350 anos da histórica visão do adorável Sagrado Coração de Jesus a Santa Margarida Maria Alacoque, durante a qual revelou promessas extremamente valiosas a todos os católicos.
✅ Paulo Roberto Campos
Junho é por excelência o mês dedicado ao Sagrado Coração de Jesus. O deste ano o é ainda mais especialmente, pois se completam 350 anos da memorável visão sobrenatural, conhecida como a “Grande Aparição”, d’Ele a Santa Margarida Maria Alacoque (1647-1690), freira da Ordo Visitationis Beatissimae Mariae Virginis (no Brasil, mais conhecida como Ordem das Visitandinas), fundada por São Francisco de Sales e Santa Joana Francisca Frémyot de Chantal em 1610.
No dia 16 de junho de 1675, estando Santa Margarida Maria em seu mosteiro de Paray-le-Monial (na região da Bourgogne, França), Jesus, apontando para o seu próprio Coração, apareceu-lhe e disse:
“Eis aqui o Coração que tanto amou os homens, que não poupou nada até esgotar-se e consumir-se, para testemunhar-lhes seu amor; e, por reconhecimento, não recebe da maior parte deles senão ingratidões, por suas irreverências, sacrilégios e pelas indiferenças e desprezos que têm por mim no Sacramento do amor [a Sagrada Eucaristia]. Mas o que me é ainda mais penoso é que corações que me são consagrados agem assim.
“Por isso, Eu te peço que a primeira sexta-feira depois da oitava do Santíssimo Sacramento seja dedicada a uma festa especial para honrar meu Coração, comungando-se neste dia e fazendo-lhe um ato de reparação, em satisfação das ofensas recebidas durante o tempo que estive exposto nos altares. Eu te prometo também que meu Coração se dilatará para distribuir com abundância as influências de seu divino amor sobre aqueles que lhe prestem culto e que procurem que este lhe seja prestado.”[1]
A Basílica e o Mosteiro do Sagrado
Coração de Jesus em Paray-le-Monial.
Nosso Senhor prometeu a ela, “discípula”[2] de seu Coração Sagrado, que concederia a graça da penitência final, no último momento da vida, a todos aqueles que durante nove meses seguidos comungarem na primeira sexta-feira de cada mês. Ou seja, não morrerão em pecado mortal, recebendo a garantia da salvação eterna. Esta é a palavra dada por Ele como penhor de uma boa morte, conhecida como a “grande promessa”, que há três séculos e meio fez o Sagrado Coração de Jesus em Paray-le-Monial. É claro, nem precisaria dizer, mas nunca é demais recordar, que ninguém se salva automaticamente. Para se obter a salvação eterna há também a exigência de não se transgredir os 10 Mandamentos da Lei de Deus. Ou, tendo transgrido algum dos preceitos divinos, arrepender-se sinceramente dos pecados cometidos, fazendo uma boa confissão com o firme propósito de nunca mais voltar a cometê-los.

Santa Margarida Maria Alacoque

Celebração litúrgica do Sagrado Coração de Jesus
No mesmo ano da mencionada aparição de Nosso Senhor (1765) à santa freira Visitandina, o Papa Clemente XIII (pontificado de 1758 a 1769) aprovou a festa do Sagrado Coração de Jesus para algumas dioceses; depois foi estendida a toda a Igreja pelo Bem-aventurado Papa Pio IX (1846 - 1879) com o decreto da Congregação dos Ritos, de 23 de agosto de 1856. Em 11 de junho de 1899, Leão XIII consagrou todo o gênero humano ao Sacratíssimo Coração de Jesus. Pio XI, em 1928, definiu a festa do Sagrado Coração como a característica de nossos tempos.
A solene festividade litúrgica do Sagrado Coração de Jesus celebra-se sempre na sexta-feira que segue a Oitava de Corpus Christi (neste ano, no dia 27 de junho). Desse modo, a Igreja a estabeleceu como uma extensão da comemoração de Corpus Christi (celebrada neste ano em 19 de junho). No dia 28 do mesmo mês, celebramos o Imaculado Coração de Maria, comemorado no calendário católico tradicional no dia 22 de agosto.
O Sagrado Coração há de salvar o mundo
Atendendo ao pedido feito pela Irmã Maria do Divino Coração (1863-1899) — condessa de Drostezu Vischering, superiora da Congregação de Nossa Senhora da Caridade do Bom Pastor, que recebera revelações de Jesus —, o Papa Leão XIII (1878-1903) fez a solene Consagração do mundo ao Sagrado Coração de Jesus, acompanhado dos bispos de todo orbe, em 11 de junho de 1899, pouco depois da publicação da Encíclica Annum Sacrum (25 de maio de 1899). Ato de Consagração que o Papa classificou como sendo a maior obra de seu pontificado (vide no quadro da p. XX a fórmula da consagração escrita por Leão XIII).
