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Princesa Isabel aos 19 anos |
A Princesa Isabel, a Redentora da raça negra, perdeu o trono, mas não a majestade, nem a nobreza de alma. Essa grande dama brasileira inspira saudades de uma época que não conhecemos e o desejo de um futuro Brasil verdadeiramente brasileiro.
✅Oscar Vidal
Neste mês ocorre o centenário do falecimento daquela que
muito justamente chamamos de “A Redentora”, a Princesa Isabel. Numa época muito
tranquila e próspera do Brasil, ela nasceu em 29 de julho de 1846, no Palácio
Imperial de São Cristóvão (depois transformado em Museu Nacional, no Rio de
Janeiro, parcialmente destruído por um incêndio em 2018).
Batizada
na Imperial Capela de Nossa Senhora da Glória do Outeiro no dia 15 de novembro
de 1846, ela recebeu o nome oficial de Isabel Cristina Leopoldina Augusta
Micaela Gabriela Rafaela Gonzaga de Bourbon-Duas Sicílias e Bragança. Foi a
segunda filha (a primeira menina) do nosso Imperador Dom Pedro II e de sua
esposa a Imperatriz Teresa Cristina de Bourbon-Duas Sicílias.
Como
herdeira presuntiva do Império do Brasil, Isabel recebeu o título de Princesa
Imperial. Com a morte de seus dois irmãos, ela se tornou a primeira herdeira do
Imperador. Casou-se em 1864 com o príncipe francês Louis Philippe Marie
Ferdinand Gaston d’Orléans, o Conde d’Eu (1842-1922), com quem teve quatro
filhos. Ele era neto de Luís Filipe, rei dos franceses. Ela é bisavó do atual
chefe da Casa Imperial do Brasil, o Príncipe Dom Luiz de Orleans e Bragança.
A Princesa Isabel desejava ardentemente a abolição da escravatura, mas sabia que, se o conseguisse de modo imediato, seria mal vista por certos setores da sociedade escravocrata de então, que a culpariam pelo colapso da produção agrícola, sobretudo do café e do açúcar, e poderia dar pretexto aos positivistas e republicanos para exigirem o fim do Império. Assim, ela precisava agir com prudência, fazendo a abolição de modo paulatino e suave, sem violências, como as que já haviam ocorrido em alguns países.
Na Primeira Regência, em razão da viagem do Imperador à
Europa, em 28 de setembro de 1871 — há exatos 150 anos — a Princesa Isabel
assinou a Lei do Ventre Livre, que
alforriava todas as crianças nascidas de mulheres escravas após aquela data.
Essa lei foi patrocinada pelo gabinete liderado
por José Maria da Silva Paranhos, Visconde do Rio Branco (1819-1880), sendo Ministro
do Interior João Alfredo Corrêa de Oliveira [foto abaixo] — o mesmo que, 17 anos depois,
chefiaria o gabinete que promoveu a Lei
Áurea.
Ao comemorar a aprovação dessa lei, das repletas galerias do Parlamento lançaram os jubilosos assistentes uma chuva de rosas. Presente ao ato, o embaixador norte-americano, James R. Partridge, emocionado, apanhou algumas pétalas, dizendo: “Quero guardar estas flores, como lembrança dessa maravilha. No Brasil a extinção da escravidão foi comemorada com flores, enquanto no meu país custou uma guerra civil com quase um milhão de mortos”.
Em 28 de setembro de 1885, no governo
de João Mauricio Wanderley, Barão de Cotegipe (1815-1889), foi promulgada a Lei dos Sexagenários, que concedia liberdade
a todos os escravos com idade igual ou superior a 60 anos.
Anos depois — tendo caído o gabinete Cotegipe e sendo a
Princesa novamente Regente do Império —, ela deu um passo importante para
livrar os escravos do cativeiro: nomeou, como novo Presidente do Conselho de Ministros, o
abolicionista João Alfredo Corrêa de Oliveira — tio-avô paterno do inspirador e
principal colaborador desta revista, Prof. Plinio Corrêa de Oliveira.
No dia 8 de maio de 1888 o gabinete Corrêa de Oliveira apresentou
à Câmara dos Deputados a proposta de legislação que visava extinguir de modo
definitivo a escravidão. Dois dias depois ela era aprovada, e em 13 de maio chancelada também pelo Senado.
