26 de setembro de 2023

MIL ANOS DA ABADIA DO MONT-SAINT-MICHEL



Erguido em uma pequena ilha em frente à costa da Normandia, suspenso entre a terra e o mar, o Mont-Saint-Michel, com sua abadia beneditina, incorporou a tensão religiosa do início da Idade Média. Suas profundas raízes espirituais foram preservadas até hoje, passando altaneiro pelo turbilhão de dez séculos de história.

 

  Samuele Maniscalco

Mont-Saint-Michel, Normandia: há inegavelmente algo de prodigioso nesse lugar. Uma montanha que se transformou em uma ilha, mantendo o mistério de sua singularidade em um cenário fascinante, onde a terra e a água parecem interagir, alterando a conformação de um território em mutação, mas que resistiu aos desafios do homem e das forças da natureza por milênios.

Essa ilha-santuário é um dos lugares mais visitados de toda a Europa. Com um perímetro de 960 metros e uma extensão de sete hectares, a ilha se eleva 92 metros acima do mar. O ponto mais alto é a estátua de São Miguel, visível à distância do mar.

A origem desse extraordinário lugar sagrado remonta à visão que o Bispo de Avranches, Saint Aubert, teve do Arcanjo Miguel em 706.1 Nesse canto da Normandia, o prelado foi convidado pelo mensageiro celestial a construir uma igreja no Monte Tombe.

Terceira aparição de São Miguel Arcanjo
 a Saint Aubert
A vida cotidiana de Saint Aubert era cheia de dificuldades, pois grande parte de sua diocese estava coberta pela vasta e densa floresta de Scissy, que só terminava no litoral, onde uma série de pequenos vilarejos se desenvolvia. Essa floresta impenetrável e perigosa era refúgio de um povo não muito devoto.

Saint Aubert suspeitava que os povos selvagens que viviam lá não abandonariam suas antigas práticas idólatras. Os cultos pagãos sobreviviam, concentrados principalmente em duas curiosas colinas que se elevavam acima das árvores — o Monte Dol e o Monte Tombe —, onde às vezes ainda eram acesas fogueiras em homenagem aos antigos deuses solares. Saint Aubert tentou remediar essa situação. Até encontrou alguns eremitas e monges dispostos a viver na floresta e nas encostas do Monte Tombe. Mas isso não foi suficiente para expulsar o demônio do paganismo.

 

Crânio do santo com o furo feito pela ação do Arcanjo

Aparição do Arcanjo Sao Miguel a Saint Aubert

Numa noite, Saint Aubert sonhou com o Arcanjo Miguel lhe dizendo: “Aubert, consagra-me o Monte Tombe. Quero que construas um santuário para mim como o da minha montanha em Gargano. Farei dele a minha morada”. Saint Aubert acordou profundamente perturbado, mas acima de tudo relutante. Ele era um homem de ação, não de sonhos místicos. Além disso, estava tão preocupado com a questão da floresta de Scissy e do Monte Tombe que atribuía ao seu sonho uma explicação natural: a impossível erradicação do paganismo que o assombrava mesmo durante o sono. Em nenhum momento considerava que seus pensamentos sobre a consagração da montanha a São Miguel poderiam ter vindo do Céu....

Os dias se passaram e o bispo tentava não pensar duas vezes no sonho. Já estava quase esquecido dele quando, em uma noite, o mesmo sonho reapareceu; só que dessa vez São Miguel encontrava-se visivelmente descontente e o repreendeu pela falta de zelo em atendê-lo.

Ao acordar, o prelado, ainda mais perturbado do que da primeira vez, convenceu-se de que era vítima tanto de orgulho doentio quanto de obsessão diabólica. Assim, continuou sem agir. Dias e semanas se passaram. Quando achou, por fim, que havia recuperado a serenidade, São Miguel lhe apareceu uma terceira vez. Desta feita muito carrancudo, repreendeu-o por sua incredulidade e anunciou que deixararia um sinal de sua visita. Em seguida, colocou seu dedo indicador na têmpora do prelado incrédulo. Este acordou de repente e, embora sem ferimentos visíveis, teve a sensação de que algo perfurara seu crânio.2

A demonstração foi suficiente: o bispo Aubert agora estava determinado a dar plena satisfação ao grande Arcanjo. Começou imediatamente a trabalhar na limpeza e nas fundações da igreja, que pretendia construir da mesma forma que a basílica de Gargano, o primeiro santuário ocidental dedicado ao culto do Arcanjo. E para provar que uma construção dependia da outra, antes que a obra principal fosse concluída, enviou dois jovens monges a Siponto, na Itália, para pedirem ao bispo de lá uma parte das relíquias sagradas deixadas por São Miguel, a saber, uma pequena placa de mármore na qual o espírito celestial havia deixado suas pegadas, e um fragmento de um belo tecido roxo, muito semelhante ao manto de um oficial da cavalaria romana.

