27 de abril de 2025

QUEM SERÁ O NOVO PAPA?



  Paulo Roberto Campos 

Após o sepultamento do Papa Francisco na monumental basílica de Santa Maria Maggiore, é natural que todos — tanto do mundo católico, quanto do mundo laico — se voltem agora para o Conclave. 

Ou seja, todos se perguntam “Quem será o novo Papa?” “Como ele agirá?” “O que ele pensa da situação caótica que atravessa a Igreja e o mundo?” “Que solução apresentará para enfrentar a crise universal?”.

O Conclave, que terá início dentro de alguns dias, é a reunião do sacro colégio de cardeais convocado para eleger um novo papa. Reunirá, a portas cerradas, 133 cardeais de 70 países (sete são do Brasil). 133 são os cardeais, com menos de 80 anos, que podem votar e ser eleitos na escolha do novo papa, que precisa receber dois terços dos votos (são secretos e queimados após a contagem). 

Como eu não sei responder as cruciais questões acima, procurei saber o que Plinio Corrêa de Oliveira escreveu às vésperas de Conclaves anteriores. 

Encontrei algumas sapienciais respostas, mas a que me pareceu mais condizente para o presente momento de sede vacante (o trono de São Pedro sem ocupante devido à morte de um papa) está aventada num artigo do Prof. Plinio publicado na “Folha de S. Paulo (16-8-1978). Portanto, 10 dias após morte de Paulo VI. 

Neste dia 28 de abril, completa exatamente uma semana do falecimento do Papa Francisco. Assim sendo, transcrevo trechos do referido artigo para a consideração de nossos leitores. Leiam, pensem, façam seus prognósticos e comentem. 



CLAREZA

  Plinio Corrêa de Oliveira 

[...] Da Igreja, sim, nestas vésperas de Conclave. 

Diante do caudal de nomes de candidatos ao papado, que lhe vão sendo apresentados, o povo não quer saber tanto qual o lugar de origem, a idade e a carreira eclesiástica, nem qual a fisionomia deles (fisionomia que cabe, o mais das vezes, em uma das variantes em curso: jovial-risonha, caridosa-tristonha, desgrenhada-frenética, esta última ainda não em voga para cardeais). O que o povo quer saber se reduz a esta pergunta principal: Paulo VI anunciou que a Igreja estava sendo vítima de um misterioso “processo de autodemolição” (alocução de 7-12-68) e que nela penetrara a “fumaça de Satanás” (alocução de 29-6-72). O falecido pontífice — ante cujos restos mortais me inclino aqui com a devida veneração — partiu pois para a eternidade com a autodemolição em curso, e a fumaça de Satanás em expansão. O que pensará seu sucessor sobre a autodemolição e a fumaça? Como se conduzirá ante uma e outra? 

Mil outras questões poderiam ser formuladas acerca do novo papa. Mas as que acabo de considerar primam sobre as demais. Pois quem navega numa barca em meio à pior fumaça, e em companhia de passageiros que vão desconjuntando o madeirame, se interessa de imediato e principalmente em saber o que vai ser feito a respeito da fumaça, e dos demolidores da barca. Ora, a Santa Igreja de Deus é a admirável, a nobilíssima, eu quase diria, a adorável Barca de Pedro. É natural que tais perguntas, se as formulem, nestes dias, também os passageiros desta Barca. 

São incontáveis os católicos segundo os quais a fumaça e a autodemolição se identificam, a justo título, com duas grandes tendências existentes na Igreja de nossos dias. Uma destas tendências se desenvolve no plano teológico, filosófico e moral. É o progressismo.

A outra tendência se desenvolve no tríplice plano diplomático, social e econômico. Ela se chama, segundo o ângulo em que é considerada, aproximação com o Leste, aproximação com o socialismo e aproximação com o comunismo. 

Se considerarmos que o progressismo é, por sua vez, uma aproximação com os mil aspectos do que se convencionou chamar "mentalidade moderna" (a qual é, até certo ponto, uma ficção a que poucos homens aderem inteiramente, muitos só aderem com restrições e em proporções acentuadamente variáveis, e que não poucos rejeitam), chegamos à conclusão de que o futuro papa terá seu pontificado essencialmente marcado pela atitude que tomar diante disto que podemos qualificar de dupla aproximação: a) a mundano-publicitária-progressista; b) a socialo-comunista. 

Desculpe-me o leitor os neologismos. Talvez conviesse compô-los de outra maneira. Apresentam-se-me ao correr da pena, e me servem para exprimir fácil e rapidamente o que quero dizer. Poupam, assim, o tempo do leitor, como o meu. —Em nossa época, a pressa obtém indulgência para muitas deselegâncias... 

O que pensam dessas aproximações os múltiplos cardeais cujos nomes vão sendo lançados como “papabili”? Como vê cada um deles as correntes rumo às quais esses movimentos de aproximação os convidam? Como hidras que é preciso abater desde logo com o gládio de fogo do Espírito? Como adversárias inteligentes, dúcteis e talvez um pouco bobas, com as quais é possível conduzir lentas, cômodas e quiçá até cordiais negociações? Como parceiras, em uma coexistência ou mesmo colaboração perfeitamente aceitável, e por alguns lados até simpática? Estas são, entre mil, as perguntas que a maioria dos passageiros da sacrossanta Barca de Pedro gostariam de fazer a cada “papabile”

*   *   * 

E para estas perguntas, que pairam no ar, o mais das vezes não vejo em torno de mim senão fragmentos de respostas, opacos, viscosos, totalmente insatisfatórios. 

Ora, queiram ou não queiram, quando do alto da “loggia” de São Pedro for proclamado o nome do novo papa, e o consueto clamor de alegria se levantar da imensa praça circundada pelas colunatas berninianas, ao mesmo tempo uma muda mas ansiosa interrogação se apresentará aos espíritos. Será o novo sucessor de São Pedro, ante os promotores das aproximações, um batalhador, um negociador, ou um ajeitador? 

E ele, em quem residirá o excelso poder das chaves, cujas decisões são soberanamente independentes dos juízos dos homens, mas cuja missão pastoral não o poderá deixar indiferente às aspirações e necessidades das ovelhas, se perguntará, na hora solene da sua aclamação: qual das três atitudes espera de mim este povo imenso? 

Enquanto aguardamos, na prece ininterrupta, submissa e confiante, esse momento ápice do primeiro encontro estuante de júbilo e carregado de preocupações, resta-nos perguntar: o que deseja a grei fiel? 

