15 de fevereiro de 2022

A condenada trilogia da Revolução Francesa

 

Tomada da Bastilha, em 14 de julho de 1789

“Liberdade, Igualdade e Fraternidade” — O Papa Bento XV e outros Pontífices condenaram essa trilogia da Revolução Francesa 

Plinio Maria Solimeo

A trilogia “Liberdade, Igualdade, Fraternidade” foi enunciada pela primeira vez como um todo durante a satânica Revolução Francesa. Com muita carga revolucionária na época, e hoje em dia ainda considerada como um “dogma”, entretanto parece ter perdido um pouco de sua garra. Mas nem foi sempre assim. 

Vários Papas condenaram não só a Revolução Francesa, mas especialmente essa trilogia, que compendia de certa forma os princípios revolucionários de 1789. 

Em seu livro Nobreza e elites análogas tradicionais nas alocuções de Pio XII ao Patriciado e à Nobreza Romana, o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira mostra o que se deve pensar dessa trilogia à luz da doutrina católica e seu sentido revolucionário, e comenta uma coleção de categóricos pronunciamentos pontifícios sobre o assunto, infelizmente ignorados nos dias de hoje. 

Entre esses textos dos Papas apresentados pelo insigne líder contra-revolucionário, sobressai um documento claro e contundente do Papa Bento XV (1914-1922), que sucedeu a São Pio X. 

Trata-se da alocução por ocasião da promulgação do decreto sobre a heroicidade das virtudes do então Servo de Deus (depois canonizado) Marcelino Champagnat, em 11 de julho de 1920. Abaixo resumimos e comentamos alguns trechos dela (os subtítulos são nossos). 

Maléfica influência das “perversas doutrinas” da Revolução Francesa 

Ao falar sobre São Marcelino Champagnat, o Papa Bento XV aproveitou a oportunidade para atacar de rijo e de frente os funestos frutos da Revolução Francesa. E não economizou para isso os mais enérgicos adjetivos. Começa comentando que, no final do século XVIII e inícios do século XIX na França, “muitos falsos profetas”, dos quais falara acima, “se propunham difundir por toda a parte a maléfica influência das suas perversas doutrinas”. Esses “falsos profetas”, fautores da maldita Revolução, eram homens com certa projeção em setores da atividade pública, a quem seguiam um populacho interesseiro, os panfleteiros e os demagogos desonestos, que iam pelas ruas disseminando sua perversa doutrina. Acrescenta o Papa: “Eram profetas que tomavam ares de vingadores dos direitos do povo, preconizando uma era de Liberdade, de Fraternidade, de Igualdade”.

“Liberdade” que abre as portas para o mal, e falsa “fraternidade” 

O Papa Bento XV (1854 – 1922)
Qual a “liberdade” que esses “falsos profetas [...] disfarçados de cordeiros” pregavam e que desejavam para todos os povos? O Papa diz que se tratava de uma “liberdade” que “não abria as portas para o bem, e sim para o mal”. Não era a verdadeira liberdade dos filhos de Deus. 

Bento XV faz o mesmo juízo a respeito da “fraternidade”: “A Fraternidade por eles pregada não saudava a Deus como Pai único de todos os irmãos”. Pelo contrário, era uma “fraternidade” despida de qualquer sentimento ou princípios morais, egoísta, seletiva, cúmplice e praticada quando havia interesse. 

“Igualdade” destrutiva da diferença de classes querida por Deus 

Entretanto, o ponto mais candente e delicado tratado por esse Papa é o da “igualdade”, que se tornou um “dogma” da moderna religião mundial. A igualdade “por eles anunciada não se baseava na identidade de origem, nem na comum Redenção, nem no mesmo destino de todos os homens”. Ao contrário, era uma “igualdade” inteiramente atéia e desprovida de qualquer fundamento religioso, sendo oposta, segundo o Papa, aos “direitos e às razões de justiça e da verdade”; e, sobretudo, “destrutiva da diferença de classes querida por Deus na sociedade”. 

Legitimidade da diferença de classes e da sujeição de uns a outros 

Aqui está, pronunciada por um legítimo Papa no exercício de seu magistério e confirmando a doutrina tradicional da Igreja, a afirmação de que — contrariamente ao que afirmam certa filosofia e teologia modernas — as diferentes classes sociais são queridas por Deus, e devem existir para o bom funcionamento da sociedade. 

Por isso, Bento XV vai mais longe. Esses falsos profetas “chamavam irmãos aos homens para lhes tirar a ideia de sujeição de uns em relação aos outros”. Pelo que fica claro que, por disposição divina, na sociedade é preciso haver os que mandam e outros que obedecem; uns que sejam patrões, e outros empregados; como também, harmonia entre ricos e pobres (“Pobres sempre os tereis entre vós”, disse Nosso Senhor), porque todos foram remidos pelo sangue preciosíssimo de Nosso Senhor Jesus Cristo. 

Sacrificar ao erro os direitos e as razões de justiça e da verdade 

Deturpando de tal maneira os ensinamentos da Igreja, esses falsos profetas são denunciados por Bento XV “proclamavam a liberdade de fazer o mal, de chamar luz às trevas, de confundir o falso com o verdadeiro, de preferir aquele a este, de sacrificar ao erro e ao vício os direitos e as razões da justiça e da verdade”. Ele não podia ser mais enérgico e mais claro. Por isso, com relação a eles, diz o Pontífice que é preciso estar em guarda: “guardai-vos deles! `attendite a falsis prophetis”. 