Nesse mesmo dia a Princesa Isabel sancionou a legislação,
conhecida como Lei Áurea, que aboliu
a escravidão em todo o território nacional. Seu belo e nobre
gesto foi todo ele inspirado nos ensinamentos da Santa Igreja Católica.
Tal
era sua fidelidade à Religião que, não sem razão, o sacerdote jesuíta Francisco
Leme Lopes (1912-1983) fez alusão a ela como “Isabel, a Católica”, comparando-a com este epíteto à Rainha Isabel
de Castela e Leão (1451-1504), que passou para a História com o muito
emblemático título de “Isabel, la
Católica”.
O Imperador ficou radiante de alegria com a abolição
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A “Rosa de Ouro” |
Naquele
mesmo histórico dia, encontrando-se com o Barão de Cotegipe, que havia feito
oposição à Lei Áurea, a Princesa
Isabel lhe perguntou:
— “Barão, a abolição se fez com festas e flores. Venci ou não venci?”
— “Sim, Vossa Alteza ganhou a partida,
mas perdeu o trono”.
Ele
prognosticava o tão injusto banimento da Família Imperial.
Com efeito, a Princesa Isabel teve de abandonar seu tão
amado País, pelo qual se dedicara com tanto afinco, pela Baía de Guanabara,
a bordo do vapor “Alagoas”, que a levaria com toda a Família Imperial para o
exílio.
O
Imperador Dom Pedro II, quando soube em Milão — onde se encontrava
recuperando-se de uma enfermidade — que a escravidão no Brasil havia sido
definitivamente abolida, ficou radiante de alegria e mandou telegrafar à filha
felicitando-a. Assim, no dia 22 de maio 1888, ditou o seguinte telegrama: “Princesa Imperial. Grande satisfação para
meu coração e graças a Deus pela abolição da escravidão. Felicitação para vós e
todos os brasileiros. Pedro e Tereza”.
Condecoração Pontifícia “Rosa de Ouro”
A “Rosa de Ouro” é a condecoração concedida, desde o século XI, pelos Soberanos Pontífices a personalidades ou instituições que tenham demonstrado inequívoca lealdade à Santa Sé. Na verdade, é um bouquet de rosas de ouro maciço. Em 28 de setembro de 1888, o Papa Leão XIII ofereceu à Redentora dos escravos brasileiros a “Rosa de Ouro”, em recompensa pela sua corajosa atitude. A Princesa Isabel foi a única brasileira homenageada com tão alta condecoração. No centenário de nascimento
da Redentora, em 19 de julho de 1946, o Príncipe Dom Pedro Henrique de Orleans
e Bragança (1909-1981), neto primogênito da Princesa Isabel, doou a “Rosa de Ouro” à Catedral do
Rio de Janeiro. Ele a tinha trazido da Europa, quando retornou ao Brasil com o
fim do exílio.
Fim do Império brasileiro, banimento e exílio
Sua Alteza Imperial sabia que seu gesto emancipando os escravos poderia exacerbar os ateus e republicanos que a caluniavam, levando à perda do trono. E foi de fato o que aconteceu com o golpe republicano de 15 de novembro de 1889.
Golpe
muito bem descrito pelo jurista, político e jornalista republicano Aristides da
Silveira Lobo (1838-1896): “O povo
assistiu àquilo bestializado, atônito, surpreso, sem conhecer o que significava.
Muitos acreditaram seriamente estar vendo uma parada” (Diário Popular, 18-11-1889). No dia seguinte ao golpe de estado,
como registrou o historiador Roderick J. Barman, a Princesa Isabel afirmou alto
e bom som que “se a abolição é a causa
disto, eu não me arrependo; eu considero valer a pena perder o trono por ela”.
Quando a Princesa da “Rosa de Ouro” tomou
conhecimento do decreto do banimento da família imperial, reafirmou: “Mil
tronos eu tivesse, mil tronos eu sacrificaria para libertar os escravos do
Brasil”. Afirmação que ecoava o
pensamento de seu pai, o Imperador Dom Pedro II, quando disse: “Prefiro
perder a coroa a tolerar a continuação do tráfico de escravos”.