Vários, é bem claro, têm sua preferência definida por um papa que tome inteiramente esta ou aquela das atitudes, ante a dúplice aproximação. Classifico-me, todos o sabem, entre os que exultariam com a escolha de um papa combativo como São Gregório VII ou São Pio X [foto]. Outros preferem nitidamente um papa "aproximacionista", como foi em seu tempo Pio VII. E assim por diante. 

Mas a imensa maioria dos fiéis, o que desejará ela? 

A primeira vista, parece apática. Tal apatia será desinteresse? Não o creio. 

O que será então? A meu ver, é a expressão do desconcerto respeitoso, e por isso mesmo silencioso, de quem não entende, não concorda e nem ousa discordar. 

Essa imensa maioria, em cujo silêncio me parece discernir traços óbvios de fadiga, angústia e desânimo, deseja de imediato, e antes de tudo, clareza. 

Sim, ela deseja, num silêncio que se vai tornando enfaticamente perplexo, saber sobretudo o que é esta fumaça, quais são os rótulos ideológicos e os instrumentos humanos que servem a Satanás como “sprays” de tal fumaça, no que consiste a demolição, e como explicar que esta demolição seja, estranhamente, uma autodemolição? 

Não é o que o senhor gostaria de saber, leitor? A senhora, leitora? Pois eu também. E como nós, milhares, milhões, centenas de milhões de católicos. 

E o que há de mais justo, de mais lógico, de mais filial e de mais nobre do que pedirem os filhos da luz, àquele a quem foi dito: “Tu és pedra, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja", pedirem-lhe clareza?

25 de abril de 2025

Favores extraordinários nos conselhos de Nossa Senhora


Nossa Senhora do Bom Conselho de Genazzano. Sua festa litúrgica é celebrada no dia 26 de abril.



✅  Plinio Corrêa de Oliveira 

A respeito do sentido da invocação Nossa Senhora do Bom Conselho, o que dizer? Mais precisamente, o que dizer de Mãe do Bom Conselho? — Ela é Mãe, considerada enquanto dando um conselho, enquanto orientando um filho espiritual d’Ela, como somos todos nós. 

O que é um bom conselho? 

O espírito humano é susceptível de erro, portanto, de perplexidades muito grandes, e muitas vezes não é capaz por si mesmo de atinar com a solução de um problema. Ele precisa de um conselho de uma mentalidade mais alta, que discerne mais do que ele, e que lhe explica algo, traçando uma diretriz para ele seguir. 

O sentido corrente da palavra conselho é uma norma para a ação. Para toda espécie de ações, mesmo as puramente interiores e espirituais, Nossa Senhora pode dar um conselho, ou uma norma espiritual para as dificuldades, para os estudos, para o trato com os outros. É o conselho para tudo, em todas as circunstâncias da vida. 

Os historiadores atribuem muitas vezes o êxito do reinado deste ou daquele monarca, deste ou daquele Papa, a certos conselheiros. O título de conselheiro foi sempre considerado dos mais altos de uma monarquia. 

Mas se isso é assim, e se os homens devem pedir conselhos uns dos outros, se devem reconhecer que eles por si mesmos têm dificuldade de encontrar a sua própria via em circunstâncias difíceis, sobretudo é verdade que o homem podendo se comunicar com Deus por meio da oração peça-lhe o conselho. 

Isso deve ser um dos hábitos de nossa vida espiritual e de piedade. Pedirmos conselho a Deus, que Ele nos ilumine e nos faça compreender aquilo que devemos fazer. O mais alto e belo conselho que devemos pedir é a Deus Nosso Senhor, Autor de toda verdade, de todo bem e de toda luz. Esta postura de alma de pedir conselho é a postura católica por excelência. 

Ora, como a Santa Mãe de Deus é a intermediária de todas as graças, temos todo fundamento de fazer uma oração a Nossa Senhora do Bom Conselho, considerando que Ela leva a Ele os nossos pedidos de bons conselhos. E Ela traz para nós a graça do bom conselho, quer dizer, aquilo que o Espírito Santo comunica a Ela e que devemos saber para nossa orientação. 

Assim, entendemos bem o que é Nossa Senhora do Bom Conselho, por meio da qual podemos obter o bom conselho nas nossas aflições, perplexidades e outras dificuldades. Este é o sentido da devoção a Ela. 

Uma resolução prática para nossa vida espiritual: invocarmos muito a Nossa Senhora do Bom Conselho, e não fazermos habitualmente nada de importante sem pedir a Ela um conselho. Mesmo nas coisas pequenas, pedir, porque Ela deseja ser invocada também nas coisas pequenas, nas oportunidades aparentemente secundárias. Devemos pedir a Ela tudo. Portanto, com frequência dizer: "Minha Mãe, aconselhai-me". 

Bom conselho vindo do Céu 

Em todas as ocasiões da vida, poucas coisas um homem pode dar de tão importante para outro como um bom conselho. 

Os antigos tinham muito mais do que nós a noção do valor de um bom conselho. No tempo dos eremitas que viviam em lugares desertos, por exemplo, as pessoas se embrenhavam pelos desertos para conversar com algum deles apenas para receber um conselho, para serem esclarecidas a respeito de algum ponto, para receber uma informação sobre alguma questão duvidosa, e, com a orientação, traçar um rumo na vida. 

Se isto se diz do valor do conselho humano, muito mais se dirá do conselho que vem do Céu. 

Nossa Senhora do Bom Conselho é quem nos dá essa dádiva extraordinária de um conselho nas circunstâncias difíceis de nossa vida. 

A invocação é muito bonita, pois indica Nossa Senhora em uma das suas tarefas mais maternas e mais próprias de Rainha do Universo, que é exatamente a de dar o bom conselho. 

Como Rainha do Universo, Nossa Senhora governa tudo. E o próprio de quem governa é não só dar ordens, como dar conselhos também. Conselhos, no caso d’Ela, que são ordens para nós, para aqueles que A amam verdadeiramente. 

Conselho para enfrentar os erros do mundo 

Nossa Senhora do Bom Conselho se compadece dos homens que não sabem como se orientar em determinada emergência, e lhes obtém a graça de uma iluminação interior, de um discernimento especial, de uma palavra que lhes vem de um bom amigo, de um bom diretor, de um livro bom — como, por exemplo, ocorreu comigo com o Livro da Confiança, do Abbé Saint-Laurent. Ela, de um modo ou de outro, nos faz chegar o conselho que desejávamos e pedíamos, a solução que procurávamos e que seria impossível sem Ela.

