25 de dezembro de 2025

NATAL NAS CORTES REAIS E IMPERIAIS

 

Basílica da Natividade em Belém, lugar onde Deus veio ao mundo

  Luis Dufaur

Na indizível candura da santa pobreza da gruta de Belém, o Divino Redentor entrou na História irradiando alegria sobrenatural. Um contentamento que os homens jamais conseguiriam conceber e que se expandiu ao longo dos milênios a todas as classes de todos os povos.

A figura central do santíssimo acontecimento de Belém foi uma família de sangue real. Os Evangelhos nos ensinam a genealogia de Maria e de José, príncipes da casa real de Judá; os Profetas anunciavam um Rei dos reis: “Tu que és o Rei dos reis, a quem o Deus dos céus deu realeza, poder, força e glória” (Daniel 2, 37). E “Único Soberano, Rei dos reis e Senhor dos senhores” (I Timóteo 6, 15). E os Reis Magos, vindos de países longínquos com outras culturas, ingressaram em Jerusalém perguntando onde estava o “rei dos judeus”. Por tudo isso e muito mais, a Igreja nos apresenta o Divino Menino nascido em Belém como Cristo Rei.

Nos séculos da civilização cristã, a luz jubilosa da Sagrada Família, e em especial do Divino Infante, se irradiava do núcleo e do vértice de todas as celebrações e festividades sociais e religiosas natalinas. Mas essa luz foi se extinguindo pela antipatia igualitária. Contudo, a Luz de Cristo Rei e da Santa Família continua irradiando sua unção. Todas as famílias percebem-na, mas não a retribuem. E vem à mente perguntar como as famílias coroadas comemoravam o evento de Natal da mais alta monarquia sobrenatural e histórica.

Durante a Idade Média, os reis e a nobreza faziam em seus palácios e castelos o centro das festas, que podiam durar vários dias, nas quais os membros da família real circulavam, acotovelando-se com seus súditos em gentil e íntima familiaridade. Nessa época a Igreja ainda estava alfabetizando a uns e a outros, e não restaram senão parcos registros descritivos, excetuadas algumas belas iluminuras de origem monacal.

 

Presépio no Castelo de Amboise, na França. 

NOS ESPLENDORES DA FRANÇA

Na Corte de Luís XIV, no ápice do Ancien Régime, o memorialista Philippe de Courcillon, marquês de Dangeau, descreve que no Advento o Rei-Sol queria a vida de corte inteiramente voltada ao recolhimento e à penitência, como pedido pela Igreja. Nesse período litúrgico de preparação para o Natal, o monarca proibia todos os jogos, espetáculos e comédias no palácio de Versailles! Em cada domingo do Avento, o rei assistia à pregação oficial.

Luís XIV tocando nos doentes de escrófula, por Jean-Baptiste Jouvenet (1644–1717)

Em seu Journal dos dias 24 e 25 de dezembro de 1697, Dangeau conta que Luís XIV dedicava a manhã às suas devoções. Depois do almoço assistia ao cântico de Vésperas na Capela Real. A seguir distribuía cargos e benefícios vacantes, nomeações próprias para aquele feliz dia. À noite, antes da Missa do Galo, a família real comia austeramente algum peixe, sopa ou frutos do mar. Por volta das 22 horas, o rei retornava à Capela para assistir às três missas, ditas baixas. Saindo da capela, acompanhado por toda a família real, ele ia tocar nos doentes, como fez no dia de sua coroação, pronunciando a célebre fórmula: “O rei te toca, Deus te cura”.

Por fim, no dia de Natal, o Rei-Sol assistia à Missa Solene seguida de uma refeição pomposa. Nela, encerrado o jejum, comiam-se grandes pratos, muito cordeiro e aves “nobres”: ganso, capão e peru, este último vindo da América do Sul, como o nome indica. Naqueles jantares natalinos fez aparição na mesa do Rei-Sol, entre outros, o marrom glacé.

Infelizmente, em reinados posteriores, os costumes católicos da França foram diminuindo. Ainda assim, o rei Luis XV, embora menos estrito, pedia respeito aos cortesões na vigília do Natal. Em Versailles, naquele dia, ainda continuavam interditados a comédia e o jogo.

Nas missas da véspera de Natal, um membro proeminente da Corte coletava as esmolas. Em 1741, foi a vez de Madame de Chevreuse, princesa descendente dos primeiros soberanos da Bretanha. E o duque de Luynes, par da França, consignou espantado em suas Mémoires, que ela “recolheu um total de 45 luises” (moeda de ouro de máximo valor).

Luís XIV rezando na capela real, em Versa lhes (1682). Biblioteca Nacional de França


Presentes sim... mas no Ano Novo!

Os presentes, denominados étrennes, eram distribuídos pelo rei, a rainha e os príncipes no Ano Novo, como sinal de reconhecimento aos domésticos do castelo. Presenteavam então alguma joia ou dinheiro.

Porém, nos tempos de Henrique IV, protestante de início e convertido depois por interesse, não havia presentes. O costume mudou com seu filho o futuro Luís XIII. No dia 1º de janeiro de 1606, quando era uma criança de cinco anos, quis ele próprio distribuir as étrennes.

Árvore de Natal de macarons de duas cores, no Castelo de Vaux-le-Vicomte, na França.


Esplendidamente vestido, ele corria para alcançar os favorecidos, puxava suas roupas, e após lhes dizer sorrindo “eis vossa étrenne”, saía às pressas para obter outra coisa para dar. No ano seguinte, em 26 de dezembro, ele dizia que queria escrever um “livrinho” para o rei Henrique IV à guisa de étrenne.

Os presentes ganharam importância sob o rei Luís XIV. Ele analisava cada um dos que seriam dados, ficando muito agradado pelas escolhas de Madame de Maintenon. Aos nobres, o Rei-Sol presenteava tabaqueiras em ouro que ele pagava de seu bolso, costume que continuou seu sucessor Luís XV. Quando a princesa polonesa Maria Leszczynska chegou à Corte para se casar com Luís XV, ficou encantada com o costume, oferecendo presentes mais requintados a muitas outras pessoas de qualidade. A Corte terrestre então participava das alegrias da Corte celeste.