 

Saint Aubert começa a construção da Abadia (iluminura medieval)

A fúria diabólica e a intervenção de São Miguel

Os monges iniciaram sua peregrinação, que levaria mais de dois anos para ser concluída. O bispo de Siponto demonstrou compreensão e honra, aquiescendo na entrega de algumas relíquias. Se os frades tinham dúvidas sobre a origem delas, os milagres realizados ao longo da rota de retorno os tranquilizaram. Doentes eram curados milagrosamente! Eles não viam a hora de chegar ao Monte Tombe para informar Saint Aubert de seu sucesso. Já estavam perto, mas pararam de repente, atônitos, petrificados: não reconheciam mais nada. Apesar da certeza de que voltaram para casa, não conseguiam encontrar a paisagem que lhes era familiar.

Capela de Saint Aubert no Mont-Saint-Michel
A imensa floresta de Scissy desaparecera; os pequenos vilarejos costeiros deram lugar a um penhasco íngreme e nu e a uma vasta extensão de areia branca, exposta pela maré baixa e atravessada por riachos que a faziam brilhar ao sol. Ao longe, no mar, numa pequena ilha exposta ao ataque das ondas, erguia-se o Monte Tombe, sobrevivente de um desastre que os dois monges peregrinos, atônitos, não ousavam imaginar.

Interior da capela
Quando os religiosos se juntaram aos dois monges que retornavam de sua missão, lhes contaram sobre o cataclismo que havia ocorrido seis meses antes, responsável por essas mudanças extraordinárias. Era março de 709.3 Numa noite escura e tempestuosa, a chuva caía torrencialmente e nada podia ser visto a um passo de distância. De repente ouviu-se, emergido das profundezas da terra, o rugido de um terremoto, e o Monte Tombe balançou sobre os seus alicerces.

Parecia o fim do mundo. Os monges e o bispo agarraram-se ao altar, certos de que sua última hora havia chegado. E, horrorizados, contemplaram centenas de animais selvagens — lobos, cobras, gaviões-pardais — invadirem a montanha, buscando refúgio. A costa se afundara no mar, a linha costeira descera abaixo do nível do oceano, e a maré, a grande maré do equinócio da primavera, inundara o que havia sido o continente. A floresta de Scissy ficara submersa, e os monges viram árvores arrancadas sendo carregadas como galhos pela correnteza.

Toda essa demonstração de poder dos elementos parecia ter apenas um alvo: o Monte Tombe. Chuva, mar, raios e terremotos convergiram para a ilhota poupada, determinados a engoli-la. Saint Aubert entendeu. Ao dedicar o monte a São Miguel, ele desencadeara a ira implacável de Lúcifer. Invocou, então, a ajuda do Arcanjo. Ela veio imediatamente. A tempestade se acalmou, o mar recuou; a montanha flutuou como a Arca de Noé, em uma paisagem apocalíptica.

O Monte Tombe começou então a ser chamado de Mont-Saint-Michel — Monte São Miguel. Sua notoriedade foi imediata. Em 710, o rei Gildebert III, da dinastia merovíngia, consagrou seu reino a ele.

 

Vista de conjunto da Abadia

O Mont Saint-Michel resiste a diversos ataques

Interior da abadia 
Quando Saint Aubert morreu, as relíquias de São Miguel permaneceram com os cônegos incumbidos pelo santo bispo de zelar pelo local, os quais tinham por missão rezar o Ofício Divino e receber os peregrinos. Mas, alheios à austeridade da época da fundação, eles foram motivo de escândalo. O duque da Normandia, Ricardo I, pôs fim a esses abusos trazendo para o santuário monges beneditinos da abadia de Saint-Bedrille. Sob o comando do abade Maynard, foi iniciada a construção da igreja românica de duas naves de Notre-Dame-sous-Terre. Parcialmente destruída por um incêndio em 992, sobre ela se ergueu a atual abadia românica, iniciada em 1017 sob a direção do arquiteto Ranulphe de Bayeux e concluída, exatamente há mil anos, em 1023.

