21 de maio de 2019

Um dia internacional da mulher, mas diferente

Grã-duquesa Maria Pavlovna da Rússia
Paulo Henrique Américo de Araújo 

Todos anos, no dia 8 de março, uma enxurrada de reportagens nas diversas mídias comemora o chamado “Dia Internacional da Mulher”. O ano de 2019 não deixaria de trazer a cantilena de sempre, e o sentido de revolta contra as normas católicas de comportamento se repete na leitura de qualquer publicação sobre o tema.

Bem significativa, neste sentido, é a informação do “Correio Brasiliense” sobre uma manifestação feminista no centro de Brasília,[1] na data mencionada. Jolúsia Batista, uma das organizadoras, ressaltou os objetivos do ato: “É dia de expressar uma luta organizada. Mas a luta é diária. Somos contra o conservadorismo do governo atual e contra o fundamentalismo cristão. Somos pró-legalização do aborto e contra a reforma [da previdência] como está, pois agrava o cenário, principalmente para as mulheres. Somos contra qualquer tipo de retrocesso”.

Não é meu intento analisar aqui o conteúdo da declaração (ou a ausência dele), nem fazer comentários sobre a agenda das manifestantes. Deixemos de lado esses aspectos, pois todos estamos saturados desse feminismo tacanho, distorcido e anticatólico. Em face dos devaneios feministas, parece-me a melhor iniciativa opor a eles exemplos de atitudes que ressaltam o real valor das mulheres. Lembrar modelos contrários ao do feminismo tem o efeito salutar de desintoxicar as pessoas do veneno que ele vem disseminando. E se as pessoas se deixarem desintoxicar, é bem possível que no futuro as comemorações do dia internacional da mulher realmente enalteçam as virtudes femininas características.

Alta nobreza na atitude de uma mulher

Um desses exemplos me caiu recentemente nas mãos, com a leitura das memórias da grã-duquesa Maria Pavlovna da Rússia,[2] prima-irmã do último czar Nicolau II. Nascida em 1890, ela viveu durante o auge da crise do Império Russo, passando pela Primeira Guerra Mundial, e finalmente pelas trágicas convulsões da revolução comunista. Com muita dificuldade ela conseguiu escapar da Rússia, ao mesmo tempo que os bolcheviques massacravam os membros da nobreza, inclusive seu próprio pai.

O período que nos interessa compreende a grande guerra de 1914-18. Como muitas mulheres da mais alta nobreza, a grã-duquesa Maria se engajou como voluntária para o serviço de enfermaria das tropas russas. Exerceu essa função com máximo empenho, durante quase todos os quatro anos do terrível conflito. No início, como simples auxiliar de enfermagem, e depois como enfermeira, procurando ocultar sua identidade para poder trabalhar em qualquer tarefa que lhe fosse requisitada, além de evitar lisonjas ou louvores. Depois, como seu prestígio e experiência aumentassem, assumiu o comando de um importante hospital de campanha.

Um pequeno episódio revela como, apesar de ser prima do imperador, Maria não procurava ostentar sua posição diante das tropas. No início da guerra, em uma aldeia perto do front de batalha, acabara de chegar um oficial com a mão ferida. Ao ver o grupo de enfermeiras, das quais uma era a princesa, ele perguntou:

— Irmãzinhas, não tereis por acaso uma atadura limpa para trocar o meu curativo?

O oficial não distinguia a grã-duquesa entre as enfermeiras. O tratamento que ele usou (irmãzinhas) para se dirigir a elas se explica pelo fato de as enfermeiras se trajarem à maneira de freiras. Maria se ofereceu de imediato para trocar o curativo. Enquanto o fazia, outro militar se aproximou sem que ela percebesse, e perguntou:

— Vossa Alteza Imperial permite que eu a fotografe?

Confusa, a princesa-enfermeira voltou-se, reconheceu o militar, e suplicou:

— Não, não faça isso, pelo amor de Deus!

Logo ela notou que a mão ferida da qual cuidava começou a tremer. O oficial ferido examinava-lhe atentamente o rosto, abaixando o olhar mais de uma vez, antes que o curativo estivesse concluído. A princesa permanecia em silêncio.

— Permite-me agora que lhe pergunte quem é? Indagou o oficial.