Maria Leszczynska, Rainha da França – Jean-Baptiste van Loo (1684–1745). Palácio de Versalhes


Entrada do pinheiro de Natal na Corte

Henrique IV, o rei protestante convertido, só dava importância à bûche de Noël, a qual nada tinha do requintado bolo que se tornou depois, mas consistia no hábito de queimar um tronco de árvore na lareira.

Não se conhecia o pinheiro decorado de Natal. Ele veio dos países do Leste, trazido por princesas germânicas que chegavam a Versailles para casamentos com pessoas da alta nobreza. A princesa bávara Elisabeth-Charlotte do Palatinado, que se casou com o Duque de Orléans, irmão de Luís XIV, consumia-se de nostalgia pelas festas de Natal vividas na sua juventude em Hanover. Encantavam-na o charme dos arranjos com o Menino Jesus; as mesas, que pareciam altares, com toda espécie de presentes para as crianças; as roupas novas, a prataria, a seda, as bonecas, os doces pendurados nas árvores cheias de velas etc.

Princesa Elisabeth-Charlotte do Palatinado, Duquesa de Orléans – François de Troy (1645–1730). Museu de História da França, Palácio de Versalhes


Ela tentou introduzir a árvore com “suas modas alemãs”, mas foi contraditada pelo seu esposo, o Duque de Orléans. No entanto, tudo mudou com a futura rainha Maria Leszczynska, que desde a sua chegada mandou montar um pinheiro de Natal no castelo de Versailles. Houve resistências até que a princesa Helena de Mecklenbourg chegasse à França, em 1837, para desposar um novo Duque d’Orléans.

Ela falava dos natais maravilhosos passados em família, em Friedensbourg, quando se trocava presentes em torno do pinheiro. Ouvindo esses relatos, a rainha Maria Amélia de Bourbon preparou-lhe secretamente uma surpresa: um pinheiro natalino no Salão Branco, que nada deixava desejar aos da Alemanha. Desde então o costume real passou a encher de alegria os pequenos príncipes. O costume se difundiu por toda a França, e dali para o mundo, mas foi morrendo com a República.

 

Presépio do Mosteiro Real da Encarnação, em Madri

NATAL NO IMPÉRIO ESPANHOL

No Império espanhol dos Habsburgos, a gravidade, a solenidade, a penitência e a alegria reprimida impregnavam o Advento e o Natal por disposição de El Rey. Festas, bailes e qualquer divertimento público estavam interditados, e as autoridades fechavam casas suspeitas ou locais de jogo. Seguindo o exemplo dos monarcas, os populares consagravam o Advento à purificação de suas almas com os sacramentos, Missas e atos de piedade, e as leis colaboravam para isso em todo o império, que se estendia por todos os continentes.

“O Presépio do Príncipe”, Palácio Real de Madri (século XVIII)


Após as cinco semanas de jejum e abstinência do Advento, a Ceia de Nochebuena, que se seguia à Missa do Galo, era uma das mais requintadas e abundantes do ano. Não só casas, mas ruas e praças fervilhavam com proclamação de poesias, novelas e canções natalinas. Poetas, cantores, bandas, bailarinos e músicos de toda espécie inundavam os locais públicos de cidades e povoados.

Nas ceias copiosas de então, cheias de torrones, fez aparição o bolo roscón de reyes, cuja peculiaridade, trazida pelos soldados dos famosos Tercios que guerreavam em Flandres, consistia em esconder no meio da massa uma micro-coroa, sendo proclamado rey de la fiesta quem a encontrasse.

Um acontecimento bélico deu-se em Granada em 1568. Aproveitando-se da ocasião em que os católicos estavam todos nas igrejas para a Missa do Galo, deixando casas e ruas vazias, o rebelde mourisco Abén Humeya tentou tomar a cidade, dando início à rebelião das Alpujarras. Esta seria apoiada por uma imensa frota otomana, a qual, entretanto, foi destruída no caminho por Don Juan de Áustria em Lepanto.



Em 1734, o Real Alcázar de Madrid sofreu um devastador incêndio, também na Missa do Galo. As igrejas avisaram, fazendo repicar os sinos, mas os madrilenos, julgando tratar-se de uma convocatória para Missa, desinteressaram-se do castelo, que ardeu até os fundamentos.

As ceias na Corte eram verdadeiramente régias. O cozinheiro de Felipe IV registrou, num manual de 1622, que sem contar as sobremesas, na ceia natalina foram servidos 36 pratos diferentes. Os doces mais populares não se diferenciavam muito dos atuais.

Nobres de antiga estirpe, comerciantes e burgueses ricos abriam as portas de seus fastuosos lares, em veladas que “se estendiam ao longo de todas as Páscoas” e podiam durar até 12 dias!

Poetas e escritores como Góngora, Quevedo e Lope de Vega, entre outros, compunham poesias, villancicos e incontáveis versos em honra do humilde nascimento do Messias, cujo presépio reinava nos lares.

O rei Carlos III teria introduzido na Espanha o presépio de São Francisco de Assis, chamado de “Belén”. Em séculos anteriores, montavam-se altarcicos de Pascuas na cidade e na Corte. Os mais monumentais triunfavam em igrejas, mosteiros, conventos e palácios, como também no âmbito doméstico, onde recebiam visitas multitudinárias.

Uma afetuosa chuva de cartas cheias de congratulações e de cestas repletas de alimentos ajudavam “a tirar la casa por la ventana”. Quevedo escrevera: “No Natal, entre torrones e presentes, ia-se todo o dinheiro”.

 

Natal no Palácio de Buckingham – Gravura de 1856 (Illustrated London News).

NATAL DERRETIA A ARIDEZ ANGLICANA

A princesinha Alexandrina Victoria, futura rainha Vitória, herdeira do império britânico, passou a sua juventude no Palácio de Kensington imersa na grande tristeza e solidão decorrentes do protestantismo. Seu único consolo consistia em aguardar o período natalino, pois seus pais, de origem germânica, lhe tinham falado do Natal na Alemanha.