Incêndios e reconstruções subsequentes deram à igreja da abadia um estilo original, que combina harmoniosamente elementos arquitetônicos de diferentes períodos: a base data do século XI, os corredores são cobertos por uma abóbada construída um século depois, enquanto o coro e a torre pertencem ao período gótico tardio.


Entre 1154 e 1186 a abadia viveu uma época de ouro, sob a liderança do abade Robert de Torigny. Sábio e erudito, ele foi capaz de despertar entre seus irmãos o amor pelas letras e, em particular, pela arte da iluminação. Também realizou extensas reformas arquitetônicas, modificando a entrada da igreja a fim de obter maior isolamento entre os monges e os já numerosos peregrinos. Com vistas a dotar sua obra de certa grandiosidade, construiu duas torres em frente à fachada da igreja, unidas por um amplo pórtico.

Em uma nova reconstrução, dirigida pelo abade Jourdain entre 1203 e 1228, foi erguida a chamada “Maravilha”, a parte gótica da abadia. Ela consiste em duas alas, uma oriental e outra ocidental, ambas sustentadas por poderosos contrafortes fundados na rocha, atingindo uma altura de 32 metros. A distribuição dos espaços internos é diferente: a ala oeste contém um dos mais belos claustros da França [quadro acima], a partir do qual se tem acesso à ala leste por uma galeria que conecta o claustro ao refeitório. A “Maravilha” é dividida em três andares sobrepostos: no inferior estão a capelania e os celeiros; no intermediário o quarto de hóspedes e o dos cavaleiros da Ordem de Saint-Michel — a antiga sala de trabalho dos monges —; e, finalmente, no superior, ao nível da igreja, o refeitório. Como em outros edifícios góticos do mesmo período, a luz é tratada como um elemento vivo, suscetível a mudanças.

Livro que relata a heroica defesa de
 Louis d’Estouteville contra os ingleses
que tentaram tomar o Mont-Saint-Michel, em 1427.
Em 1316, durante a Guerra dos Cem Anos, os exércitos ingleses ocuparam Tombelaine, criando uma fortaleza que ameaçava a integridade do Mont-Saint-Michel, fiel à Coroa francesa. Após uma trégua de quase setenta anos, as hostilidades recomeçaram. Robert Jolivet se esforçou então em preparar a cidade para um estado de sítio, aumentando suas defesas e construindo uma imensa cisterna de água potável.

Acreditando que a causa francesa estava perdida, Jolivet aliou-se aos ingleses e se tornou amigo e conselheiro do rei da Inglaterra para a Normandia. Louis d’Estouteville tomou então as rédeas da situação, e por sete longos anos monges e cavaleiros resistiram ao cerco inglês. Em 10 de novembro, o coro da igreja desmoronou sob o fogo da artilharia inimiga. No entanto, em 1427, em uma operação bem-sucedida, d’Estouteville infligiu uma pesada derrota ao exército inglês. Duas bombas foram capturadas e ainda estão preservadas na abadia sob o nome de michelettes. Mas o intrépido defensor não se deixou embriagar pelo sucesso e acrescentou um novo elemento ao complexo de Châtelet: uma estrutura retangular com ameias que forçou os ingleses a se submeterem a seu fogo nas proximidades da cidadela. O ano de 1450 marcou o fim da Guerra dos Cem Anos e a libertação definitiva do Mont Saint-Michel.

 

Escudo da família Estouteville

A Revolução Francesa não poupa o Mont Saint-Michel

Altar de São Miguel que se encontra
 na igreja de São Pedro, dentro das muralhas
No início do século XVII, o Cardeal de Béville decidiu introduzir uma reforma de São Maurício na abadia. Os novos monges abandonaram o dormitório e mudaram suas celas para o refeitório, dividindo o salão em dois e introduzindo alterações estruturais infelizes. Além disso, em 1780, a fachada românica, que ameaçava cair, foi demolida e substituída pelo modesto portal neoclássico que pode ser visto na plataforma oeste.