Quem é mais desorientado em nossos dias do que o contra-revolucionário? Tudo no mundo cotidiano, revolucionário e caótico, parece falar contra nós, parece mentir, parece dizer coisas que nos levarão para o erro e para o mal. Que remédio há para isto a não ser um bom conselho? Quem é que dá bom conselho neste mundo desvairado? 

Ninguém melhor que Nossa Senhora do Bom Conselho, que é por excelência a mãe e a conselheira do contra-revolucionário desgarrado nas aflições e nas penumbras, para não falar das trevas, do mundo de hoje. 

Não há mãe que não tenha movimento para aconselhar o seu filho, para lhe explicar algo. Está no instinto materno, ainda que o filho seja maior de idade, Nossa Senhora como nossa Mãe tem a tendência a nos aconselhar. 

Modo como a Mãe de Deus age nas almas 

Giorgio e De Sclavis atravessam o Adriático,
caminhando sobre as águas,
e acompanham a Imagem até chegar à Itália.
Como é o conselho de Nossa Senhora? Não devemos imaginar que é uma espécie de pequena revelação, algo como se a pessoa se sentisse em uma região mais ou menos indefinível de sua alma, uma pequena emoção, que de um jeito ou de outro tem a revelação de um bom conselho. Ela pode também, por um movimento sensível da graça, fazer-nos compreender algo. Mas esta é a via excepcional. 

O modo pelo qual habitualmente Nossa Senhora concede-nos o conselho pedido é por meio de um estímulo não sensível em nossa inteligência e em nossa vontade, pelo qual temos a impressão de estarmos pensando com o nosso próprio intelecto, de estarmos deliberando com a nossa própria vontade. Encontramos a solução para o problema que nos atormentava, as forças para tomarmos uma deliberação diante da qual nós nos sentíamos acovardados. 

Às vezes, o bom conselho não nos é dado por um movimento direto da graça em nossa alma. Mas Nossa Senhora põe em nosso caminho alguém que nos possa aconselhar. Ela nos faz ver que perguntando a este ou a àquele, nós teremos uma solução boa.

Mais do que qualquer conselheiro na Terra, Ela é conselheira porque é Mestra, Mãe e Rainha. Não há melhor conselho para os homens do que recorrer à doutrina da Igreja Católica e ver nela, à luz da fé, como o problema se resolve. Nossa Senhora fala sempre pela graça à nossa alma, no sentido de nos encaminhar rumo à Igreja Católica e para sermos filhos dóceis e fiéis a Ela. 

Esse conselho, muitas vezes, não é dado pelas vias normais, mas de modo extraordinário. A alma sente certa propensão interior que lhe faz perceber de um modo imponderável que ela está sendo estimulada por Nossa Senhora para uma determinada direção.

Do que tenho lido a respeito de devoção a Nossa Senhora, eu nunca encontrei referência a uma devoção a Ela tão perceptível como a de fazer sentir aos homens o seu conselho.

Milagroso quadro aparecido em Genazzano 

A Chegada – J. Schöpf (1779).
 Sacristia do Santuário
Nos livros — os autores tratam muitas vezes disso —, quando a pessoa está fazendo uma oração diante de uma estampa de Nossa Senhora do Bom Conselho de Genazzano[1] [festa litúrgica celebrada no dia 26 de abril], desde que a oração seja grata a Ela, a imagem como que toma vida, como que se anima e a pessoa que reza sente certo estímulo e certa alegria que lhe significa a aceitação do pedido feito pelo devoto. É uma espécie de promessa de que vai ser atendido na sua súplica. 

Muitas vezes também se dá o contrário: a imagem exprime a tristeza, o pesar, o desagrado, de maneira que as pessoas que rezam diante dela têm alguma iluminação interior a respeito disso. 

Devemos entender que Nossa Senhora é soberana nos seus dons e que se manifesta quando quer. Quando é para o bem de nossa alma e de acordo com os desígnios d’Ela, pode ser que nos conceda a graça, mas pode também, para provar a nossa fé, que não se manifeste, não nos diga nada. 

Como sabemos que Ela é a nossa boa Mãe e que atende sempre os nossos pedidos, devemos com tranquilidade fazer a nossa oração, confiar e não ficar procurando produzir ilusões na cabeça. 

Se a alguém tocar a felicidade de perceber que a imagem se lhe manifesta, agradeça a Nossa Senhora o carinho, procure ser fiel agindo de acordo com a manifestação e a orientação que Ela lhe concedeu. 

Essa peculiaridade não se manifesta apenas com o milagroso quadro de Nossa Senhora que apareceu na cidade italiana de Genazzano, mas também com incontáveis imagens d’Ela pela Terra[2]
____________ 
Notas: 
1. Quadro de Nossa Senhora trasladado miraculosamente pelos anjos, da Albânia, então invadida pelos muçulmanos, para a cidade de Genazzano (em 25 de abril de 1467), nas proximidades de Roma. Vide: https://catolicismo.com.br/acervo/Num/0208-209/p04-05.html
2. O conjunto deste texto é composto de trechos extraídos de quatro palestras de Plinio Corrêa de Oliveira, proferidas em 26-4-66, 26-4-71, 16-12-75 e 26-4-95.

22 de abril de 2025

525 anos da descoberta do Brasil — Missão grandiosa de um dos maiores povos da Terra


Desembarque de Cabral em Porto Seguro. Óleo sobre tela de Oscar Pereira da Silva (1904). Acervo do Museu Histórico Nacional (RJ)

  Paulo Roberto Campos 

O histórico dia 22 de abril de 1500 estava nos planos de Deus para ser a data do nascimento de um país-continente, que imaginaram ser uma ilha — donde o primeiro nome de nossa Pátria: Ilha de Vera Cruz. Depois, Terra de Vera Cruz e mais tarde adequadamente denominado Terra de Santa Cruz.

Estava atingida a meta da viagem ultramarina — incentivada pelo Rei Dom Manuel I, “O Venturoso” — com a descoberta pelos heroicos portugueses sob o comando do fidalgo Pedro Alvares Cabral. Eles aqui aportaram, no período pascal, com suas caravelas ostentando os estandartes da Ordem de Cristo.