São Marcelino Champagnat combateu os funestos princípios de 1789 

Marcellin Joseph Benoît Champagnat
(1789  1840)
Bento XV faz então uma aplicação prática do que disse, exemplificando com São Marcelino Champagnat: “Não deixa de ter interesse a comprovação do fato de que Marcelino Champagnat, nascido em 1789, foi destinado a combater, na sua aplicação prática, precisamente os princípios que tomaram o nome do ano do seu nascimento [em que simbolicamente irrompeu a Revolução Francesa], e depois obtiveram triste e dolorosa celebridade”. 

Pois “Marcelino Champagnat ouviu essa palavra [“guardai-vos dos falsos profetas”], entendeu também que não tinha sido dita só para ele, e pensou em tornar-se o eco dela junto aos filhos do povo, que via serem os mais expostos a cair vítimas dos princípios de 1789, devido à própria inexperiência e à ignorância dos seus pais em matéria de religião...”. Nessa sua ação verdadeiramente contra-revolucionária, o Santo tinha presente as palavras “‘Attendite a falsis prophetis': eis as palavras que repetia aquele que almejava deter a torrente de erros e vícios que, por obra e graça da Revolução Francesa, ameaçava inundar a Terra.” 

E realmente esses vícios e erros da nefanda Revolução inundaram toda a Terra, sendo uma de suas mais funestas consequências as revoluções que se seguiram ao longo da História, principalmente a comunista de 1917. 

“Pelos frutos os conhecereis” 

Bento XV insiste ainda sobre a disseminação desses erros, para condenar taxativamente mais uma vez a satânica Revolução: "Para justificar a sua obra [de preservar a juventude desses erros funestos], ter-lhe-ia bastado continuar a leitura do Evangelho de hoje, porque um simples olhar sobre as chagas que os princípios de 89 abriram no seio da sociedade civil e religiosa, patenteariam como aqueles princípios continham a suma do ensino dos falsos profetas: `a fructibus eorum cognoscetis eos'”. 

Depois de se referir aos resultados extraordinários obtidos pelos Irmãos Maristas, bem como a uma milagrosa intervenção de Nossa Senhora, o Pontífice continua: 

“Se o Venerável Champagnat tivesse adivinhado, com profética luz, tão admirável efeito, lamentar-se-ia certamente do excessivo número de meninos que ainda permaneciam sumidos nas sombras da morte e nas trevas da ignorância, e teria deplorado, mais ainda, não ter podido impedir melhor o nefasto desenvolvimento da perniciosa semente espalhada pela Revolução Francesa. No entanto, um sentimento de profunda gratidão a Deus, pelo bem realizado pela sua Congregação, tê-lo-ia obrigado a dizer que, assim como dos péssimos frutos do ensino de alguns profetas contemporâneos seus, se deduzia a sua falsidade, assim o amadurecimento dos bons frutos da sua obra mostravam a bondade dela: `Igitur ex frutibus eorum cognoscetis eos'”. 

Aqui o Papa Bento XV vai mais além ao afirmar claramente que, mesmo no tempo de São Marcelino Champagnat, havia “profetas contemporâneos seus” [do Santo], de cujos “péssimos frutos do ensino [...] se deduzia sua falsidade”. Esses filhos desnaturados da Santa Igreja que semeiam a cizânia no meio católico sempre existiram, e existem com abundância nos tristes dias em que vivemos. 

Quem foi São Marcelino Champagnat 

Marcelino José Bento Champagnat nasceu no dia 20 de maio de 1789 em Marlhes, aldeia de montanha no Centro-Leste da França, perto de Lyon, o nono filho de uma família de agricultores. Pouco depois de seu nascimento começaram a chegar à pequena vila agrícola as novas ideias propaladas pela Revolução incipiente. Seu pai, que era também comerciante, tinha uma instrução acima da média e desempenhava um papel político na aldeia e na região, embora infelizmente fosse aberto às idéias novas. Tendo sido promovido a coronel da Guarda Nacional, foi encarregado de aplicar ali o calendário revolucionário, que instituía a semana de dez dias, eliminando assim o domingo. A Missa na igreja da vila, transformada no templo da deusa Razão, foi suprimida. Entretanto, ele permitia à sua família assistir às missas de padres “refratários” (isto é, dos que não haviam prestado juramento de fidelidade às leis revolucionárias), escondidos nos arredores. Isso marcará Marcelino para o resto de seus dias. 

Ordenado sacerdote, “consciente das imensas carências da juventude e educador nato, Marcelino faz desses jovens camponeses sem cultura apóstolos generosos. Sem tardar abre escolas. As vocações vêm, e a primeira casa, apesar de aumentada pelo próprio Marcelino, torna-se logo pequena demais”. 

Foram muitas as dificuldades que enfrentou: “O clero em geral não compreende o projeto desse jovem padre inexperiente e sem recursos. Mas as populações rurais não cessam de pedir Irmãos para garantir a instrução cristã das crianças.” Ele não desanima. 

“Sua grande humildade, seu senso profundo da presença de Deus, fazem-lhe superar, com muita paz interior, as numerosas provações. Reza amiúde o Salmo 126: ‘Se o Senhor não constrói a casa’, convencido de que a Congregação dos Irmãos é obra de Deus, obra de Maria. ‘Tudo a Jesus por Maria, tudo a Maria para Jesus’ é sua divisa.”. 

Ele fundou a Congregação dos Pequenos Irmãos de Maria (Maristas) para a educação de meninos. Em pouco tempo essa obra se espraiou, e cinco mil Irmãos em diferentes partes do mundo educavam a juventude masculina combatendo os princípios da Revolução. 

Exausto de fadiga e sobrecarregado com inúmeras preocupações, teve seus dias encurtados. Com efeito, esse grande Santo falecerá em 1840 com apenas 51 anos de idade. Foi beatificado por Pio XII em 29 de maio de 1955 e canonizado por João Paulo II em abril de 1999.

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