A Rainha Victoria e o Príncipe Alberto com os seus cinco primeiros filhos, em torno da árvore de Natal (Gravura de 1848).


Charlotte de Mecklembourg-Strelitz, sua avó paterna, introduziu a árvore de Natal na corte e assumiu a distribuição de presentes após seu casamento com o rei Jorge III. A rainha Vitória de Saxe-Cobourg, pouco comunicativa mãe da isolada princesinha, também não deixava de montar pinheiros de Natal e oferecer cadeaux.

Com 13 anos, a princesinha não se continha, e no amanhecer de 24 de dezembro distribuía seus próprios presentes às suas domésticas. À noite, com lágrimas nos olhos, ela descrevia em seu Diário as árvores decoradas com velas, os ornamentos feitos com açúcar e todos os presentes em volta.

Árvores de Natal da Duquesa de Kent e dos filhos reais em Windsor, em 1850, por James Roberts (Royal Collection Trust)


Em 1836, Alexandrina viveu um Natal inesquecível no castelo de Claremont, pertencente ao seu tio Leopoldo, primeiro rei dos belgas. Este lhe ofereceu cartas autografadas de Luís XVI e Maria Antonieta. Naquele ano, a princesa foi a um acampamento de ciganos para distribuir objetos que suavizassem a miséria em que viviam.

No ano seguinte ela subiu ao trono com o nome de rainha Vitória I, e em fevereiro de 1840 casou-se com o príncipe alemão Alberto de Saxe-Cobourg-Gotha. Desde então, as comemorações do Natal nos castelos de Buckingham e Windsor ganharam outra dimensão.

Cozinha do Castelo de Windsor – Gravura de William James Bennett (1787-1844)


As tradições germânicas do Natal atingiram um desenvolvimento nunca antes visto. O príncipe Alberto descrevia a seu irmão, o príncipe Ernesto, como todo mundo estava “felizmente maravilhado” em volta de três magníficas árvores natalinas, e a seu pai a lembrança de seu entusiasmo de criança. A rainha ainda introduziu uma fanfarra de trompetes como na Alemanha.

As festas de Natal do castelo real de Windsor foram de uma importância capital para o bem-estar do reino. O rei Alberto as transformou em acontecimentos semipúblicos, cujos mínimos detalhes eram levados pelos jornais aos mais remotos confins do império colonial britânico.

A decoração de Windsor ficou aberta ao público; os jornais disputavam em descrever o menu real, e o Natal no estilo alemão foi logo copiado nos lares da classe média. Os viajantes descreviam o ambiente feérico no castelo e o Illustrated London News fazia questão de ilustrar em gravuras a árvore de Natal preparada para os principezinhos que acabavam de nascer.

Havia imensos pinheiros nos diferentes salões e outros menores nas salas dos domésticos. A rainha Vitória montava a árvore para seu marido e o rei Alberto arranjava o de sua esposa. A cada ano os enfeites se superavam. Em 1860, foram removidos os lustres para as árvores cintilantes de mil luzes subirem até os tetos.

A troca de presentes se fazia na noite da véspera de Natal. A rainha se esmerava em excogitar presentes-surpresa. Os filhos reais encontravam sobre uma mesa uma montanha de presentes, os quais se pareciam mais a uma caverna de Ali-babá, e pulavam e gritavam de alegria. O visconde de Torrington deixou um comovedor relato da mudança do ambiente tristonho, que antes dominava o ano todo, para o ambiente alegre da rainha e dos príncipes, conversando, abandonando as rigidezes, enquanto as princesinhas olhavam para os lordes e os domésticos com encantador charme, segurando os tesouros que tinham acabado de ganhar.

Havia também presentes para os domésticos e suas famílias. A própria rainha os distribuía no maior salão do castelo. Em 1847, a jovem dama de honra Eleanor Stanley ganhou um medalhão com forma de coração totalmente decorado com diamantes. Distribuíam-se pães saborosamente condimentados com especiarias, enquanto as crianças nobres distribuíam cartões de Natal que elas próprias haviam pintado.

Até nas cozinhas do palácio!

As cozinhas de Windsor conheciam um diuturno e incessante vaivém. Elaboravam-se bolos especiais, padarias e rotisserias viviam em ebulição. No Natal de 1860, o lorde Torrington descobriu nelas um espetáculo digno do auge da Idade Média: 150 perus sendo assados, bem como um javali e uma enorme parte de um boi, enquanto ferviam panelas com carne de cordeiro para os operários dos domínios reais.

De lá partiam bolos exclusivos, que exigiam horas de preparação, para os amigos da família real. O pessoal da cozinha fazia para si puddings com ameixas e castanhas assadas, e em 1860 fizeram um pastel com mais de 100 aves. O visconde Torrington descreve os requintes em longos parágrafos, mas desse pastel escreveu que foi “verdadeiramente maravilhoso. Não sei como eu pude sobreviver para contá-lo”.

A morte prematura do rei em 1861 deprimiu profundamente a rainha. Só em 1872 ela erigiu dois pinheiros de Natal em Osborne e distribuiu presentes para 300 servidores. Em 1899, durante a guerra do Sul da África, a rainha organizou um chá de Natal no grande salão de Windsor para as esposas e filhos dos militares engajados no front. As árvores natalinas voltaram a ser enormes, carregadas de presentes, enquanto as mesas pareciam desabar com pratos de carne à la broche e patês para 700 pessoas.

Membros da família real e auxiliares ajudavam a rainha de 80 anos, em cadeira de rodas distribuindo presentes. A cena foi comovedora: a família real reunida para aliviar com candura as angústias de seus súditos com maridos e pais envoltos pela guerra! A tradição da árvore de Natal de vários metros em Windsor se perpetuou até hoje!