Mais de três séculos antes, numa visão que Nosso Senhor Jesus Cristo concedeu ao primeiro Rei de Portugal, Dom Afonso Henriques (1109 – 1185) — o “Rei Fundador”, também cognominado “O Conquistador” — foi revelada a grandeza da missão da nação lusitana com a expansão marítima, a dilatação da Fé Católica pelo mundo e o descobrimento do Brasil, selado com a celebração da Primeira Missa na “Ilha” no dia 26 de abril, pelo franciscano Frei Henrique de Coimbra. 
Primeira Missa no Brasil – Victor Meirelles (1860), Museu de Belas Artes

Para marcar esse portentoso acontecimento de exatos 525 atrás, transcrevo trechos de um discurso antológico.* Ele foi proferido por Plinio Corrêa de Oliveira, no encerramento do IV Congresso Eucarístico Nacional, no dia 7 de setembro de 1942, no Vale do Anhangabaú (capital paulista), para uma multidão de mais de meio-milhão de pessoas [foto abaixo]. 

Seguem alguns trechos desse memorável discurso do Prof. Plinio sobre a grandiosa vocação do povo brasileiro. 



O grande celeiro da Igreja e da Civilização 


“No curso já quatro vezes secular da História do Brasil, jamais se reuniu assembleia mais solene e ilustre que esta. No momento em que a vida nacional caminha para rumos definitivos, quis a Divina Providência reunir em pleno coração de São Paulo os elementos representativos de tudo quanto fomos e somos, de todas as glórias de nosso passado e de nossas melhores esperanças para o futuro. [...] 

Senhores, é hoje o dia 7 de setembro. A data é expressiva, e estou absolutamente certo de que um imenso clamor se levantará neste glorioso dia, transpondo os limites do Estado e do País, para notificar ao mundo inteiro que, como um só homem, o Brasil se ergue contra o imperialismo nazista pagão que trama sua ruína e parece ter chamado a si, exatamente como seu sósia vermelho de Moscou, a diabólica empreitada de destruir a Igreja em todo o mundo. 

Contra os inimigos da Pátria que estremecemos, e de Cristo que adoramos, os católicos brasileiros saberão mostrar sempre uma invencível resistência. Loucos e temerários! Mais fácil vos seria arrancar de nosso céu o Cruzeiro do Sul, do que arrancar a soberania e a Fé a um povo fiel a Cristo, e que colocará sempre seu mais alto título de ufania em uma adesão filialmente obediente e entusiasticamente vigorosa à Cátedra de São Pedro. [...] 

“Os mares parecem cantar a glória futura de um dos maiores povos da Terra”

Talvez não fosse ousado afirmar que Deus colocou os povos de sua eleição em panoramas adequados à realização dos grandes destinos a que os chama. E não há quem, viajando por nosso Brasil, não experimente a confusa impressão de que Deus destinou para teatro de grandes feitos este País, cujas montanhas trágicas e misteriosas penedias parecem convidar o homem às supremas afoitezas do heroísmo cristão, cujas verdejantes planícies parecem querer inspirar o surto de novas escolas artísticas e literárias, de novas formas e tipos de belezas, e na orla de cujo litoral os mares parecem cantar a glória futura de um dos maiores povos da Terra. 

“As montanhas trágicas e misteriosas penedias parecem convidar o homem às supremas afoitezas do heroísmo cristão”

Quando nosso poeta cantava que "nossa terra tem palmeiras onde canta o sabiá, e as aves que aqui gorjeiam não gorjeiam como lá”, percebeu, talvez confusamente, que a Providência depositou na natureza brasileira a promessa de um porvir igual ao dos maiores povos da Terra. 

E hoje, que o Brasil emerge de sua adolescência para a maturidade, e titubeia nas mãos da velha Europa o cetro da cultura cristã que o totalitarismo quereria destruir, aos olhos de todos se patenteia que os países católicos da América são na realidade o grande celeiro da Igreja e da Civilização, o terreno fecundo onde poderão reflorir, com brilho maior do que nunca, as plantas que a barbárie devasta no velho mundo. A América inteira é uma constelação de povos irmãos. Nessa constelação, inútil é dizer que as dimensões materiais do Brasil são uma figura da magnitude de seu papel providencial. 

Tempo houve em que a História do mundo se pôde intitular 'Gesta Dei per Francos'. Dia virá em que se escreverá 'Gesta Dei per brasilienses' — as ações de Deus pelos brasileiros.

A missão providencial do Brasil consiste em crescer dentro de suas próprias fronteiras, em desdobrar aqui os esplendores de uma civilização genuinamente católica, apostólica, romana, e em iluminar amorosamente todo o mundo com o facho desta grande luz, que será verdadeiramente o 'lumen Christ' que a Igreja irradia. Nossa índole meiga e hospitaleira, a pluralidade das raças que aqui vivem em fraternal harmonia, o concurso providencial dos imigrantes que tão intimamente se inseriram na vida nacional, e mais do que tudo as normas do Santo Evangelho, jamais farão de nossos anseios de grandeza um pretexto para jacobinismos tacanhos, para racismos estultos, para imperialismos criminosos. Se algum dia o Brasil for grande, sê-lo-á para bem do mundo inteiro. 

'Sejam entre vós os que governam como os que obedecem', diz o Redentor. O Brasil não será grande pela conquista, mas pela Fé; não será rico pelo dinheiro tanto quanto pela generosidade. Realmente, se soubermos ser fiéis à Roma dos Papas, poderá nossa cidade ser uma nova Jerusalém, de beleza perfeita, honra, glória e gáudio do mundo inteiro. [...] 

Plinio Corrêa de Oliveira,
então com 34 anos, discursa
na sessão de encerramento do
Congresso Eucarístico de 1942.
Em um Brasil imensamente rico, vereis florescer um povo imensamente rico, vereis florescer um povo imensamente grande, porque dele se poderá dizer: 

Bem-aventurado este povo sóbrio e desapegado, no esplendor embora de sua riqueza, porque dele é o reino dos Céus. 

Bem-aventurado este povo generoso e acolhedor, que ama a paz mais do que as riquezas, porque ele possui a Terra. 

Bem-aventurado este povo de coração sensível ao amor e às dores do Homem-Deus, às dores e ao amor de seu próximo, porque nisto mesmo encontrará sua consolação. 

Bem-aventurado este povo varonil e forte, intrépido e corajoso, faminto e sedento das virtudes heroicas e totais, porque será saciado em seu apetite de santidade e grandeza sobrenatural. 