Maria não via mais motivos para ocultar seu nome, e após a revelação, o ferido outra vez lhe perscrutou o rosto em silêncio, e repentinamente ajoelhou-se na calçada, diante de todos, tomou nas mãos a barra do vestido da princesa e o osculou. Ela mesma conta que ficou perturbadíssima; e sem olhar para o oficial, sem despedir-se, fugiu em direção à farmácia.

Este belo fato revela muito mais do que a manifestação do respeito e admiração dos russos pelos membros da nobreza. Também não se trata apenas de um episódio no qual a força militar — a força física, diríamos — reconhece a superioridade de uma frágil enfermeira. Há no episódio algo mais revelador da mentalidade do russo, que a própria grã-duquesa explicita em suas memórias:

“A atitude dos soldados em relação a nós [enfermeiras] era profundamente tocante. Dir-se-ia que personificávamos para eles tudo o que lhes era caro, tudo o que lhes tocava o coração. Com nossas toucas brancas, representávamos de certo modo esse ente feminino superior, no qual se reúnem as qualidades de mãe e de esposa completadas pelas de religiosa, concepção especialmente apreciada pelo povo russo”. 

Aí está! A superioridade feminina se expressa justamente naquilo que ela tem de autêntico. Superioridade essa invariavelmente rejeitada pelas feministas radicais de hoje. Pergunto-me qual seria a reação daquelas manifestantes do dia 8 de março, se alguém lhes propusesse realçar esse tipo de elevação feminina...
Thomas Bruce o assassino de Jamie Schmidt (foto abaixo). No fundo, o lugar do crime.

Ato heróico de uma mulher não feminista 

Cito outro exemplo, agora dos dias atuais.[3] Em novembro de 2018, Jamie Schmidt entrou numa loja de artigos religiosos católicos na cidade de Saint Louis, Estados Unidos. Duas funcionárias ali trabalhavam na ocasião. Momentos depois, Thomas Bruce chegou ao estabelecimento, trocou algumas palavras com as mulheres e saiu da loja. Depois tornou a entrar, mas desta vez armado com uma pistola.

Diante da ameaça, as duas funcionárias foram obrigadas a se despir, e em seguida foram abusadas sexualmente pelo canalha. Jamie – católica praticante, casada e mãe de três filhos – forçada a permanecer num canto da loja, testemunhou a horrível cena. Thomas então se aproximou, e apontando-lhe a arma, ordenou que ela também se despisse. Tudo que havia ocorrido com as outras duas mulheres se repetiria, mas...

Em momentos drásticos como esses surgem demonstrações de força de alma e personalidade que impressionam. O mais fácil para Jamie seria, talvez, tentar convencer o malfeitor com palavras meigas ou lágrimas desesperadas, numa chance de apaziguar seu ímpeto tresloucado; ou simplesmente ceder diante do perigo, e se deixar agredir sexualmente.

Não! Essa autêntica católica escolheu enfrentar a situação com uma dignidade cheia de fé – uma nova mártir da pureza, a exemplo de Santa Maria Goretti. A resposta à ordem do agressor foi pronta e irredutível:

— Em nome de Deus, eu não vou tirar minhas roupas!

Jamie Schmidt
O abusador deve ter percebido que ali não haveria meio termo nem acordo. Só lhe restava um único recurso: a violência. Disparou à queima-roupa contra o peito da mulher. Por mais paradoxal que possa parecer, essa atitude covarde revela quem só tinha mais força física: Jamie, obviamente! Ela morreu minutos depois, numa ambulância a caminho do hospital. Nos últimos suspiros, testemunhas ouviram Jamie recitar o Padre-nosso. O monstro-agressor foi preso após fugir, e responde pelo crime bárbaro diante dos tribunais. Espera-se que seja condenado à pena de morte.

Algum movimento feminista se lembrou da atitude honrada de Jamie Schmidt? Por que não exaltar o ato heroico daquela mulher, no dia internacional da mulher? Não espere nada disso, pois há muita coisa distorcida no movimento feminista...

Em razão de tudo isso, o site Returntoorder, impulsionado pela TFP norte-americana, está ajudando a promover uma campanha de substituição do dia internacional da mulher por outro muito diferente: o Lady Day. “A alternativa católica é chamada de Lady Day [Dia da Senhora ou da Dama]. O tema de 2019: ‘Comemorando a pureza e a coragem das mães’. [...] Uma resposta positiva, jubilosa e esperançosa no sentido de celebrar e honrar o plano de Deus para as mulheres, enquanto mães puras e corajosas”.[4]

Nada melhor do que o atualíssimo exemplo de Jamie Schmidt para contrapor à revolução feminista e ao seu fraudulento e midiático dia internacional da mulher.