 

Natal no Palácio Anitchkov, antigo palácio imperial em São Petersburgo

NATAL NOS PALÁCIOS DA RÚSSIA

A celebração do Natal entrou na corte russa — aliás, intoxicada pelos sinistros bafejos do cisma — durante o reinado de Nicolau I (1825-1855), graças à sua esposa Alexandra Feodorovna, nascida princesa Carlota, filha do rei da Prússia. Tal é a força de sedução sobrenatural do Natal que essas cortes rompidas com a Igreja Católica e intoxicadas pelos negrumes da “Igreja Ortodoxa” não podiam deixar de comemorar o magno evento.

Na véspera de Natal, muitos pinheiros eram exibidos imediatamente após a Missa, na Sala de Concertos ou na rotunda do Palácio de Inverno. Cada membro da família imperial montava sua árvore e a rodeava com inúmeros presentes que ficavam ocultos com uma toalha branca até a gaudiosa descoberta.

Czarina Alexandra Feodorovna, 1826– George Dawe (1781–1829)


A morte de Nicolau I não diminuiu, mas multiplicou o gáudio e a pompa. Sob Alexandre II, que reinou de 1855 a 1881, a cerimônia acontecia no Salão Dourado do Palácio de Inverno; e sob Alexandre III, que reinou de 1881 a 1894, as árvores eram arrumadas no Salão Carmesim ou no Salão Amarelo do Palácio de Gatchina.

“Sua Majestade nos reunia nos aposentos com as portas fechadas”, descreveu a Baronesa Maria Fredericks, dama de companhia. Do lado de fora, “todas as crianças, incluindo as dos czares, brigavam e se empurravam para ver quem chegaria primeiro, explodindo de alegria e impaciência. A Imperatriz reexaminava todas as mesas, e de repente as portas se abriam e nós entrávamos correndo, fazendo muito barulho, em uma sala repleta de inúmeras velas. A Imperatriz conduzia cada um de nós à sua mesa e nos entregava os presentes”.

Desenho da Grã-Duquesa Olga Alexandrovna, da coleção de O. N. Kulikovskaya-Romanova.


Sob o último czar, Nicolau II, o Natal era celebrado no Palácio de Alexandre. A Grã-Princesa Olga Alexandrovna conta:

“Todos nós esperávamos o momento em que as sobremesas, que ninguém mais queria, seriam retiradas e os pais deixariam a mesa para ir ao salão de banquetes. As crianças tinham de esperar que o imperador tocasse a campainha. Depois disso, esquecendo toda a etiqueta, todos corríamos para o salão de banquetes, onde as portas se abriam para um reino mágico.”

Grã-Duquesa Olga Alexandrovna

 

O salão realmente parecia uma floresta feérica: abrigava seis árvores de Natal para os familiares e muitas outras para parentes e funcionários da corte. Todas estavam decoradas com velas acesas e frutas e brinquedos folheados a ouro e prata.

Nas árvores do palácio os presentes eram simples: cada criança recebia dois cones de doces, duas tangerinas e duas maçãs; os grão-duques, uma caixa de ameixas secas, e o Imperador uma caixa de damascos.

Mas logo vinham os presentes mais importantes, dados por membros da família imperial. O pequeno Grão-Príncipe Mikhail Nikolaevich recebeu um violoncelo, com o qual sempre sonhara, e sua irmã Olga “um fantástico piano de cauda Wirth”.

As crianças costumavam comprar presentes para os pais com suas economias ou faziam algo à mão. “O presente que eu sempre dava ao meu pai [Alexandre III] era feito com minhas próprias mãos: chinelos vermelhos macios bordados em ponto-cruz branco. Eu adorava vê-lo usando-os!”, lembrava a Grã-Princesa Olga Alexandrovna.

Mas, em épocas de agitação comunista, a imperatriz Maria Feodorovna, nascida Dagmar da Dinamarca, presenteou seu marido, para se defender, com um revólver Smith & Wesson nº 38 e 100 balas. Na ocasião também obsequiou cada um de seus filhos com uma bela faca inglesa.

Os Romanov faziam seus súditos participar da grande alegria. Nicolau I organizou um sorteio para damas de companhia, tutores, babás, criados e outros residentes do palácio, em que cada qual tirava uma carta de um baralho, e em função dela a imperatriz lhes doava vasos, luminárias ou porcelanas.

Em 1866, a família imperial instalou uma árvore de Natal no Palácio Anichkov para 100 crianças pobres. E isso virou uma tradição anual, crescendo tanto, que em 1907 o Imperador Nicolau II visitou seis árvores apenas numa vila e outras em hospitais, escolas e até num quartel da guarda. Todos recebiam casacos, sapatos, roupas íntimas ou um vestido. Mas o czarevich, futuro Alexandre III, mandou pendurar os presentes numa árvore de Natal que devia ser desmontada para que as crianças escolhessem seu brinquedo ou presente preferido.

O chefe da guarda do palácio imperial, Alexander Spiridovich, lembra-se de ter visto:

“no centro da sala, uma árvore de Natal que chegava ao teto e era decorada com inúmeras pequenas luzes elétricas. […] Os oficiais militares se sorteavam papeizinhos com números. Então, os príncipes, o Czarevich e os oficiais verificavam os números concordantes com um pacote e os levavam para a Grã-duquesa Olga Alexandrovna, que então entregava os presentes correspondentes. […] O que deixava mais feliz o Czarevich era quando alguém ganhava um despertador. Os oficiais davam corda nele e o faziam tocar, o que o principezinho adorava”
.

 

Irmandade de Nossa Senhora do Rosário, no Rio de Janeiro (Jean-Baptiste Debret, 1826)

NATAL NO RIO DE JANEIRO IMPERIAL

A noite de Natal no Rio de Janeiro era a festa das crianças e dos pais; dos venturosos da sorte e dos escravos. O contentamento reinava por toda a parte; ricos presentes destinavam-se com prodigalidade; os escravos, de roupa nova, cumpriam alegres suas tarefas; os presépios armados, as casas iluminadas no seu interior, os móveis bem espanados, os vestidos de seda estendidos sobre as camas, anunciavam a próxima festa, que começava logo ao escurecer, segundo nos descreve Melo Morais Filho.