Bem-aventurado este povo misericordioso, porque ele alcançará misericórdia.


Bem-aventurado este povo casto e limpo de coração, bem aventurada a inviolável pureza de suas famílias cristãs, porque verá a Deus. 

Bem-aventurado este povo pacífico, de idealismo limpo de jacobismos e racismos, porque será chamado filho de Deus. 

Bem-aventurado este povo que leva seu amor à Igreja a ponto de lutar e sofrer por ela, porque dele é o reino dos Céus”. 
__________________ 
(*) Transcrito de “O Legionário” de 7-9-1942 (Órgão oficioso da Arquidiocese de São Paulo). A íntegra encontra-se disponível no link: http://www.pliniocorreadeoliveira.info/Disc_Congr_Eucar_42.htm

19 de abril de 2025

CHRISTUS VINCIT! CHRISTUS REGNAT! CRISTO IMPERAT!


✅  Paulo Roberto Campos 

Com a Ressurreição de Nosso Senhor Jesus Cristo, nossa Fé ficou para sempre confirmada, assim como a certeza absoluta no seu triunfo final sobre as trevas infernais, que parecem triunfar com a Revolução gnóstica e igualitária impregnando a mentalidade da generalidade dos homens. 

Um triunfo meramente aparente, como foi aparente o triunfo do rei das trevas com a crucifixão e morte de Jesus no alto do Calvário. 

Entretanto, sua morte não foi o fim; seu holocausto foi o triunfo da vida sobre a morte. Três dias depois raiou a Ressurreição! Não temos mais o que temer; nada derrotará aqueles que têm fé! Ele está e estará conosco para sempre! Ele morreu, e Ressuscitou, para dar aos fiéis a vida eterna! 

Nesse sentido, seguem alguns pensamentos para refletirmos nesta Páscoa, o Domingo da Ressurreição. 



“Por que buscais entre os mortos aquele que está vivo? Não está aqui, mas ressuscitou.” 
 (São Lucas 24, 5-6) 

"Ignorais que todos os que fomos batizados em Jesus Cristo, fomos batizados na sua morte? Fomos, pois, sepultados com Ele na sua morte pelo batismo para que, como Cristo ressurgiu dos mortos pela glória do Pai, assim nós também vivamos uma vida nova. Se fomos feitos o mesmo ser com Ele por uma morte semelhante à sua, sê-lo-emos igualmente por uma comum ressurreição." 
(São Paulo, Rom. 6, 3-5) 

“Se não se pode pensar na Paixão, por ser penoso, quem nos impede de estar com Ele depois de ressuscitado, pois tão perto O temos no Sacramento, onde já está glorificado?” 
 (Santa Teresa de Jesus) 

“Nossa Senhora nos ensina a perseverança na fé, no senso católico e na virtude do apostolado destemido — ‘Fides intrepida’ — mesmo quando parece tudo perdido. A Ressurreição virá logo. Felizes os que souberem perseverar como Ela, e com Ela. Deles serão as alegrias, em certa medida as glórias, do dia da Ressurreição.” 
(Plinio Corrêa de Oliveira)

18 de abril de 2025

CONVERTIDOS PELO SANTO SUDÁRIO

 

Cientistas examinam o Santo Sudário 

·        Afonso de Sousa

 

Uma das mais preciosas e espetaculares relíquias da Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo para os católicos é o Santo Sudário de Turim, alvo lençol no qual envolveram piedosamente o corpo do Salvador depois de o descerem da Cruz.

Esse lençol é tão intrigante, que se tornou a peça mais estudada de toda a história humana. No século passado, como veremos, a ciência moderna completou centenas de milhares de horas no detalhado estudo sobre o Sudário, e a grande maioria dos cientistas nele envolvidos foram praticamente unânimes em afirmar sua autenticidade, o que levou a uma boa parte deles a se converter à fé católica ou a praticá-la mais seriamente.

Apesar do discordante e suspeito teste do Carbono-14 com o qual quiseram provar que essa santa relíquia é apenas uma peça pintada na Idade Média, cientistas rejeitaram tal teste e continuam afirmando que ficou comprovado que o Sudário teve origem na Palestina, no tempo de Nosso Senhor Jesus Cristo.

O que muito impressiona e impressionou grande parte dos cientistas que se puseram a analisar o Santo Sudário é sua majestade e fisionomia de paz em meio às maiores aflições. Feito por pessoas de diversas orientações — protestantes, agnósticos, ateus —, o estudo dessa impressionante relíquia levou vários deles à Igreja Católica, como veremos adiante.

 

“Diante das evidências, como permanecer agnóstico?”

        

Artigo no National Catholic Register relata: “Em 1994, após anos de intenso estudo, o médico californiano Augusto Accept chegou a uma conclusão sobre o Sudário de Turim. Em sua mente, a evidência científica [de sua autenticidade] era esmagadora. [Concluiu:] O Sudário, de fato, é a mortalha de Jesus Cristo. Ao contemplar a imagem do rosto crucificado de Cristo milagrosamente impresso no Sudário e preservado ao longo dos séculos, ele sabia que teria de enfrentar uma questão pessoal sobre a qual vinha ponderando nos dois anos anteriores de seu estudo: como ele poderia permanecer agnóstico?”.

         Augusto Accept cresceu no sul da Califórnia e foi muito ligado à Igreja em sua juventude. Contudo, na faculdade se deixou influenciar pelos agnósticos que afirmavam que religião e ciência eram incompatíveis, e acabou abandonando a prática da fé.

         Depois de formado casou-se com uma protestante fundamentalista, teve dois filhos e se uniu à igreja dela.

         Seu primeiro encontro com o Sudário foi na sua adolescência, em leituras sobre ele. Na faculdade de medicina tornou-se amigo de Allan Wanger, proeminente cientista do Sudário de Turim. Isso o levou a se interessar pelo assunto do ponto de vista de suas áreas de interesse, isto é, medicina, química e física.

 

Projeto de Pesquisa do Sudário de Turim

        

Entretanto, o interesse pelo Santo Sudário nos meios científicos já atraíra a atenção de muitos estudiosos. Em 1977, um grupo de cientistas formados ao acaso, adeptos de diferentes confissões religiosas — católicos, agnósticos, mórmons, judeus e protestantes de diversas denominações —, atraídos pelo enigma do Santo Sudário, fundaram o STURP – Shroudof Turin Research Project (Projeto de Pesquisa do Sudário de Turim).