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Notas 
1.https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/cidades/2019/03/08/interna_cidadesdf,741838/didia-internacional-da-mulher-leva-2-mil-pessoas-a-area-central-de-bra.shtml 
2. Memórias, Maria, grã-duquesa da Rússia, Livraria José Olympio Editora, Rio de Janeiro, sem data de publicação. 
3. http://www.returntoorder.org/2018/12/how-to-die-a-glorious-death-and-gain-honor/ 
4. http://www.returntoorder.org/2019/02/lady-day-2019-celebrates-purity-and-courageous-motherhood/

10 de maio de 2019

Notre Dame de Paris, a luz e as chamas

➤  Nelson R. Fragelli 

No tempo longínquo em que a reforma litúrgica imposta pelo Concílio Vaticano II encontrava adeptos ardentes, a celebração da Missa foi adquirindo um tom festivo, com canções novas e sermões otimistas exibidos em meio a representações cênicas deploráveis. Tudo sob medida para a Missa perder seu conteúdo de mistério. 

Com um grupo de amigos da TFP francesa, íamos à Missa dominical em Notre Dame de Paris. Um velho cônego da Catedral, hostil à reforma pós-conciliar, celebrava a Missa de acordo com Ordo tradicio0al, que São Pio V estabelecera durante o Concílio de Trento, como forma de combate ao laicismo protestante. Disposições pós-conciliares relegaram o Ordo de São Pio V à categoria de cerimônia apenas tolerada, e a nossa Missa em Notre Dame tinha que ser celebrada às oito horas da manhã, “escondida” num altar lateral. Nessa hora quase não havia frequentadores ou visitantes da catedral, mas o que certos hierarcas temiam era a força da tradição. 


Ambiente de grandeza e mistério 

Durante o inverno, a catedral fechada, ainda envolvida nas últimas sombras do alvorecer, parecia repousar. Tão imponente e majestosa, que preferíamos manter-nos em silêncio, mesmo estando do lado de fora, enquanto junto a ela aguardávamos que se abrissem as portas. Pontualmente às oito horas, dentro do santuário velhas aldravas e fechaduras rangiam, e o grande portal estremecia ao abrir-se apenas uma passagem de pequenas dimensões, existente na sua parte inferior.

Ao entrar, nossa primeira impressão agradável era sermos recebidos por uma espécie de “hálito da catedral”. Era o alento dos séculos, no qual se juntam o odor do incenso, a umidade das pedras, a fragrância de flores ressequidas, emanações enigmáticas de idades imemoriais. Odores da continuidade numa possante tradição, característicos dos edifícios seculares. 

Ainda na obscuridade, a catedral nos apresentava então as suas vastidões e o seu silêncio. Uma floresta bem ordenada de colunas, traves e nervuras, onde nada se movia. Na imensidão do templo imerso em denso silêncio, presenças invisíveis se impunham aos sentidos, como a de anjos que habitam espaços sagrados. A amplitude das naves e a altura dos arcos góticos se dilatavam aos nossos olhos, pasmados ao perscrutarem as altas ogivas de um extremo a outro de sua extensão. A sacralidade daqueles espaços benditos nos atraía, tornando lento nosso caminhar para o altar distante onde nosso venerável Cônego celebraria. Grandeza e mistério envolviam os sentidos, criando um instante passageiro no qual a eternidade se fazia sentir. 


Guerras e a inclemência dos tempos tinham destruído os vitrais junto à entrada. Substituídos por outros — monocromáticos, de tom esverdeado, inexpressivos — não tinham o esplendor dos painéis originais, cujas imagens narravam histórias santas em cores feéricas. Mas durante a Missa eu podia contemplar minúcias de grandezas: figuras da Natividade de Cristo, cujas faces de comoventes canduras se apresentavam como recém-saídas da mão do Criador; simples traços fisionômicos de personalidades acessíveis, revelando intenções firmes e fortes; figuras artísticas próprias à elevação e contemplação do mistério. A criatividade dos artistas e artesãos pôs naquelas feições disposições sobrenaturais, nas quais transluz a alma medieval. A penumbra da manhã encobria detalhes das imagens, mas nada tirava da beleza. A imaginação completava o que os olhos não discerniam, acrescentando-lhe traços sugeridos pela cândida inocência dos tempos idos e passados.

