Paulo Roberto Campos
Numa recente viagem a Paris (a primeira em minha vida), preparei-me e fui “escudado” para receber todo tipo de “alfinetadas”, descortesias, indiretas, diretas, “patadas” etc., pois — era o que eu ouvia aqui no Brasil —, “na atualidade, em geral o francês é ranzinza e trata mal todo mundo”. Um engano! Fiquei muitíssimo surpreso, e encantado, ao encontrar o oposto do que ouvia. Encontrei os franceses extremamente amáveis, manifestando suprema cortesia em atender, em dar informações, até pormenorizadamente, a um estrangeiro como eu. Poderia dar vários exemplos do bom trato recebido e das boas maneiras que presenciei.
Se o francês foi ranzinza (ou ainda o é), ele não manifesta sua “ranzinzice”. A gentileza impera. Não sei se posso generalizar, e nem sei se a França inteira é assim. Nem estou seguro para dizer que a França foi ranzinza e que agora mudou. Mas o testemunho que eu dou é que, atualmente, o parisiense apresenta-se muito cortês. É a impressão que tive nos inúmeros contatos com a gentileza na “Cidade Luz”, não presenciando grosserias ou indelicadezas no trato. Na verdade, uma só, mas creio que foi a exceção que confirma a regra.
Mas, é claro, você também precisa tratar os franceses com toda cortesia. Por exemplo, usei aqui o pronome “você” (o que parece compreensível no Brasil, ao me dirigir aos diletos leitores deste blog). Lá o pronome correto no caso é “Vous”, tanto para a Madame como para o Monsieur.
Um exemplo comezinho, mas que me encantou, pois já no primeiro e breve diálogo que tive, logo ao entrar no avião da Air France:
— Bonjour Monsieur!
— Bonjour Madame!
— Bienvenu!
— Merci!
Na França o “Bonjour” e o “Merci” são expressões quase sagradas. Ao entrar em qualquer estabelecimento, por exemplo numa boulangerie (padaria), não se pode — EM HIPÓTESE ALGUMA — ir logo fazendo o pedido da sua apetitosa baguette (pão longo) ou de qualquer outro saboroso petisco. Os franceses não veem isso com bons olhos, julgam uma falta de educação muito grave. Em primeiríssimo lugar, você tem que usar a expressão “Bonjour Madame” ou “Bonjour Monsieur”. Após ouvir o “Bonjour” da outra parte é que se pode então fazer o seu pedido. Isso antes de iniciar qualquer diálogo e em qualquer lugar, mesmo na rua. Do contrário, os franceses, até por cortesia, poderão não dizer nada, mas pensarão: “Esse sujeito é deselegante”. Num português curto e grosso: “Esse sujeito é um “casca-grossa”...
O “Merci” também é indispensável nesse “cerimonial”. Sempre respondido com o “de rien” (de nada) ou “je vous en prie”. Não sei se exagero, mas acho que a expressão que mais ouvi em todos os lugares de Paris foi o “Merci”. Em segundo lugar, o “Bonjour” e em terceiro o “Pardon, Monsieur”, “Pardon, Madame”.
Aqui abro um parêntesis: Alguém poderia objetar que isso (o modo de cumprimentar) é uma coisa insignificante que não modifica uma sociedade.
— Responderia que APARENTEMENTE é uma coisa insignificante, mas que essa simples, pequena e fácil manifestação de cortesia, de respeito pelo próximo, pode mudar a história de uma pessoa, de uma família, de um país. Um exemplo: Se alguém, ao cruzar com um vizinho, não o saúda com o “Bom dia, senhor fulano”, poderá deixá-lo magoado. Ademais, seu filho seguirá o exemplo, imitando sua descortesia com os colegas. Você poderá ter contribuído assim para que o filho seja grosseiro. A família poderá viver em atitudes grosseiras e em conflitos uns dando “patadas” nos outros. Seu filho quando crescer, o que será para a sociedade e para o País?