No final da quinta parte do livro Em Defesa da Ação Católica (1943), de Plinio Corrêa de Oliveira, citando o Papa Pio XI, lemos:
“Nosso predecessor de feliz memória, Leão XIII, comprazia-se justamente, em sua Encíclica Annum Sacrum, com a admirável oportunidade do culto para com o Sagrado Coração de Jesus; por isto, não hesitava ele em dizer:
“‘Quando a Igreja, ainda próxima de suas origens, gemia sob o jugo dos Césares, uma cruz apareceu no céu a um jovem imperador [Constantino, 272 - 337]; ela era o presságio e a causa de um insigne e próximo triunfo. Hoje, um outro símbolo divino, presságio felicíssimo, aparece a nossos olhos: é o Coração Sacratíssimo de Jesus, encimado pela Cruz e resplandecendo com um brilho incomparável no meio das chamas. Devemos colocar nele todas as nossas esperanças; é a ele que devemos pedir a salvação dos homens, é dele que é preciso esperá-la’” (Encíclica Miserentissimus Redemptor, de 8 de maio de 1928).
E o Prof. Plinio comenta:
“Fala-se muito em ‘idade nova’ — ‘tempos novos’ — ‘ordem nova’. Queiram-no ou não o queiram nossos adversários, essa ‘idade nova’ será o reino do Sagrado Coração de Jesus, sob cuja suavíssima influência o mundo encontrará o único caminho de sua salvação. “Adoremos este Coração Sagrado, no qual a iconografia católica nos mostra a Cruz do sacrifício, da luta, do combate, da austeridade, assentando suas raízes no mais perfeito dos Corações, e iluminada pelas chamas purificadoras e deslumbrantes do amor.”[3]
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Altar de Santa Margarita Maria Alacoque, com a urna com suas relíquias, na capela da Visitação de Paray-le-Monial |
“Sagrado Coração de Jesus e Maria”
Para melhor aquilatarmos a excelência dessa incomparável devoção ao adorável Coração de Jesus, recomendamos a leitura do artigo que segue. Nele, Plinio Corrêa de Oliveira expõe magistralmente a situação da sociedade decadente devido à crueldade, ao egoísmo e à dureza e frieza de coração do geral de nossos contemporâneos. E afirma que, para extirpar tais males, a salvação encontra-se na devoção ao Sagrado Coração de Jesus que arde de amor infinito pela humanidade, e que, apesar de nossas misérias, está sempre disposto a perdoar misericordiosamente, sobretudo se pedirmos a mediação do Imaculado Coração de Maria.
Concluímos afirmando com São João Eudes, fundador da Congregação de Jesus e Maria, que os Corações de Jesus e de Maria são um só, inseparáveis; de tal modo unidos pela fornalha ardente do Espírito Santo, que o santo fundador os invocava no singular: “Sagrado Coração de Jesus e Maria”.
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Notas: 1. Sainte Marguerite Marie, Sa vie écrite par elle-même, Edições Saint Paul, Paris, 1947, pp. 70-71. Imprimatur de M. P. Georgius Petit, Bispo de Verdun.
2. Essa confidente do Sagrado Coração de Jesus certa vez assinou com seu próprio sangue: “Irmã Margarida Maria, discípula do Divino Coração do Adorável Jesus”. A fim de melhor conhecer sua vida, vide Catolicismo, nº 498, junho/1992: https://catolicismo.com.br/Acervo/Num/0498/p01.html
3. Em Defesa da Ação Católica, Plinio Corrêa de Oliveira, 2ª edição, Artpress, São Paulo, 1983, pp. 335-336.
SAGRADO CORAÇÃO DE JESUS
Esforcemo-nos para que essa devoção triunfe autenticamente em todos os lares, em todos os ambientes e, sobretudo, em todos os corações. Só assim conseguiremos reformar o homem contemporâneo.
✅ Plinio Corrêa de Oliveira
Legionário, N.º 458, 22 de junho de 1941
Insistentemente, tem os Santos Padres recomendado que a humanidade intensifique o culto que presta ao Sagrado Coração de Jesus a fim de que, regenerado o homem pela graça de Deus e compreendendo que deve ser Deus o centro de seus afetos, possa reinar novamente no mundo aquela tranquilidade da ordem, da qual mais distante estamos, quanto mais o mundo descamba pela anarquia.
Assim, não poderia um jornal católico deixar despercebida a festa que há dias transcorreu do Sagrado Coração. Não se trata apenas de um dever de piedade imposto pela própria ordem das coisas, mas de um dever que a tragédia contemporânea torna mais tragicamente premente.
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Não há quem não se alarme com os extremos de crueldade a que pode chegar o homem contemporâneo. Essa crueldade não se atesta apenas nos campos de batalha. Ela transparece a cada passo, nos grandes e nos pequenos incidentes da vida de todo o dia, através da extraordinária dureza e frieza de coração com que a generalidade das pessoas trata seus semelhantes. As mães em cujas entranhas decresce de intensidade o amor pelos filhos; os maridos que atiram à desgraça um lar inteiro, com o único intuito de satisfazer seus próprios instintos e paixões; os filhos que, indiferentes à miséria ou ao abandono moral em que deixam seus pais, voltam todas as suas vistas para a fruição dos prazeres desta vida; os profissionais que se enriquecem às custas do próximo, mostram muitas vezes uma crueldade fria e calculada, que causa muito mais horror do que os extremos de furor a que a guerra pode arrastar os combatentes.