Em sua partida para o exílio, dois dias depois do golpe, a
Princesa declarou: “É com o coração
despedaçado pela tristeza que me despeço dos meus amigos, de todos os
Brasileiros, e do País que eu amei e amo muito, e da
felicidade que eu tenho lutado para contribuir e pela qual eu vou continuar a
manter as mais ardentes esperanças”.
Devoção da Princesa à Rainha do Brasil
Entre diversas manifestações de devoção da Princesa Isabel a Nossa Senhora Aparecida, devemos lembrar sua visita ao Santuário de Aparecida, em 1868. E 20 anos mais tarde, logo após a aprovação da Lei Áurea, ela ofereceu à imagem milagrosa da Rainha e Padroeira do Brasil uma riquíssima coroa de ouro cravejada de brilhantes.
Naquela ocasião, a Princesa Imperial escreveu a seguinte
oração, dirigida a Nossa Senhora Aparecida: “Eu,
diante de Vós, sou uma princesa da terra, e eu me curvo, pois Vós sois a Rainha
do Céu. E eu Vos dou tão pobre presente, que seria uma coroa igual à minha, e
se eu não me sentar no trono do Brasil, rogo que a Senhora se sente por mim e
governe perpetuamente o Brasil”.
Idealizadora do Cristo Redentor no Corcovado
Na
edição anterior desta revista foi publicada uma matéria em memória dos 90 anos
do Cristo Redentor no Rio de Janeiro. Mas não podemos deixar de registrar,
ainda que de passagem, que depois da abolição da escravatura quiseram
homenagear a Redentora erigindo no topo do Corcovado uma grande estátua dela.
O
Império foi derrubado, a República se instalou, a homenagem foi engavetada.
Anos depois, o plano voltou à tona. Quando a Princesa Isabel soube desse
projeto, foi enfática em não o aceitar, e sugeriu que naquele mesmo lugar paradisíaco
fosse erguido um enorme monumento com uma grande imagem de Nosso Senhor Jesus
Cristo, pois, Ele sim, foi o verdadeiro Redentor dos homens. O que foi acolhido.
Mas
foi somente em 1931, 10 anos após o falecimento da Princesa, que se concluiu a
monumental estátua do Cristo Redentor, hoje considerada oficialmente uma das
Maravilhas do Mundo Moderno... Ela não a viu nesta Terra, mas a contempla do
Céu.
Pedidos para que a veneranda Princesa seja beatificada
No dia 14 de novembro de 1921, há exatos 100 anos, a bondosa Princesa falecia na França, aos 75 anos de idade. Em seu testamento podemos admirar sua profissão de fé: “Quero morrer na Religião Católica Apostólica Romana, no amor de Deus e no dos meus e de minha Pátria”. Atualmente seus restos mortais se encontram numa artística sepultura [foto] na catedral de São Pedro de Alcântara, em Petrópolis (RJ).
Crescendo
de norte a sul do País os pedidos para que a veneranda Princesa Imperial seja
beatificada, e um dia — comprovando-se que ela praticou virtudes em grau heroico
— elevada à honra dos altares, em 2011 foi dado início aos tramites necessários
para abertura do processo de beatificação.
Os
brasileiros amaram a Princesa Isabel de todo o coração e esperavam que ela
viesse a ser sua Imperatriz, pois conhecia e amava o Brasil e estava disposta a
tudo fazer pelo bem de nossa gente. Mas tal desígnio foi ceifado pelas forças anticatólicas
e antimonárquicas com o golpe republicano.
A
República foi proclamada e o trono foi derrubado, mas não a legenda áurea do
imenso bem que a Monarquia fez ao Brasil. A legenda permanece viva e os
brasileiros têm saudades de uma época que não conheceram.
____________
Fonte: Revista Catolicismo, Novembro/2021, Nº 851.
Obras
consultadas:
§ Pedro
Calmon, História do Brasil, Livraria
José Olympio Editora, Rio de Janeiro, 1959.
§
Pedro Calmon, História da Civilização Brasileira,
Companhia Editorial Nacional, São Paulo, 6ª edição, 1958.
§ Leopoldo
Bibiano Xavier, Revivendo o
Brasil-Império (Coletânea), Artpress – Indústria Gráfica e Editora Ltda.,
São Paulo, 1991.
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