8 de novembro de 2015

Para que servem as roupas?

"Baile da corte austro-húngara na Holburg", Viena (1904), pintura de Wilhelm Gause (1853-1916), Wien Museum.

O hábito não faz o monge, mas a casca protege o fruto


Pe. Luiz Carlos Lodi da Cruz


A feminista brasileira Sara Winter, conhecida por sua militância pró-aborto, após ter dado à luz, publicou em 14/10/2015 na sua página do Facebook um texto com o título “Eu me arrependi de ter abortado e hoje peço perdão”. Eis um trecho do que ela escreveu: 
Amanhã faz um mês que meu bebe nasceu e minha vida ganhou um novo sentido. Estou escrevendo isso enquanto ele dorme sereno no meu colo. É a melhor sensação do mundo.
Eu ensaiei este texto milhares de vezes durante meses na minha mente e talvez ele não saia tão brilhante como eu gostaria que saísse, mas o mais importante que gostaria de que chegasse a vocês é que, por favor, mulheres que estão desesperadas para abortar, pensem muito, eu me arrependi muito, não quero o mesmo destino pra vocês[1]. 
Além disso, Sara passou a criticar a ideologia de gênero, tão cara às suas colegas feministas. Em seu artigo “Meu filho é XY e sou muito feliz com isso”, de 17/10/2015, ela diz:
Algumas pessoas têm comentado aqui na page sobre o que eu acho da Teoria de gênero. 
Quero deixar claro que há mais de 1 ano eu mudei minha concepção de gênero. 
Eu não acredito que uma pessoa possa se identificar com um gênero e a partir de então pertencer a ele. Ou seja, essa ladainha de “eu sou mulher porque me sinto mulher”, eu não acredito e não apoio. [...] Não se ‘vira’ mulher quando se passa batom, coloca silicone e começa a falar fino. Ser mulher é MUITO MAIS DO QUE ISSO. Assim, como duvido muito que uma mulher que coloque roupas largas e corte o cabelo terá privilégio que homens tem, como ganhar um salário 30% maior, tem mais segurança na rua… 
Como se vê, ela admite diferenças naturais entre os sexos e não aceita que tudo se reduza ao modo de falar, de cortar o cabelo ou de se vestir. Curiosamente, ao falar da diferença no vestuário, Sara não falou aquilo que espontaneamente se falaria há algumas décadas, ou seja, que as mulheres usam saias e os homens vestem calças. Hoje parece que essa diferença deixou de existir. O que ela vê de diferente é que os homens usam “roupas largas”, o que implica que as mulheres usam roupas justas ou apertadas. 

Qual a função das roupas? 

"Expulsão de Adão e Eva do Paraíso"
Gustavo  Dore
“Ora, os dois estavam nus, o homem e sua mulher, e não se envergonhavam” (Gn 2,25). Antes do pecado original, Adão e Eva gozavam de um dom chamado integridade. Por esse dom, os sentidos e os instintos estavam harmoniosamente submissos à razão. A visão do corpo do outro, mesmo de seus órgãos reprodutores, não era capaz de causar excitação, a menos que a vontade consentisse segundo a reta razão. Por isso, não havia necessidade de se cobrir o corpo. 

Depois do pecado original, a integridade se perdeu. Adão e Eva “descobriram” que estavam nus e se envergonharam. A partir daí, os instintos rebelaram-se violentamente contra a razão, sobretudo o instinto sexual. A virtude da castidade — que é o controle desse instinto — passou a exigir muita luta e vigilância. Foi necessário cobrir o corpo. 

Adão e Eva, envergonhados, cingiram-se (cobriram a cintura) com folhas de figueira (Gn 3,7). Deus, porém, não achou tal cobertura suficiente, e deu-lhes túnicas de peles de animais, para que se vestissem (Gn 3,21). 

Hoje, portanto, as roupas são necessárias para se conservar a castidade. De fato, se não cobríssemos o corpo, o instinto carnal gritaria tanto, com sede de prazer, que a razão ficaria obscurecida, incapaz de conhecer a alma.
A pureza exige o pudor. Este é parte integrante da virtude da temperança. O pudor preserva a intimidade da pessoa. Consiste na recusa de mostrar aquilo que deve ficar escondido (Catecismo da Igreja Católica, 2521).
A diversidade de roupas masculina e feminina tem um fator cultural, mas não é um produto exclusivo da cultura. Homens e mulheres têm corpos diferentes e essa diferença natural influi sobre o modo de vestir que convém a cada sexo. A mulher tem a pelve (bacia) mais larga e o osso sacro mais curto e mais largo. O motivo dessa disposição óssea é abrigar o bebê durante a gravidez. Daí a conveniência de que as roupas femininas sejam largas na altura dos quadris. Por esse motivo, durante séculos consolidou-se o uso de saias pelas mulheres. De fato, a saia adapta-se perfeitamente ao corpo da mulher não apenas com decência, mas com uma particular elegância.

Não se pode dizer o mesmo da calça. Raramente se encontra
uma calça suficientemente folgada para ser decente em um corpo feminino. Hoje, com a generalização do uso da calça jeans pelas mulheres, verifica-se o que foi observado por Sara: enquanto os homens usam “roupas largas”, as mulheres, em sua grande maioria, vestem calças tão apertadas, que o costume de vestir-se imodestamente causou a perda do senso do pudor.

Em 12 de junho de 1960, o Cardeal de Gênova, Giuseppe Siri, escreveu uma “Notificação relativa às mulheres que vestem roupas de homem”[3], referindo-se ao recente uso de calças compridas por moças e senhoras de sua Diocese. Dizia o Cardeal que esse tipo de roupa, geralmente colada ao corpo, dava-lhe a mesma preocupação que as roupas que expõem o corpo. Mas a imodéstia das calças não era o único problema para o Cardeal. Mais grave que isso, o uso de roupas masculinas causava uma alteração da psicologia da mulher, levando-a a querer “ser igual ao homem” e a competir com ele, por considerá-lo mais forte, mais livre e mais independente. Assim, ela via sua feminilidade como inferioridade, e não como diversidade. Além disso, ao usar roupas iguais às do seu marido, a mulher eliminava um dos sinais externos da diversidade dos sexos. E isso tenderia a corromper as relações entre os sexos. 

Parece que o Cardeal já estava pressentindo como o uso de calças pelas mulheres favoreceria a difusão da ideologia de gênero e seus postulados, em particular o da anulação das diferenças sexuais. 


Hoje assistimos a um movimento semelhante, no sentido inverso: homens advogando o direito de usar saias, a fim de libertar-se da “ditadura da calça”. Em 2008, o jornal francês Liberation noticiava a existência da Associação Homens de Saia (Hommes en Jupe). Seu fundador, Dominique Moreau, defendia a “emancipação masculina”, reivindicando o “direito de dispor plenamente do próprio corpo, nos moldes da liberação feminina”[3]. 

Tudo isso nos faz lembrar o que dizia o saudoso Bispo de Anápolis Dom Manoel Pestana Filho: “O feminismo trouxe, primeiro, a masculinização da mulher; depois, a feminização do homem; por fim, a bestialização de ambos”.

Anápolis, 6 de novembro de 2015. 
Pe. Luiz Carlos Lodi da Cruz 


_______ 

[1] https://www.facebook.com/sarawinter13/posts/418933078317145:0 
[2] Cf. HAMMOND, Colleen. Dressing with Dignity. TAN, Charlotte, 2005. Appendix 3. 
[3] http://cultura.estadao.com.br/noticias/geral,homens-franceses-defendem-o-direito-de-usar-saia,172777

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