Realmente, se bem que na guerra os atos de crueldade se possam mais facilmente aquilatar, os que os praticam tem, se não a desculpa, ao menos a atenuante de que são impelidos pela violência do combate. Mas aquilo que se trama e se realiza na tranquilidade da vida quotidiana não pode muitas vezes beneficiar-se de igual atenuante. E isto sobretudo quando não se trata de ações isoladas, mas de hábitos inveterados que multiplicam indefinidamente as más ações.
A guerra, tal qual ela é hoje feita, é um índice de crueldade, mas está longe de ser a única manifestação da dureza moral contemporânea.
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Quem diz crueldade diz egoísmo. O homem só prejudica seu próximo por egoísmo, por desejar beneficiar-se de vantagens a que não tem direito. Assim, pois, o único meio de extirpar a crueldade consiste em extirpar o egoísmo.
Ora, a teologia nos ensina que o homem só pode ser capaz de verdadeira e completa abnegação de si mesmo quando seu amor ao próximo é baseado no amor de Deus. Fora de Deus não há, para os afetos humanos, estabilidade nem plenitude. Ou o homem ama a Deus a ponto de se esquecer de si mesmo, e neste caso ele saberá realmente amar o próximo; ou o homem se ama a ponto de se esquecer de Deus, e, neste caso, o egoísmo tende a dominá-lo completamente.
Assim, é só aumentando nos homens o amor de Deus, que se poderá conseguir deles uma profunda compreensão de seus deveres para com o próximo. Combater o egoísmo é tarefa que implica necessariamente em “dilatar os espaços do amor de Deus”, segundo a belíssima frase de Santo Agostinho.
Ora, a festa do Sagrado Coração de Jesus é, por excelência, a festa do amor de Deus. Nela, a Igreja nos propõe como tema de meditações e como alvo de nossas preces o amor terníssimo e invariável de Deus que, feito homem, morreu por nós. Mostrando-nos o Coração de Jesus a arder de amor a despeito dos espinhos com que O circundamos por nossas ofensas, a Igreja abre para nós a perspectiva de um perdão misericordioso e largo, de um amor infinito e perfeito, de uma alegria completa e imaculada, que devem constituir o encanto perene da vida espiritual de todos os verdadeiros católicos.
Amemos o Sagrado Coração de Jesus. Esforcemo-nos por que essa devoção triunfe autenticamente (e não apenas através de alguns simbolismos da realidade) em todos os lares, em todos os ambientes e, sobretudo, em todos os corações. Só assim conseguiremos reformar o homem contemporâneo.
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“Ad Jesum per Mariam”. Por Maria é que se vai a Jesus. Escrevendo sobre a festa do Sagrado Coração, como não dizer uma palavra de comoção filial ante esse Coração Imaculado que, melhor do que qualquer outro, compreendeu e amou o Divino Redentor? Que Nossa Senhora nos obtenha algumas faíscas daquela imensa devoção que tinha ao Sagrado Coração de Jesus. Que Ela consiga atear em nós um pouco daquele incêndio de amor com que Ela ardeu tão intensamente, são nossos votos dentro desta oitava suave e confortadora.
Consagração do gênero humano ao Sacratíssimo Coração de Jesus, texto redigido pelo Papa Leão XIII
Ó Jesus dulcíssimo, ó Redentor do gênero humano, olhai para nós, humildemente prostrados diante de vosso altar. Nós somos vossos, e vossos queremos ser, e para poder viver mais estreitamente unidos a Vós, eis que cada um de nós, hoje, se consagra ao vosso sacratíssimo Coração. Muitos não Vos conheceram; muitos, desprezando os vossos mandamentos, repudiaram-Vos.
Ó benigníssimo Jesus, tende misericórdia tanto de uns quanto de outros; e todos os que atraís ao vosso santíssimo Coração. Ó Senhor, sede o rei não só dos fiéis que nunca se afastaram de Vós, mas também dos filhos pródigos que Vos abandonaram; fazei que eles voltem, quanto antes, à casa paterna, para não morrerem de miséria e de fome.
Sede rei dos que vivem no erro ou que por discórdia estão separados de Vós: chamai-os ao porto da verdade e à unidade da fé, para que, dentro em breve, haja um só rebanho sob um só pastor. Sede finalmente o rei daqueles que estão envolvidos nas superstições dos pagãos, e não recuseis tirá-los das trevas para a luz e o reino de Deus.
Concedei, ó Senhor, incolumidade e liberdade segura à vossa Igreja, concedei a todos os povos a tranquilidade da ordem: fazei que de uma extremidade à outra da Terra ressoe esta única voz: sejam dados louvores àquele Coração divino do qual nos veio a salvação; a ele a glória e a honra pelos séculos dos séculos. Assim seja!
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