A Missa do Galo punha em euforia casas inteiras: velhas, moças, meninos e rapazes, ninguém dormia, ninguém se ocupava com outra coisa qualquer. Certa parte da população, porém, preferia armar o trono do Menino Jesus, passar a noite entre cantigas e danças, visitar o presépio. Nas freguesias e nos conventos, as pompas religiosas que iriam se realizar faziam sair fora dos hábitos regulares as comunidades, os vigários, o pessoal subalterno do culto.

O momento mais procurado acontecia na Capela Imperial. Apenas batia meia-noite, a multidão quase que não se podia mexer dentro da igreja; os músicos apareciam no coro, afinavam os instrumentos; as sentinelas, postadas em determinados lugares, descansavam as espingardas, cujas baionetas espelhavam os jorros da luz.

Então, as ondas do povo afastavam-se à direita e à esquerda, oferecendo passagem ao bispo, que ia solenemente oficiar. Vestido de capa de um tecido de ouro, vergado pelos anos, com a fronte coroada de mitra, portando o báculo, o príncipe da Igreja caminhava lentamente, precedido de monsenhores e cônegos, de turiferários e acólitos, de sacerdotes e diáconos, com círios acesos e cantando sagrados cânticos.

E a missa de Natal celebrava-se majestosa, porque nascera o Senhor, que “seria chamado o Admirável”. Nas diversas igrejas, não obstante serem as pompas litúrgicas menos grandiosas, não deixava de ser alto o piedoso fervor. Em outros tempos, quanta autonomia pomposa em nossos costumes! Quantas alegrias íntimas tomavam os corações!



Santo, Feliz, Abençoado e Maravilhoso Natal !



De todo coração, desejo aos diletos leitores do Blog da Família as mais sublimes graças e as bênçãos mais excelsas neste Natal e no Ano Novo que se aproxima conflituoso. Entretanto, por maiores que sejam os conflitos, protegidos pelas graças divinas nada teremos o que temer.

Para todos, junto ao Santo Presépio, suplicarei à Sagrada Família, Jesus, Maria e José, que ilumine espiritualmente seus familiares como a Estrela de Belém iluminou toda a Terra com a bela e boa nova do nascimento do Divino Infante. 

Que Ele, pela mediação de Sua Santíssima Mãe, nos transformem em “presépios” dignos de O receber. 

Mas também para que Ele, sendo a Luz do Mundo, ilumine a Civilização para que esta volte a ser realmente Cristã. Mais ainda, com um brilho como nunca houve na História da Humanidade. 

Um Santo, Feliz, Abençoado e Maravilhoso Natal e um forte abraço natalino! 

Paulo R. Campos 

PS: Como tema para melhor se meditar neste Natal reproduzirei no próximo post uma importante matéria publicada na revista Catolicismo deste mês.



22 de dezembro de 2025

É NATAL — O Divino Infante quis nascer num pobre estábulo para nos enobrecer

 

Presépio do escultor Ramón Cuenca Santo, exposto na Igreja de Nosso Padre Jesus, Múrcia, Espanha.

Noblesse oblige! — Esta expressão francesa significa que dos nobres se exige muito mais que do comum das pessoas. Deus os obriga a responsabilidades extras, exige que deem perfeito bom exemplo, que defendam seus súditos, inclusive expondo suas vidas; que sempre atuem com honra, gentileza e generosidade. Em suma, com nobreza. 

Também em relação à comemoração do Natal aplica-se o Noblesse oblige. Isto no sentido de que os nobres — assim como as elites tradicionais análogas — devem de modo muito especial procurar a excelência de todas as coisas, espelhando-se no Divino Infante, fonte de todas as perfeições. Ele, que de seu Trono no Reino do Céu desceu à Terra para salvar seus súditos, entregando sua vida humana por eles, quis nascer num pobre estábulo para os enobrecer. 

Ao longo dos 2025 anos, desde o nascimento do Menino Jesus em Belém, o Natal é celebrado no mundo inteiro e em todas as classes sociais. O que Catolicismo tem focalizado bastante. Entretanto, como pouco se fala das celebrações natalinas nas cortes entre as famílias nobres — especialmente entre aquelas destinadas por Deus a reinar sobre os povos —, nesta edição comemorativa do Santo Natal veremos como algumas monarquias o festejavam. 

Na matéria de capa da revista Catolicismo deste mês ver-se-á, por exemplo, como eram as “Missas do Galo” nas abençoadas noites das vésperas de 25 de dezembro, não apenas nas cerimônias das igrejas, mas nos palácios e castelos. Como neles eram montados os presépios; como eram os costumes tradicionais; suas cozinhas e decorações, como as árvores de Natal; as ceias régias com comidas típicas; os presentes que as famílias nobres davam aos pobres etc.

Nascido de raça real por parte de mãe e de pai, o Menino Jesus quis vir aos homens nos braços da Santíssima Virgem, e é por meio d´Ela que devemos ir a Ele. Assim sendo, supliquemos a Ela — Rainha dos anjos e dos homens, nossa Corredentora e Medianeira Universal de todas as graças — que obtenha do Príncipe da Paz as mais escolhidas bênçãos de Natal para todos os nossos assinantes e leitores, e conceda-lhes a paz e a nobreza de alma para suas atividades ao longo de 2026, que desponta em meio a um panorama internacional conflituoso. 

* * * 

Tal edição da revista é também comemorativa do nosso exemplar de nº 900! Momento de agradecer a proteção que Nossa Senhora tem concedido a Catolicismo, pois, sem arredar um milímetro sequer no bom combate católico contra-revolucionário, continua, graças a Ela, firme na defesa da civilização cristã, na luta contra os erros do comunismo e do progressismo, e na plena fidelidade ao magistério tradicional da Santa Igreja.