A Revolução Francesa pegou Saint-Michel em pleno declínio, fazendo-o objeto de saques durante os quais suas relíquias sagradas foram profanadas. Em 1791, os últimos monges foram expulsos da abadia, que se tornou uma prisão: mais de 300 padres que rejeitaram a constituição civil do clero foram presos lá a partir de 1793. Setenta anos depois, em 1863, a prisão foi fechada por decreto imperial, e a abadia finalmente devolvida ao culto, sendo ocupada pelos monges de Saint-Edme de Pontigny. Em seguida, começaram os trabalhos de reconstrução do Mont-Saint-Michel, que duraram até boa parte do século XX. A “cereja no chantilly” desses ingentes trabalhos foi a colocação, na agulha do Mont-Saint-Michel, de uma estátua dourada do Arcanjo, de quatro metros de altura. Aquela agulha é obra de Eugène Viollet-le-Duc (1814-1879) — o genial arquiteto que projetou também a flecha da Catedral de Notre-Dame de Paris. Em 1966, uma pequena comunidade monástica beneditina se estabeleceu na abadia, substituída em 2001 pela Fraternidade Monástica de Jerusalém.4

 

Estátua dourada do Arcanjo São Miguel, de quatro metros de altura, na agulha do Mont-Saint-Michel. Agulha desenhada por Eugène Viollet-le Duc, o genial arquiteto que projetou também a flecha da Catedral de Notre-Dame de Paris. 

Milagres e a incrível peregrinação de meninos

O Mont-Saint-Michel é um local privilegiado de milagres. Desde 709, sob a orientação do Arcanjo, Saint Aubert fez jorrar da ponta de sua cruz uma fonte de água pura, essencial para a sobrevivência dos cônegos da ilhota. A fonte tem o poder de curar febres.

Em 1050 e 1263 os religiosos ouviram os serafins cantarem o Kyrie eleison, enquanto figuras de fogo giravam em torno do altar. Na sexta-feira, 3 de novembro de 1452, por volta das 21 horas, um raio explodiu, iniciou-se uma intensa tempestade de granizo e uma chama ardente se difundiu em faíscas ao redor do sino. O mosteiro inteiro foi iluminado. O fenômeno culminou meia hora depois com um raio ainda mais poderoso do que os outros.

O Monte também foi testemunha de um fenômeno surpreendente e misterioso, sem precedentes nos grandes santuários cristãos: grupos de crianças em procissões intermináveis cruzando a baía para venerar o Arcanjo. Eles apareceram pela primeira vez em 1333, pouco antes do início da Guerra dos Cem Anos. Por que trinta mil crianças, algumas delas com apenas nove anos de idade, faziam essa jornada? Alguns afirmaram que era a vontade de Deus, outros disseram que vozes os haviam ordenado a fazer a peregrinação. Elas partiram para lá de repente, às vezes sem avisar os pais, formando grupos que cresciam de vilarejo em vilarejo.

A gravura representa a chegada de peregrinos alemães ao Mont-Saint-Michel.

O frade dominicano Pierre Herp relatou a partida de 1.100 crianças alemãs em julho de 1450. As Memórias de Colônia narram que, em 1455, “houve uma impressionante procissão para o Monte de São Miguel, na Normandia, uma peregrinação que durou cerca de dois anos e consistiu em crianças de oito, nove, dez e doze anos de idade, de vilas, cidades e aldeias da Alemanha, Bélgica e outras regiões. Elas se reuniam em grandes grupos, deixando os pais e as famílias para trás; a procissão era conduzida por faixas representando São Miguel... Esses pequenos peregrinos se comportaram dignamente e receberam comida e bebida ao longo do caminho. Quando chegaram ao Monte de São Miguel, apresentaram seus estandartes ao Arcanjo”.

A única coisa que posso dizer: incrível e magnífico!



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Notas:

Fonte: Editorial da e Revista Catolicismo, Nº 873, Setembro/2023

1.        Para falar sobre ele, baseamo-nos principalmente no que o Pe. Marcello Stanzione escreveu sobre esse santuário em seu livro Pellegrino tra i santuari dell'Arcangelo Michele - La linea angelica (Peregrino entre os santuários do Arcanjo Miguel - A linha angelical).

2.        Salvo da profanação revolucionária em 1793, o crânio de Saint Aubert tem, na verdade, um buraco muito semelhante a uma cicatriz de furadeira. Quando a relíquia foi examinada por um médico, este afirmou não encontrar nenhuma explicação natural ou científica para o fenômeno.