Ao fim da Missa, já o sol começava a acender os vitrais. Primeiramente os da abside voltada para o Levante, de onde veio a Luz do mundo, nosso Salvador. As cores são particularmente puras, pois vêm da Idade Média. No interior do templo, sobre quem os contempla, eles vertem luz, cores e prodígios. Mas na saída, ao contemplar a luz esverdeada dos vitrais monocromáticos, pensávamos numa “catedral submersa”, repousando no fundo de um oceano, à espera da fé de um povo que a resgatasse e a trouxesse à tona. E assim deixávamos Notre Dame e sua ternura materna, após a Missa tradicional dos domingos. 


Fisionomias humanizadas 

Do lado de fora, dávamos um último olhar à terna grandeza da catedral.

Olhando-a de longe, ela parece dominadora, a ponto de a cidade em torno desaparecer da atenção, obnubilada por sua grandeza. A fachada evoca uma fortaleza, onde as torres sobressaem como maciços torreões acastelados por contrafortes. São torres vigiando o mundo que se move a seus pés, e exprimem os olhos de Deus que tudo vê. Nelas se juntam à sua seriedade a Lei e os Profetas, evocando o Antigo e o Novo Testamento, ambos representados em esculturas da fachada.

 Outras vezes, contemplando-a de longe, suas pedras adquirem cor mais clara, em alguns períodos do dia ficam mais rosadas. Sua acolhedora fisionomia ilude então nosso senso de observador, fazendo-a parecer pequena como a catedral de uma aldeia em miniatura, e a fachada parece procurar seus amigos com terno olhar, a todos ela parece ver. Mostrando-se meiga, a catedral desperta nos filhos de Deus a vontade de aproximar-se. Sua majestade nada tem de esmagador. 

Entre as duas torres, a Mãe de Misericórdia tem seu Filho nos braços, abrandando todo rigor que os portentosos campanários tão oportunamente inspiram. Se a inflexibilidade das torres propõe um exame de consciência, junto a elas a rosácea central emoldura a imagem de Nossa Senhora, como um sorriso de perdão dado ao arrependimento. Maria nos diz que a severidade das torres se relaciona com os inimigos da Igreja, com os impenitentes e com o que pode haver de impenitência na alma de cada um. Mas Ela socorre os que a procuram com coração contrito. 

Notre Dame nos observa e nos convida, exprime-se como uma fisionomia humana. Suavemente penetra nas almas, chamando-as à Religião. Esse chamado é como um sopro divino que abala o materialismo infiltrado nas almas, restaurando partes arruinadas pelos erros deste século. Quem a visita, nunca mais a esquece, fica na memória como o lugar deste mundo no qual as almas encontram refrigério. E retorna à lembrança, da mesma forma que a luz volta a iluminar seus vitrais, passada a escuridão da noite. Seu consolo se aloja na recordação indelevelmente. Não será esta sutil impressão um dos dons de Notre Dame, que atrai tantos visitantes? 

O afeto filial torna mesmo imaginável tomá-la nos braços. Nisso ela se parece com a imagem central de sua fachada, representando Nossa Senhora com seu Divino Filho no colo. Transparece através de suas linhas e de seus adornos arquitetônicos o semblante da filha de São Joaquim e Sant’Ana — Notre Dame, ou Nossa Senhora — sendo apresentada no Templo de Jerusalém.


Um fogo que ilumina 

O fogo acaba de consumir uma parte significativa de Notre Dame. Estarrecidos, vimos a catástrofe que absolutamente não podia ocorrer: chamas vorazes, como que vindas do inferno, calcinavam aquele lugar celestial, trazendo à memória Santa Joana d’Arc, inocente e virginal, condenada ao suplício do fogo. Naquele instante — Joana d’Arc em sua agonia atroz, e a catedral em meio às chamas — davam de si uma figura mais santa do que nunca. Cresceram ambas na consideração de todos os homens. Sua beleza adquiriu assim um novo esplendor, iluminado pelas chamas do sacrifício. Assim é a beleza do martírio. 