         Esse grupo de tal maneira foi envolvido pelo tema, que seus membros chegaram a dispor até mesmo dos próprios recursos pessoais para levar adiante suas pesquisas, empregando horas e horas de suas obrigações diárias em um projeto inteiramente alheio à suas necessidades profissionais.

         Às suas expensas, eles foram a Turim, onde durante cinco dias (120 horas seguidas), auxiliados por uma equipe italiana, submeteram o Santo Lençol a todo tipo de provas e análises, utilizando os mais sofisticados meios da tecnologia.

Ao terminar a análise, o Dr. Thomas D’Humala, coordenador do projeto, testemunhou: Todos nós pensávamos que o que íamos descobrir era apenas uma falsificação, e que antes de se passar meia hora, teríamos de fazer as malas e voltar. Mas não foi assim. Todos os que fomos lá, pelo menos todos aqueles com quem falei a respeito, estamos convencidos de que o acúmulo de provas nos fez mudar de rumo. Agora, as provas são contra os céticos”.1

 

 O público aprecia uma réplica do Santo Sudário numa das muitas exposições já realizadas pelo mundo todo.

“Um processo de crescimento na fé”

         Aos poucos, ao analisar a figura do Sudário, o Dr. Accept começou a considerar que a imagem nele impressa era a de um corpo em estado de rigor mortis que ainda não tinha sofrido corrupção, o que se daria cinco dias após sua morte. Ora, isso era condizente com as Sagradas Escrituras, que narram a Ressurreição de Cristo no terceiro dia após sua crucificação.

         Além disso, a húngara Isabel Piczek, sua amiga e especialista em história da arte, fizera um estudo em que chegara à conclusão de que a imagem do Sudário não podia ter sido, como afirmavam os agnósticos, pintada por um artista medieval que não tinha as técnicas necessárias para isso, e que sua aparência no tecido continua inexplicável pela ciência.

         Tudo isso fez com que o Dr. Accept se dedicasse intensamente entre 1992-1994 ao estudo do Sudário de Turim. À medida que se aprofundava no estudo de sua autenticidade, suas dúvidas iam sendo respondidas uma a uma. Ele diz que esse período foi para ele simultaneamente “um processo de crescimento” em sua fé, de modo que em 1994 convenceu-se de que era hora de dedicar novamente sua vida a Cristo. Pelo que conclui: Em contraste com muitos [estudiosos] no século XX, a ciência me trouxe de volta a Deus.

 

 Cientistas do STURP – Shroudof Turin Research Pro ject (Projeto de Pesquisa do Sudário de Turim) fazem aprofundados estudos de cada detalhe do Sudário. 

“A que Igreja foi o Sudário confiado?”

         Uma vez convencido de que o Sudário trazia o corpo de Cristo, Accept queria saber qual das milhares de denominações cristãs do mundo foi a que Jesus Cristo fundou. Sendo por natureza um estudioso, ele se pôs a estudar teologia e história eclesiástica. Quando começou a ler as obras dos primeiros Padres da Igreja e viu a doutrina católica em seus ensinamentos e práticas, encontrou a resposta: Fiquei emocionado ao encontrar Cristo na Igreja Católica. Quando comecei meu estudo, nunca pretendi voltar a ela. Mas foi para lá que meu processo de busca pela verdade me levou”. E comentou que não é coincidência que o Sudário lhe seja confiado.

         Coerente consigo mesmo, o Dr. Accept quis que sua experiência fosse compartilhada por outros. Por isso, em 1996 ele fundou em Silverado, no condado de Orange, o “Centro do Sudário do sul da Califórnia”, onde faz uma apresentação ilustrada de todo o roteiro histórico do Santo Sudário. Isso atraiu muitos guias turísticos como voluntários ao longo dos anos.

         Uma das pessoas que ele dirigiu em um tour foi o cientista Stephen Sheyn, que recentemente havia voltado à Igreja Católica. Ao terminar o tour, Stephen caiu em lágrimas e disse: Senti que estava na presença de Nosso Senhor, experimentando sua humanidade e divindade.

 

Imagem do Santo Sudário em 3 dimensões.

“As palavras não podem descrevê-lo”

         O Santo Sudário é exposto periodicamente na sua basílica em Turim, para ser venerado pelos fiéis. Em 1998, o Papa João Paulo II, após rezar diante dele, comentou que ele é um desafio à nossa inteligência [...] uma imagem que todos podem ver, mas ninguém ainda pôde explicar.

         O Dr. Augusto Accept fez sua primeira viagem a Turim para essa mesma exposição. Depois de permanecer em profundo e reverente silêncio, por quase duas horas, diante do Santo Sudário, ao lado de outros peregrinos, ele afirmou: Foi impressionante! As palavras não podem descrevê-lo”.

         Evidentemente houve e há muitos cientistas agnósticos, hereges ou simplesmente ateus que não se dobram às evidências e continuam a afirmar que o Santo Sudário de Turim é uma falsificação que não tem valor.

         Cremos que a ele se pode aplicar, com propriedade ainda maior, aquilo que o grande Papa São Pio X afirmou da Santa Casa de Loreto: para o espírito católico, ainda que não se tivessem todas as provas históricas e científicas que seriam de desejar, o fato de aquela relíquia ter, ao longo das gerações, despertado a piedade de tantos fiéis e edificado a numerosos Santos que a contemplaram, já ofereceria garantia suficiente de sua autenticidade.2

____________

Notas

1.       Cfr. Plinio Maria Solimeo, O SANTO SUDÁRIO - Testemunho da Paixão, Morte e Ressurreição de Cristo, Artpress, São Paulo, 2014.

2.       Outras fontes:

https://www.ncregister.com/blog/shroud-center-of-southern-california

https://www.religionenlibertad.com/personajes/129321087/august-accetta-medico-conversion-sabana-santa-ciencia-fe.html?eti=8278

17 de abril de 2025

Pompas reais de Jesus Cristo reveladas pelo Santo Sudário

 

 Museu do Santo Sudário, em Turim

Ficou cientificamente expresso no Santo Sudário de Turim que Nosso Senhor foi sepultado com símbolos e honras exclusivas dos reis de Israel

 

·         Luis Dufaur

 

A exposição itinerante “The Mystery Man” — da qual tratamos na edição de junho/2023 desta revista — continua percorrendo a Espanha e, enquanto escrevemos, é exibida nas catedrais de Caravaca de la Cruz, em Múrcia, e de Elche, no Alicante. Seu giro suscita um interesse sempre renovado pelo Santo Sudário que envolveu o Corpo Santíssimo de Jesus, tendo sido publicados depoimentos de especialistas com novas descobertas, entre eles os do Dr. Jorge Manuel Rodríguez Almenar, professor de Direito na Universidade de Valencia e presidente do Centro Espanhol de Sindonologia. Este centro é formado por especialistas que estudam o Santo Sudário cientificamente, respeitando as Sagradas Escrituras.