3.        O mesmo ano em que a primeira igreja foi provavelmente consagrada.

4.        Fraternidades Monásticas de Jerusalém é o nome de dois institutos religiosos de direito diocesano, um masculino e outro feminino, fundados em 1975 pelo padre francês Pierre-Marie Delfieux e reconhecidos em 1996 pelo cardeal Jean-Marie Lustiger, Arcebispo de Paris.

25 de setembro de 2023

ARTE DE SUBIR E DE DESCER ESCADAS

 

Luís XIV recebe, sob o olhar da corte, Luís de Bourbon, Príncipe de Condé (Le Grand Condé), no Grand Escalier de Versalhes, após a sua vitória em Seneffe, em 1674 – Jean-Léon Gérôme (1824-1904). Musée d’Orsay, Paris. 

✅  Plinio Corrêa de Oliveira 

Poder-se-ia definir escada como uma série de degraus que nos permite, calcando os pés, passar de um andar ao outro; enquanto elevador nos permite o acesso de um andar ao outro por via mecânica. 

Os arquitetos, ainda com ares da antiga arte, procuravam dar às escadas certa nobreza. Elas deviam ter alguma coisa de ornamental, de tal maneira que, como tudo aquilo que serve ao homem, esconda ou colabore a não se pensar na miséria humana, mas, pelo contrário, realce algo do homem. 

A mais elementar das ideias é a de que uma escada serve para subir e para descer, duas operações que podem mostrar a miséria, mas também a grandeza do homem. Tudo quanto o cerca deve respeitá-lo e ele deve viver cercado de respeito, mesmo o mais modesto dos homens. Ser respeitado vale muito mais do que ser querido. 

Então, até mesmo uma escada deve ser feita para cercar o homem de respeito, porque tudo aquilo de que ele se serve deve ter elementos que realcem algumas excelências da natureza dele, e disfarcem algumas misérias da condição humana. 

Descer ou subir escadas com a leveza do minueto 


Subir ou descer escadas cria problemas que eu chamaria quase de teatrais, quase uma encenação. Quando um homem sobe uma escada, ele sobe lutando contra a lei da gravidade. E no final de uma escada alta pode aparecer um sinal da miséria humana: o cansaço. 

Antes do pecado original, o homem operava sem cansaço — o trabalho era indolor, agradável, interessante. Mas depois do pecado original o trabalho passou a ser difícil, a lei da gravidade começou a pesar, e vivemos batalhando contra o chão. Uma das manifestações da vitória sobre a lei da gravidade é o minueto; durante essa dança o homem e a dama pisam como se fossem plumas.

Esses comentários nos dão oportunidade de sentir o gosto de refletir. Um modo de refletir seria abrir um tratado sobre o raciocínio, mas isto não daria inteiramente o gosto da reflexão. Outro seria, por exemplo, refletir sobre o modo de subir e descer escadas, que pode ter a leveza de um minueto, e cogitar que esse modo pode acentuar no homem aquilo que nele é mais semelhante a Deus. Assemelhar-se a Deus é a honra suprema, é o fim último, é o bem extremo. 

Subindo ou descendo uma escada, as pessoas podem no final acabar por manifestar que fizeram algum esforço. É o tributo que a natureza cobra, ainda que na melhor flor da juventude, devido aos efeitos do pecado original. 

Ademais, quem sobe uma escada, sente outro aspecto da miséria humana: as pessoas que estão em baixo, vistas de cima, parecem menores do que são. E não é agradável serem vistas assim. Os personagens que nós respeitamos, gostamos de vê-los em cima! 

O descer de uma escada é outra operação na qual, como em tudo que o homem faz, pode igualmente transparecer a miséria humana. Se ela não desce com leveza, vista de baixo, pode dar a impressão de uma degringolada que está decaindo, caso não desça com dignidade. 
Palazzo Madama, em Turim. O “Scalone Juvarriano”, Escadaria de Honra dedicada às Princesas Reais. 


Disfarçar o esforço, como uma homenagem à virtude 

Há portanto uma arte de subir e de descer escada. Tanto quanto as circunstâncias permitem, deve-se fazê-lo disfarçando o esforço, fazê-lo com elegância. Pelo respeito que o homem tem para consigo e para com os outros, ele deve procurar velar a sua própria miséria. Tendo pudor de sua própria miséria, ele deve saber disfarçar o esforço, como uma homenagem à virtude. 