18 de dezembro de 2025

INÉDITA E HISTÓRICA MENSAGEM DO PRESIDENTE DOS EUA SOBRE A IMACULADA CONCEIÇÃO

 


✅  Paulo Roberto Campos 

Nos dois séculos e meio de história dos Estados Unidos, Donald J. Trump é considerado o primeiro presidente norte-americano a fazer uma saudação oficial a Nossa Senhora enquanto concebida sem pecado original, ou seja, conforme o dogma da Imaculada Conceição, proclamado pelo Papa Pio IX, em 8 de dezembro 1854, com a Bula Ineffabilis Deus.

Sem aqui tratar dos acertos ou desacertos de Trump (e são muitos os acertos e muitos os desacertos...), no dia da Imaculada, 8 de dezembro, ele fez algo surpreendentemente bem acertado: uma saudação à Virgem, na qual inseriu, no final, a Ave Maria e pediu a intercessão d´Ela pelo fim da guerra e por uma paz duradoura no mundo. 

Apesar de ele não ser católico, falou da fervorosa devoção que os católicos norte-americanos dedicam a Santa Mãe de Deus e mencionou alguns grandes personagens do país que se consagraram na devoção à Imaculada, como Santa Elizabeth Seton e outros.

Basílica do Santuário Nacional
da Imaculada Conceição, em Washington
Na mensagem presidencial, Trump mencionou também a Basílica da Imaculada Conceição, em Washington, e das quase 50 universidades americanas que levam o nome de Maria, além de numerosas igrejas, hospitais e escolas. 

No final, o presidente americano acrescentou algumas palavras em agradecimento a Ela por sua intercessão a favor dos Estados Unidos, lembrando que Ela é Padroeira da nação.

Segue a tradução da íntegra da mensagem presidencial por ocasião da Festa da Imaculada Conceição. Publicado pela The White House em Briefings & Statements /  https://www.whitehouse.gov/ 


Hoje, reconheço todos os Americanos que celebram o dia 8 de Dezembro como um Dia Santo em homenagem à fé, humildade e amor de Maria, Mãe de Jesus e uma das maiores figuras da Bíblia. 

Anunciação do Anjo a Maria,
Ambrogio Lorenzetti (c. 1290 – 1348),
Pinacoteca Nazionale de Siena, Itália.


Na Festa da Imaculada Conceição, os católicos celebram o que acreditam ter nascido Maria livre do pecado original como mãe de Deus. Ela entrou pela primeira vez na história registrada como uma jovem mulher quando, de acordo com as Sagradas Escrituras, o anjo Gabriel a saudou na pequena cidade de Nazaré com a notícia de um milagre: “Ave, cheia de graça! O Senhor está contigo”, anunciando que “tu conceberás em teu ventre e darás à luz um filho, e o chamarás de Jesus”. 

Em um dos atos mais profundos e consequentes da história, Maria aceitou heroicamente a vontade de Deus com confiança e humildade: “Eis aqui a serva do Senhor. Faça-se em mim segundo a tua palavra”. A decisão de Maria alterou para sempre o curso da humanidade. Nove meses depois, Deus se tornou homem quando Maria deu à luz um filho, Jesus, que viria a oferecer sua vida na cruz pela redenção dos pecados e pela salvação do mundo. 

Batalha de New Orleans,
pintada por Jean Hyacinthe de Laclotte,
membro da Milícia da Louisiana,
com base em seus esboços feitos no local.

Por quase 250 anos, Maria desempenhou um papel destacado na nossa grande história americana. Em 1792, menos de uma década após o fim da Guerra Revolucionária, o bispo John Carroll — o primeiro bispo católico nos Estados Unidos e primo do signatário da Declaração da Independência, Charles Carroll — consagrou nossa jovem nação à mãe de Cristo. Menos de um quarto de século depois, os católicos atribuíram a Maria a impressionante vitória do general Andrew Jackson sobre os britânicos na decisiva Batalha de Nova Orleans [quadro ao lado]. Todos os anos, os católicos celebram uma missa de ação de graças em Nova Orleans, no dia 8 de janeiro, em memória da ajuda de Maria para salvar a cidade. 

Ao longo dos tempos, personagens lendárias americanas como Elizabeth Ann Seton, Frances Xavier Cabrini e Fulton Sheen, que passaram suas vidas glorificando a Deus a serviço dos outros, mantiveram uma profunda devoção a Maria. A Basílica do Santuário Nacional da Imaculada Conceição, localizada no coração da capital de nossa nação, honra Maria como a maior igreja da América do Norte. A oração atemporal “Ave Maria” continua sendo amada por inúmeros cidadãos. 

Ela inspirou a fundação de inúmeras igrejas, hospitais e escolas. Quase 50 faculdades e universidades americanas levam o nome de Maria. E, daqui a poucos dias, em 12 de dezembro, os católicos dos Estados Unidos e do México celebrarão a devoção inabalável a Maria que se originou no coração do México — um lugar que agora abriga a bela Basílica de Nossa Senhora de Guadalupe — em 1531. À medida que nos aproximamos dos 250 anos da gloriosa Independência Americana, reconhecemos e agradecemos, com total gratidão, o papel de Maria na promoção da paz, da esperança e do amor na América e além de nossas fronteiras. 

Há mais de um século, em meio à Primeira Guerra Mundial, o Papa Bento XV, líder da Igreja Católica Romana, encomendou e dedicou uma majestosa estátua de Maria, Rainha da Paz, segurando o Menino Jesus com um ramo de oliveira, para que os fiéis cristãos fossem encorajados a seguir seu exemplo de paz, rezando pelo fim do terrível massacre. Poucos meses depois, a Primeira Guerra Mundial chegou ao fim. Hoje, voltamo-nos mais uma vez para Maria em busca de inspiração e encorajamento, enquanto rezamos pelo fim da guerra e por uma nova e duradoura era de paz, prosperidade e harmonia na Europa e em todo o mundo. 

Em sua homenagem, e em um dia tão especial para nossos cidadãos Católicos, lembramos as palavras sagradas que trouxeram ajuda, conforto e apoio a gerações de fiéis americanos em momentos de necessidade: 
Ave Maria, cheia de graça, o Senhor é convosco, bendita sois vós entre as mulheres e bendito é o fruto do vosso ventre, Jesus. Santa Maria, Mãe de Deus, rogai por nós pecadores, agora e na hora da nossa morte. Amém!