O Prof. Rodríguez Almenar mostrou que Nosso Senhor Jesus Cristo recebeu em seu sepultamento o mesmo tratamento reservado aos reis de Israel. Tanto pelo lado paterno, São José, como pelo materno, a Santíssima Virgem, Ele foi príncipe da casa real fundada pelo rei David. Se se respeitasse o direito, Jesus herdaria a coroa. Mas ela estava nas mãos de usurpadores, porque o direito dinástico não era mais respeitado pelas autoridades do tempo.

 

Cristo Rei – Basílica de Cristo Rei, Paola (Arquidiocese de Malta).

Genealogicamente Nosso Senhor era o herdeiro legítimo


A genealogia de Maria descrita por São Lucas (3, 23-38) mostra a linhagem real de seu Divino Filho, sendo Ela descendente de Abraão, patriarca fundador do povo eleito, e de David, fundador da estirpe dos reis de Israel.

Os evangelhos de São Mateus (1, 1-17) e de São Lucas (3, 23-38) descrevem a linhagem real de “Jesus Cristo, filho de David, filho de Abraão” (Mt 1, 17). Por sua vez, São José era sucessor por via masculina do rei David, também da tribo de Judá. Em consequência, Jesus Cristo era o primogênito, herdeiro dos direitos da casa de David. 

A série de usurpadores — iniciada por Herodes I Magno, descendente de Esaú, e continuada por seus filhos, entre os quais, Herodes III Antipas, do tempo da Paixão — ocupava o trono por intrigas com Roma, sendo odiada pelo povo. 

Israel era um protetorado romano controlado por uma legião militar sob o comando do cônsul Pôncio Pilatos, a quem não interessava esse problema dinástico. Ele só queria garantir o domínio dos Césares na região e ser promovido na administração do Império. Entretanto, a questão da monarquia de Jesus — e não só a sua superioridade como Sumo Sacerdote porque Filho de Deus — está no centro dos iníquos processos que levaram à sua crucifixão. 


 

Jesus entrou em Jerusalém como entrara outrora Salomão


O rei Salomão entra em Jerusalém
montado em uma mula.
Até os Reis Magos, vindos de outros países, sabiam da estirpe régia de Jesus Cristo. Por isso, quando chegaram a Jerusalém, perguntaram “onde está o rei dos judeus que acaba de nascer?” (Mt 2,2). Herodes, sempre ignaro da legitimidade, apelou aos príncipes dos sacerdotes e aos escribas do povo. E estes responderam que o profeta Miqueas (Miq 5,2) anunciara onde nasceria o rei prometido, o Emanuel: “Belém, terra de Judá, [...] de ti sairá o chefe que governará Israel, meu povo” (Mt 2, 4-6). Os Apóstolos também, antes de Pentecostes, viam nele um futuro rei e até especularam sobre o posto que teriam na sua corte: “pelo caminho haviam discutido entre si qual deles seria o maior” (Mc 9, 31). 

Todos os Evangelhos (Mt 21, 1-11; Mc 11, 1-11; Lc 19, 28-40; Jo 12, 12-15) descrevem Nosso Senhor Jesus Cristo ingressando em Jerusalém montado num jumento, sob aclamações populares que só podiam ser feitas a um rei messiânico anunciado pelos profetas como um rei sacrossanto, inviolável e ideal, sobre quem repousa o espírito divino, que governará com sabedoria e justiça, prudência e coragem, ciência e temor de Deus.

Essa entrada em Jerusalém no Domingo de Ramos (Mc 11, 2; Lc 19, 30) só tinha um precedente: o ingresso histórico de Salomão montado numa mula que lhe foi dada por David: “fazei montar na minha mula o meu filho Salomão” para ser ungido rei (1Rs 1, 32-40). O povo estendeu suas vestes no caminho como fazia a seus monarcas (Lc 19, 35-37).

Nosso Senhor não impediu que O aclamassem rei com as palavras “Hosana ao Filho de David! Bendito o que vem em nome do Senhor!” (Lc 19, 38-40; Mt 21, 9,15). Porém, Ele nunca reivindicou o reinado temporal sobre Israel, mas sim uma monarquia completa e divina sobre toda a ordem da Criação, no sentido contido na devoção a Cristo-Rei. Entretanto, o Sinédrio, conhecedor do que estava escrito e vendo a reação do povo, reiterou sua vontade de matá-Lo.

O Sinédrio acusou Nosso Senhor diante Pilatos de se dizer rei dos judeus, única acusação que impressionaria o cônsul romano. Este então O interrogou: “És o rei dos judeus? Sim, respondeu-lhe Jesus” (Mt 27, 11), esclarecendo que era sobretudo Rei de um reino mais alto: o dos Céus e de toda a Terra. Para Pilatos foi suficiente para encerrar o caso e declarar que não via culpa alguma em Jesus.

Porém, o populacho, instigado pelo Sinédrio, bradava: “Não temos outro rei senão César”. Agindo assim, eles recusavam o Redentor prometido pelos Patriarcas e pelos Profetas, bem como seu rei legítimo, sucessor de David. Interessado somente nos efeitos do processo em Roma, Pilatos indagou aos sacerdotes: “Hei de crucificar o vosso rei?”. E os sumos sacerdotes confirmaram: “Não temos outro rei senão César!” (Jo 19, 15) e acrescentaram que se não O matasse, eles o denunciariam ao imperador. O argumento de perder os favores de César levaram o venal Pilatos a cometer o pior crime da História, lavando as mãos para demonstrar que não era responsável pela acusação.