Manter a compostura exige esforço sobre si, é uma homenagem que os lados fracos do homem prestam àquilo que ele deveria ser se não fosse o pecado original. Pode ser belo e nobre subir ou descer uma escada e esta deve servir de cenário digno para que o homem possa fazer isso de modo distinto. E isto tanto numa habitação modesta quanto nos palácios. 

Nos palácios deve ser uma glorificação esse tipo de ação, porque muito mais do que na residência comum, eles são a residência da glória. O palácio é o lugar onde reside a glória, é a habitação proporcionada com a glória e deve dar a possibilidade, a uma pessoa que queira, de gloriosamente descer e subir suas escadarias, feitas para enobrecer. 

Ninguém tem o direito de fazer coisas de modo vil 

Em tese é mais glorioso subir. O sol quando sobe até o horizonte vai mostrando mais a sua glória; quando ele desce, vai velando essa sua glória nos crepes da noite! As operações do homem são feitas na presença de Deus e dos homens. Assim, é verdade que subir com glória uma escada é uma coisa muito bela aos olhos d’Ele. 

Aos olhos dos homens, é mais belo saber descer as escadarias. Porque quem sobe é visto de cima para baixo e quem desce é visto de baixo para cima. E para mostrar a sua própria glória, mostra-se melhor a quem está embaixo. Mas é preciso saber descer sem orgulho. Quer dizer, a pessoa deve descer a escada com glória quando tem direito a ela; descer com distinção quando está numa situação distinta ou é uma pessoa distinta; deve descer com correção pelo simples fato de ser uma criatura humana.

É sumamente incorreto descer dando a impressão de que vai cair e que perdeu o controle de si mesmo. Como a lei da gravidade puxa o homem para baixo, aquele que se precipita dá a impressão de que se entregou, que é um vencido, um destroço que rola. Se ele tem de descer a escada depressa, deve tomar uma atitude bem clara de que está com pressa, mas se mostrar inteiramente senhor de si, com a cabeça e o tronco tesos e eretos. 

Assim se desce a escada com correção e não de modo vil. Ora, nenhum homem tem o direito de fazer coisas de modo vil. Hoje tanto se fala de “dignidade humana”, mas com uma noção errada. A noção verdadeira se apagou, mas ela é a luz do homem! 

Quando a pessoa tem o direito a uma situação distinta, pela idade ou pelas circunstâncias, deve descer a escada compassadamente. De maneira que a pessoa em baixo perceba claramente todas as fases da operação; avançar o pé, colocar e pôr o outro, para aquele que a vê note que está descendo com superioridade de espírito, fazendo bem aquilo, mas pensando numa coisa mais elevada. 

É horrível descer uma escada olhando para os degraus, ou para quem está embaixo como quem dissesse: "Sei que sou um colosso!". Pelo contrário, deve — pelo olhar e pela atitude, à medida que vai se aproximando de quem está embaixo — fazer sentir mais a sua ação de presença, de maneira que, ao chegar bem perto, a ação de presença se torne plena, não dando a impressão de que apenas chegou um corpo, como pacote de carnes e ossos, mas chegou uma alma. 

Alguém poderia me objetar: "Essa consideração é bagatela". Respondo: Acho que viver é saber analisar as coisas, o contrário é vegetar. 
Escadarias do Palácio Ducal, dos Doges de Veneza


Escada — imagem da hierarquia na escala social 

Notem a entrada desse palácio [foto acima]. Nos antigos palácios, o andar nobre não era o térreo, mas o andar de cima. Os convidados distintos entravam primeiro em um saguão onde havia uma escadaria monumental que dava acesso aos salões revestidos com belas pinturas e esculturas. 

Convém que a escadaria de um palácio seja larga, pois convém à largueza e grandeza de toda ação nobre o requerer do homem e da senhora a arte de subir e de descer. Era a preocupação de dignificar a natureza humana, tanto nos nobres quanto nos plebeus; todos são dignificados com a grandeza. 

Um espírito igualitário não pode gostar dessas escadas, pois elas representam a imagem da hierarquia na escala social, na escala de valores. Escala e escada não são variantes? A escada serve de suporte para a escala social. O contrário disso é a escada rolante do metrô...