12 de dezembro de 2025

FUNÇÃO DOS SÍMBOLOS PARA VENCER



A Batalha de Rocroi – François Joseph Heim (1834). Galeria de Batalhas, Palácio de Versalhes (França).



✅  Plinio Corrêa de Oliveira


N
este quadro da batalha de Rocroi — um dos principais combates da Guerra dos Trinta Anos travado em 19 de maio de 1643 —, vemos, de um lado, os franceses, e de outro os tércios espanhóis. Os soldados de ambos os lados estão firmes no campo de batalha e não há como abrir uma brecha no meio deles. 

Os franceses estão hesitantes, e nem toda fogosidade do Duque d’Enghien — então com apenas 21 anos, e mais tarde conhecido como o Grand Condé —, são suficientes para dar o arranco necessário para abrir essa brecha nas tropas dos tércios — então considerados invencíveis, eles estavam sob o comando do general Francisco de Melo, Conde de Assumar.

O Duque d’Enghien tem nas mãos o bastão de marechal da França [foto]. Era um símbolo muito sério! No mundo anterior à Revolução Francesa, sobretudo na Idade Média, o bastão era uma insígnia de mando frequente. E o bastão de marechal de França era forrado com veludo lilás sobre o qual se imprimiam, em ouro saliente, as flores de lis da Casa de França.

O Grand Condé comandava com esse bastão. Quando ele viu que não havia meio de abrir a brecha nos soldados tércios, ele lançou seu bastão no meio deles, dizendo ao exército francês: “Vamos pegá-lo!” 

Assim, seus soldados se lançaram e conseguiram abrir a brecha nas tropas adversárias.

Este quadro representa essa cena da batalha. O Grand Condé encontrou a solução para aquela situação difícil. 

Alguém talvez dissesse o seguinte: “Esse é um recurso que se usa até em brinquedos de criança; joga-se a bola no campo adversário e diz ‘vamos pegar a bola’. Portanto, trata-se de um método psicológico muito corrente e foi utilizado”. 

Mas no caso de Condé foi porque ele era um homem-símbolo e tinha na mão um bastão muito simbólico. E quem não for capaz de ir atrás do símbolo, não é capaz de vencer. Condé arriscou a vitória e lançou o bastão, talvez pensando: “Toda a minha glória militar está sendo arriscada neste gesto, mas a vaincre sans péril on triomphe sans gloire” (a vencer sem perigo, triunfa-se sem glória). 

Ele arriscou tudo na beleza do gesto, jogando o bastão de marechal de França, bradando, eventualmente com seu cavalo levantando as patas dianteiras de modo lindo.

Nessas horas, por uma disposição da Providência, até batem nas plumas do chapéu os ventos propícios para marcarem lindamente a história e o quadro ficar completo. No arriscado gesto de jogar seu bastão de mando, ele ganhou a batalha! 

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Excertos da conferência proferida pelo Prof. Plinio Corrêa de Oliveira em 15 de março de 1977. Esta transcrição não passou pela revisão do autor.

11 de dezembro de 2025

NOSSA SENHORA DE GUADALUPE



Neste dia 12 de dezembro a Santa Igreja celebra solenemente a festa de Nossa Senhora de Guadalupe, Padroeira das Américas. 

Ela apareceu no ano de 1531, no México, ao índio asteca Juan Diego, deixando impressa a sua imagem, com os símbolos da Imaculada Conceição, no avental do índio. 

Neste episódio, mostrou Nossa Senhora uma predileção particularmente maternal para com os indígenas. Predileção essa que bem se refletiu no zelo de tantos missionários tradicionais. 

As conversões de aborígenes operadas ante a Imagem de Nossa Senhora foram incontáveis. É que a misericórdia d´Ela consistia em converter os índios e não em os deixar jazendo nas trevas do paganismo, como pleiteiam os missionários “aggiornati”. 

*   *   *
Segue o original e a tradução de uma belíssima oração a Nossa Senhora de Guadalupe. Eu a copiei de um “santinho” (na frente com uma foto d´Ela e no verso com a oração em castelhano) que Plinio Corrêa de Oliveira osculava, rezava e guardava com muita piedade. 

Pintura colonial (séc. XVIII) representando uma procissão com clérigos, fiéis e indígenas devotos, com o estandarte da Virgem de Guadalupe sendo solenemente levado sob um belo andor. O quadro, atribuído a Miguel Cabrera (1695–1768), fica exposto no Museo Soumaya, na cidade do México.



Manojito de imposibles a la Ssma. Virgen de Guadalupe 


Oh Madre mía de Guadalupe, que para Tí no hay imposibles! A Tu Corazón todo magnanimidad y dulzura, he confiado un manojito de imposibles, que bien conoces y que realmente son superiores a mis fuerzas. Problemas insolubles, dificultades insuperables, penas sin humano remedio que me torturan espantosamente, aquí están Madre mia, para que Tu hagas el imposible de que se remedien... Muestra la grandeza de Tu amor y Tu poder superando estos imposibles. 

Los traigo a Tus plantas, en la confianza, con la plena seguridad de que los remediarás porque por Tu propia dignación y por el compromiso que Tu Corazón quiso contraer en favor nuestro, esos imposibles dejarán de serlo. Sí, dejarán de serlo al influjo irresistible de Tu Bondad. Es imposible que Tu no venzas los imposibles. 

Amén 
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Buquê de impossíveis à Santíssima Virgem de Guadalupe 


Ó minha Mãe de Guadalupe, para quem não existem impossíveis! Ao vosso Coração, pleno de magnanimidade e doçura, confio um buquê (um punhado) de impossíveis, que bem conheceis e que realmente superam as minhas forças. Problemas insolúveis, dificuldades intransponíveis, penas sem remédio humano que me torturam espantosamente: aqui estão, minha Mãe, para que realizeis o impossível de vê-los remediados... Mostrai a grandeza do vosso amor e do vosso poder, superando esses impossíveis. 