Por fim, Pilatos mandou fixar no alto da Cruz uma tábua com a inscrição, em grego, hebraico e latim: “Jesus Nazareno Rei dos Judeus” (Iesus Nazarenus Rex Iudaeorum). É o I.N.R.I. que vemos habitualmente nos crucifixos. Era esse o “crime” alegado pelo Sinédrio, porém “os sumos sacerdotes dos judeus disseram a Pilatos: Não escrevas: Rei dos judeus, mas sim: Este homem disse ser o rei dos judeus”. Agastado, Pilatos os repeliu dizendo: “O que escrevi, escrevi.” (Jo 19, 19-22) 

 

À semelhança de Salomão, Nosso Senhor Jesus Cristo, sendo igualmente rei, entra em Jerusalém no lombo de uma mula (Pietro Lorenzetti (1280-1348). Basílica Inferior de São Francisco, Assis)


Santo Sudário aponta “rito funerário próprio de um rei”


Prof. Rodríguez Almenar
O Prof. Rodríguez Almenar [foto ao lado] focaliza os símbolos no enterro de Nosso Senhor. Tendo sido crucificado como um malfeitor, seu Corpo deveria ser jogado numa fossa comum. Porém, foi envolvido com o Santo Sudário — um tecido de 4,42m x 1,13m destinado para fazer as vestimentas alvíssimas com as quais o Sumo Sacerdote do Templo ingressava no Sancta Sanctorum onde estava a Arca da Aliança com as Tábuas da Lei, na cerimônia mais santa e mais solene do ano, o Yom Kippur ou “Dia da Expiação”, ou “Dia do Perdão”. Essa máxima solenidade havia sido ordenada por Deus a Moisés (Lev 23-27). Contudo, a Arca da Aliança contendo as tábuas dos Dez Mandamentos estava desaparecida desde o século VI a.C., quando Jerusalém foi invadida por Nabucodonosor II, o rei da Babilônia que escravizou os judeus e os levou para a Caldeia. 

O Sumo Sacerdote devia se apresentar revestido com uma sarja de linho puro em “espinha de peixe”, ao que tudo indica vinda da Índia, desconhecida no Oriente Médio e que só se usaria na Europa a partir do século XV. Esse tecido requintadíssimo, o mais caro que se podia achar em Jerusalém, teria sido obtido no próprio Templo por José de Arimateia — homem riquíssimo, “discípulo oculto” e membro do Sinédrio — e entregue por ele, porque considerava que Jesus merecia um enterro digno de um rei e Sumo Sacerdote. Também providenciou o túmulo que tinha mandado fazer para si, exclusivo de pessoas muito ricas.

Nosso Senhor, pelo valor infinito de sua Redenção, agiu como o divino Sumo Sacerdote que com seu sacrifício redimiu a humanidade do pecado original. Era coerente que fosse envolvido nesse tecido simbólico da expiação. 

 

A Dedicação do Templo de Jerusalém construído pelo Rei Salomão - Bíblia de William Brassey Hole. O Sumo Sacerdote se apresentava com uma roupagem alvíssima, feita com o mesmo tipo de pano usado séculos depois no Santo Sudário.

Outros símbolos monárquicos no Sudário


No Santo Sudário também foram encontrados vestígios de unguentos usados no enterro dos reis, como os menciona o historiador Plinio o Velho (23-79 d.C.). A Dra. Marzia Boi [foto], professora da Universidade das Ilhas Baleares, aprofundou o estudo dos ritos dos sepultamentos reais no Mediterrâneo no século I e apontou os óleos, bálsamos e unguentos — entre os quais se destacava em alta proporção o pólen de Helichrysum, ou Sempreviva amarela, além de Crisântemo e Amaranto, símbolos da imortalidade, que eram aplicados na preparação do corpo dos reis ou personagens de alta estirpe. Ela mostrou que o sepultamento de Nosso Senhor foi realizado com honras próprias aos reis, e implicava a “preparação do cadáver com bálsamos e óleos” do modo como foi feito. 


Também o microscópio revelou tipos de flores que, “conforme está documentado desde remotos tempos”, eram usualmente utilizadas nos enterros reais. Destacou os pólens de Helichrysum, láudano, terebinto, gálbano aromático ou lentisco. Esse uso estava de acordo com a estirpe régia de Jesus Cristo. E coube a Nossa Senhora, sua Mãe com o auxílio das santas mulheres, preparar o Santíssimo Corpo de seu Filho para a sepultura de acordo com os costumes da família real. 

 

Embalsamaram e envolveram o Divino Corpo no Santo Sudário sobre a Pedra da Unção hoje venerada na igreja do Santo Sepulcro

Sepultamento único, próprio a um rei


Tudo pesado e medido, o Prof. Rodríguez Almenar conclui que no caso do Homem do Santo Sudário “não se tratou de um sepultamento qualquer, mas se praticou um rito funerário próprio de um rei”. Foram Nossa Senhora, princesa da casa de David, e as santas mulheres também de extração aristocrática, observantes da Lei de Moisés, que sabendo como agir com gente de alta extração, embalsamaram e envolveram o Divino Corpo no Santo Sudário sobre a Pedra da Unção hoje venerada na igreja do Santo Sepulcro.

O presidente do Centro Espanhol de Sindonologia conclui que todos os dados do Santo Sudário apontam que Jesus Cristo foi enterrado como um monarca. O contrário implica em achar que todos os dados cientificamente compulsados não fazem sentido.

A ciência sublinha assim, com suas descobertas, o valor infinito da Redenção obtida para a nossa salvação por um monarca supremo do povo eleito e o Sumo Sacerdote que foi Deus feito homem. As descobertas científicas no Santo Sudário inspiram reflexões próprias para a Semana Santa. Sendo Rei de todas as almas e implicitamente de cada pessoa, Jesus Cristo governa cada uma com a solicitude, o afeto e a atenção como se ela fosse a única alma sobre a qual Ele exercesse o seu império. Ele é o modelo de todos os reis ou chefes de Estado; é Rei de misericórdia e de amor, de um reinado que “não é deste mundo” (Jo 18, 36) com o intuito de levar cada alma a seu Reino verdadeiro que não terá fim. 

O Santo Sudário como que reservou estas comprovações da Majestade suprema de Cristo-Rei para nossa época a fim de reavivar a lembrança da soberania universal de Jesus Cristo sobre as pessoas e os povos. Precisamente para nossa época, cada vez mais seduzida por opções falsas ou iníquas — sejam elas liberal-democráticas, libertárias ou socialo-comunistas ou, no campo religioso, falsos ecumenismos e relativismos concessivos às piores abominações morais, teológicas ou litúrgicas.