A escada mais nobre, a escada das escadas 

Qual foi o personagem que subiu escada com mais nobreza, majestade, dignidade e esplendor? Foi um personagem perseguido, humilhado, fustigado, desprezado, coberto de feridas do alto da cabeça até a planta dos pés. Foi condenado à morte, mas diante dele todo joelho deve dobrar-se: Nosso Senhor Jesus Cristo! Tudo o que Ele fez foi infinitamente humilde e infinitamente nobre, mesmo nas situações mais próprias a significar opróbrio, desprezo, repúdio e humilhação. 

Podemos imaginá-Lo subindo com os três Apóstolos o monte Tabor [quadro abaixo], onde houve a Transfiguração. No alto a glória O esperava. Em cada passo algo O glorificava. Os Apóstolos, atônitos, encantados, sem saber o que dizer, subindo atrás d’Ele. 

Podemos imaginá-Lo subindo as escadas do pretório de Pilatos. Digno, afirmativo, seguro de Si, olhando Pilatos de cima para baixo com uma tristeza de Pai, mas ao mesmo tempo com a majestade de um Deus. 

Essa foi a escada mais nobre que eu conheci. Não a subi com os meus pés, mas de joelhos. É a Scala Santa [foto acima], que fora transportada de Jerusalém para Roma. Nosso Senhor a subiu durante a sua Paixão, quando foi julgado e condenado. Hoje os peregrinos a sobem de joelhos. 

Para não desgastar seus degraus de mármore, ela está recoberta de madeira. Mas nos pontos do mármore onde há gotas do precioso Sangue de Jesus há óculos com revestimento de vidro para que os peregrinos possam ver, oscular e recitar as orações. Eles refazem de joelhos o caminho que os pés divinos feridos subiram por amor a todos nós. Essa é a escada das escadas! 

Podemos também imaginá-Lo de modo sublime subindo a colina do Calvário com a Cruz às costas rumo ao sacrifício supremo. Acompanhado por Simão de Cirene, que ajudou a carregar a Cruz, pelas santas mulheres e, sobretudo, por Nossa Senhora. Ninguém tem ideia da nobreza dessa subida! 
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Excertos da conferência proferida pelo Prof. Plinio Corrêa de Oliveira em 25 de junho de 1983. Esta transcrição não passou pela revisão do autor. O título e os subtítulos foram inseridos pela redação.

14 de setembro de 2023

NOSSA SENHORA DAS DORES


15 de setembro
. Celebração instituída pelo Papa Pio VII em 1814, em substituição a duas outras muito antigas, para rememorar as dores da Corredentora do gênero humano. Neste dia os católicos lembramos a Mater Dolorosa e reparamos as suas Sete Dores. 

Mãe das Dores, sim, pois Deus, cujo nascimento vindouro era a razão do próprio nascimento da Virgem, deverá ser neste mundo o homem das dores e do sofrimento, conforme o Profeta Isaias: “Era desprezado, era a escória da humanidade, homem das dores, experimentado nos sofrimentos; como aqueles, diante dos quais se cobre o rosto, era amaldiçoado e não fazíamos caso dele. Em verdade, ele tomou sobre si nossas enfermidades, e carregou os nossos sofrimentos: e nós o reputávamos como um castigado, ferido por Deus e humilhado” (Is 53, 3). 

A quem comparar-Vos? Jeremias, o profeta das lamentações, fala que a aflição de Maria era grande e profunda como o mar: “A quem te comparar, filha de Jerusalém? Quem irá salvar-te e consolar-te, ó virgem, filha de Sião? É imensa como o mar tua ruína: quem poderá curar-te?” (Jer., Lamentações 2, 13). 

No Calvário, a montanha do Sacrifício, como Mãe, Ela ofereceu o Filho; como esposa do Espírito Santo, ofereceu-se com Jesus; por seus sofrimentos de esposa e de mãe, ela foi a co-redentora do gênero humano. 

A profecia do velho Simeão, a fuga para o Egito, a perda do Menino Jesus em Jerusalém, o carregamento da Cruz, a Crucifixão, a descida da Cruz, o sepultamento de Jesus, são os sete mistérios em torno dos quais Nossa Senhora se agrada de ver agrupados os aspectos quase infinitos dos sofrimentos, que dela fizeram a Rainha dos Mártires, a primeira rosa e a mais bela do campo de Deus. (Cfr. Dom Prosper Guéranger, L'Année Liturgique –– Le temps apres la Pentecôte, