. 
Sra. Maria Nazarete de Barros Andrade, coordenadora do Museu da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo,
junto à "Roda dos Expostos"
Origem histórica da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo 
“Em 1498, dona Leonor de Lancastre, viúva do Rei de Portugal, dom João II, determinou a fundação da Santa Casa de Misericórdia de Lisboa. A organização e o funcionamento das Santas Casas de Misericórdia foram uma das marcas mais fortes e permanentes da colonização portuguesa em todos os continentes que o país explorou e colonizou. 

O mesmo aconteceu no Brasil, que se tornou colônia de Portugal após o descobrimento oficial, em 1500. [...] 

A Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo teve um papel fundamental na preservação da vida de milhares de crianças abandonadas ao nascer, pela existência da Roda dos Expostos desde 1825. Ao todo, constam 4.696 em seus registros. [...] 

As Irmãs de Caridade participaram ativamente no processo de assistência ao menor abandonado. Quando uma criança era depositada na roda e ela era girada, o sino tocava e uma irmã recolhia o bebê, que passava a ser de responsabilidade da Irmandade para cuidados, alimentação e educação. [...] 

Em outras Irmandades de Santa Casa de Misericórdia também existiu a Roda dos Expostos, como na da cidade do Rio de Janeiro, desde o século XVIII. 

Apesar de a Roda dos Expostos ter sido instituída na cidade de São Paulo apenas na segunda década do século XIX, seu papel de assistência social e de preservação da vida humana deve ser ressaltado: milhares de crianças tiveram oportunidade de viver graças à sua existência e, principalmente da Irmandade que atendeu às necessidades sociais da época, da mesma maneira que continua, prestando assistência em seus hospitais à população carente, com cuidados médicos de alta qualidade”. 

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(*) Fundada em 1560 na pequena Vila de São Paulo, a Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo funcionou primeiramente na palhoça de Anchieta no Pátio do Colégio. Depois na Rua da Glória e atualmente no imponente prédio de estilo gótico situado na Vila Buarque, construído em 1884, onde a “Roda dos expostos” funcionou até 1948. Visitas ao Museu da Santa Casa, à Rua Cesário Mota Junior, 112 (Vila Buarque), de segunda a sexta-feira das 9h às 16.30h.