Cessado o fogo, as imagens de seu interior impiedosamente calcinado causam profunda dor. As cinzas do santuário baixam sobre nossos corações em luto. Mas se ela devesse um dia desaparecer, formaria na mente dos que a veneram uma figura mais bela ainda do que ela tem sido durante os quase nove séculos de sua esplendorosa existência. Notre Dame não desaparecerá, mas também não é admissível restaurá-la com outra fisionomia. 


Um povo em luto 

No dia seguinte ao incêndio, acerquei-me da catedral. Temeroso de vê-la em meio à desolação das cinzas, assim mesmo fui. Grande número de pessoas em torno dela, tanto quanto era possível, pois um cinturão de segurança a rodeava. Em pequenos e silenciosos agrupamentos, falava-se pouco e em voz baixa, nas mais diversas línguas. Católicos ou não, todas as faces mostravam consternação, olhares pesarosos como se tivessem perdido um familiar querido. O sentimento de orfandade vagueava entre todos, mesmo nos que não tinham explicitamente tomado Nossa Senhora por mãe. Grupos de jovens rezavam o Rosário, ajoelhados e contritos. 

Esbarrei casualmente com a proprietária da lavanderia que me atende. Preocupada sempre com o esmero de seus trajes, a ostentação de seus enfeites e sua inserção no mundo, nunca pensei encontrá-la ali, onde não havia ambiente para futilidades. Cumprimentei-a passageiramente, quase sem fixá-la, mas ela me reteve. Notei então, pela primeira vez, traços de seriedade sob sua densa maquiagem: “Não pude conter as lágrimas, ao ver a transmissão ao vivo de Notre Dame em chamas”. Nunca imaginei que, sobre tantas camadas de cosméticos, algum dia pudessem correr lágrimas. 

Havia nas pessoas, em particular nos jovens, um sentimento raro nos dias de hoje: a dor causada por uma razão elevada. Não era o sentimento pela perda do emprego ou pela derrota de seu time. Notre Dame sofrera essa tragédia no primeiro dia da Semana Santa, cujas cerimônias recordam o Sacrifício de Nosso Senhor Jesus Cristo na Cruz. Numa dessas cerimônias recitam-se as Lamentações de Jeremias, sobre a desolação de Jerusalém castigada por Deus. Substituindo mentalmente a cidade de Jerusalém pela catedral de Notre Dame, podemos sentir ali “como está abandonada a cidade antes tão povoada! Aquela que foi grande entre todas as nações assemelha-se a uma viúva. [...] Estão de luto os caminhos de Sião, e ninguém mais vem às suas festas”. 

Aqueles jovens que rezam e o público lacrimoso encontrariam em Jeremias os termos consonantes com esta hora de dor. 



Notre Dame de Paris em chamas 

Comunicado da Sociedade Francesa de Defesa da Tradição, Família e Propriedade 


Foi com horror e uma tristeza indizível que o mundo inteiro viu a Catedral de Notre Dame de Paris, joia da Cristandade, devorada pelas chamas, num momento em que uma vaga de profanações vandaliza os santuários franceses. No dia exato em que começava a Semana Santa, Notre Dame de Paris transformou-se em Nossa Senhora das Dores. 

A coragem dos bombeiros permitiu salvar as torres e paredes, mas a flecha que apontava para o céu desabou dramaticamente. Como não ver nessa tragédia o símbolo do mal que corrói a França, outrora a pérola do mundo cristão? Um incêndio de impiedade devora o país, alimentado pela obsessão igualitária destruidora de tudo o que, por sua verticalidade, lembra o rumo do Céu. 

Esse fogo propriamente infernal ergue-se por vezes, infelizmente, no próprio interior da Igreja, criando a ilusão de que ela vai desabar. Fluctuat nec mergitur (fustigada pelas ondas, ela não soçobra). Esta divisa da cidade de Paris aplica-se também com acerto à Roma eterna.

Por isso mesmo as ruínas de Notre-Dame não devem levar os católicos ao desespero. Ao contrário, assim como elas atraíram os fiéis, durante o incêndio, a se reunirem em massa para rezar nas margens do Sena, devem ser ocasião para nos voltarmos para Nossa Senhora e pedir forças para extinguir o mal que consome a França. 
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O original deste comunicado da TFP francesa encontra-se disponível no site da entidade: http://tfp-france.org/notre-dame-de-paris-en-flammes/