* * *
Fechando o parêntesis e encerrando esse post: Ainda não encontrei resposta para uma questão: Será que tendo perdido o trato delicado a França ficou ranzinza, mas que atualmente está reencontrando a cortesia perdida? Com saudades da “douceur de vivre” (doçura de viver) quotidiana na França do “Ancien Régime”? Como vimos no post anterior ( Em busca da cortesia perdida! ), na “Belle Époque”, ocorreu esse “reencontro” com algo do estilo de vida elegante e cortês do “Ancien Régime”. De passagem, falando de “Ancien Régime”, não resisto em inserir aqui um comentário de Talleyrand sobre essa época anterior à Revolução Francesa: “Ceux qui n'ont pas vécu avant 1789, ne connaissent pas la douceur de vivre" (“Aqueles que não viveram antes de 1789, não sabem o que é a doçura de viver”).
* * *
A propósito da impressão (sobre o reencontro com a cortesia) que trouxe da “Cidade Luz” — que muito me marcou, mas para a qual não encontrei resposta — pesquisei em alguns textos que guardo e deparei-me com uma conferência do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira — um grande admirador da “Douce et Belle France” — na qual ele tece interessante comentário sobre o país. Aqui ofereço um trechinho que selecionei para nossos leitores: Quadro exposto no Musée Carnavalet, em Paris (Foto PRC) |
3 comentários:
Francamente eu não sei dizer que França o Sr. visitou.
Em Paris sempre fui tratado com enfado, mau-educação e indiferença.
O governo frances chegou mesmo a fazer uma campanha do tipo, "Trata bem o turista".
A França perdeu o primeiro lugar para a Espanha e turismo justamente pela indelicadeza francesa.
Att.
Prof. Ivan Tadeu ...
Prezado Prof. Ivan Tadeu
Agradecendo a gentileza de seu e-mail, apenas tenho a dizer que sua perplexidade é compreensível.Também eu fiquei bastante perplexo por encontrar uma Paris bem diversa dos comentários que sempre ouvi (no mesmo sentido de sua mensagem) e também daquilo que tinha lido a respeito da falta de hospitalidade do francês. Por isso viajei preparado para não ser bem acolhido. Tal preparação foi desnecessária, uma vez que aconteceu o contrário.
Não sei se o Sr. esteve em Paris neste ano, mas retornei de lá no mês passado e fiquei “enchanté” por encontrar a “Cidade Luz” muito acolhedora, com seu povo extremamente cordial. Teria sido uma mera coincidência eu só encontrar e abordar franceses muito bem educados? Mesmo no metrô, procurava conversar com os vizinhos, às vezes a pretexto de pedir alguma informação, e SEMPRE fui atendido com aquela velha “gentillesse” e mesmo, ouso dizer, com algo daquela lendária bondade da “vieille France de jadis”.
Teria de fato ocorrido uma mudança real? Não posso garantir-lhe e por isso, às vezes, fico propenso a achar que foi coincidência. Quanto ao que o Sr. diz, de uma campanha governamental incentivando o povo a tratar bem os turistas, não sei dizer se seria suficiente para operar tal câmbio — a não ser que essa campanha tenha sido muito abrangente, bem feita e há muitos anos.
Procurando uma resposta para minha perplexidade, perguntei a “meus botões” se a crise econômica que assola o Velho Continente não teria se prestado a auxiliar o francês (só posso falar do parisiense em geral) a ficar mais humildade e, assim, começar a tratar com mais delicadeza os estrangeiros. Será? Nossos leitores se tiveram uma explicação para o “fenômeno”, que a envie para nosso esclarecimento, s.v.p.
Cordialmente,
Paulo R. Campos
Devo ser sincero, costumo sempre cumprimentar, mesmo quando não me respondem,antes de fazer qualquer pedido numa Padaria ou em um café, e mesmo quando num restaurante ou outra casa comercial. Isso as vezes assusta o funcionário, que parece estar completamente desconcertado pela falta de costume.
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