Eu os trago aos vossos pés, na confiança, com plena segurança de que os remediareis, porque, por vossa própria grandeza e pelo compromisso que Vosso Coração quis assumir em nosso favor, esses impossíveis deixarão de sê-lo. Sim, deixarão de sê-lo sob o influxo irresistível de vossa Bondade. É impossível que Vós não vençais os impossíveis.

Amém!

7 de dezembro de 2025

IMACULADA CONCEIÇÃO — uma verdade de Fé, uma sacral desigualdade

 


✅  Paulo Roberto Campos 

Neste dia 8 de dezembro a Santa Igreja celebra solenemente a festividade da Imaculada Conceição de Nossa Senhora. Privilégio unicamente d´Ela que foi defendido por muitos santos e teólogos, apesar de outros considerem ser uma questão discutível e que, portanto, não seria conveniente a proclamação de um dogma declarando definitivamente como “verdade de fé obrigatória” que Ela foi Concebida sem pecado original, como ocorre com todos os homens devido à culpa — o pecado de desobediência a Deus — de nossos primeiros pais, Adão e Eva. 

Entretanto, o dogma foi proclamado pelo Papa Pio IX — com a Bula Ineffabilis Deus, de 8 de dezembro de 1854 — e ocorreu um júbilo geral entre os católicos de todas as partes do mundo. 

Esse privilégio único e maravilhoso da Santíssima Virgem foi por Jacques-Bénigne Bossuet, bispo, grande orador e escritor francês do século XVII, assim sintetizado lapidarmente, vimos n´Ela "Un enfantement sans douleur, une chair sans fragilité, des sens sans rébellion, une vie sans tache, une mort sans peine" (“Um parto sem dor, uma carne sem fragilidade, sentidos sem rebeldia, uma vida sem mácula, uma morte sem sofrimento”). 

Em memória dessa tão augusta celebração do dia 8 de dezembro, segue a transcrição de trecho de um célebre artigo de Plinio Corrêa de Oliveira, publicado na revista Catolicismo, de fevereiro/1958, no qual ele faz uma análise da missão de Nossa Senhora em nossos tempos.

“Ao definir o dogma da Imaculada Conceição, o Papa Pio IX despertou em todo o orbe civilizado repercussões ao mesmo tempo díspares e profundas. 

De um lado, em grande parte dos fiéis, a definição do dogma suscitou um entusiasmo imenso. Ver um Vigário de Jesus Cristo erguer-se na plenitude e na majestade de seu poder, para proclamar um dogma em pleno século XIX, era presenciar um desafio admiravelmente sobranceiro e arrojado ao ceticismo triunfante, que já então corroía até as entranhas a civilização ocidental. 

Acresce que esse dogma era marial. Ora, o liberalismo, outra praga do século XIX, tende por sua própria natureza ao interconfessionalismo, à afirmação de tudo o que as várias religiões têm em comum (o que em última análise se reduz a um vago deísmo), e a uma subestimação, quando não a uma formal rejeição de tudo quanto as separa. 

Assim, a proclamação de um novo dogma mariano — precisamente como ocorreu em alguns arraiais com a definição recente da Assunção — se afigurava aos interconfessionalistas ocultos ou declarados de 1854 uma séria e inesperada barreira para a realização de seus desígnios. 

Mais ainda, o novo dogma, em si mesmo considerado, chocava a fundo o espírito essencialmente igualitário da Revolução que, a partir de 1789, reinava despoticamente no Ocidente. Ver uma simples criatura de tal maneira elevada sobre todas as outras, por um privilégio inestimável, concedido no primeiro instante de seu ser, é coisa que não podia nem pode deixar de doer aos filhos da Revolução que proclamava a igualdade absoluta entre os homens como o princípio de toda ordem, de toda justiça e de todo bem. 

Aos não-católicos, como aos católicos mais ou menos infectados do espírito de 1789 [ano da Revolução Francesa], doía-lhes aceitar que Deus tivesse instalado com tanto realce, na Criação, um elemento de tão caracterizada desigualdade. 

Por fim, a própria natureza do privilégio [de Nossa Senhora como “Imaculada Conceição”] é antipática para espíritos liberais. Se alguém admite o pecado original com toda a sequela de desregramentos da alma e misérias do corpo que ele acarretou, há de aceitar que o homem precisa de uma autoridade, a cujo império tem de viver sujeito. 

Ora, a definição da Imaculada Conceição implicava numa reafirmação implícita do ensinamento da Igreja a este respeito. 

Todavia, por mais que tudo isto seja, não estava só nisto o que ousaríamos chamar o sal do glorioso acontecimento da definição do dogma. É impossível pensar na Virgem Imaculada sem ao mesmo tempo lembrar a serpente cuja cabeça Ela esmagou triunfal e definitivamente com o calcanhar. O espírito revolucionário é o próprio espírito do demônio, e seria impossível, para uma pessoa de fé, não reconhecer a parte que o demônio tem no aparecimento e na propagação dos erros da Revolução, desde a catástrofe religiosa do século XVI até a catástrofe política do século XVIII e tudo quanto a esta se seguiu. 

Ora, ver assim afirmado o triunfo de sua máxima, de sua invariável, de sua inflexível inimiga, era, para o poder das trevas, a mais horrível das humilhações. 

De onde um concerto de vozes humanas e rugidos satânicos por todo o mundo, semelhante a uma imensa e fragorosa tempestade. 

Ver que contra essa tempestade de paixões inconfessáveis, de ódios ameaçadores, de desesperos furiosos, se erguia só, e intrépida, a figura majestosa do Vigário de Cristo, desarmada de todos os recursos da Terra e fiada apenas no auxílio do Céu, era fonte, para os verdadeiros católicos, de um júbilo igual ao que sentiram os Apóstolos vendo erguer-se, na tempestade desencadeada sobre o Lago de Genesareth, a figura divinamente varonil do Salvador, a comandar soberanamente os ventos e os mares: ‘venti et mare oboediunt ei’ (Quem é este homem a quem até os ventos e o mar obedecem? - Mt. 8, 27)”.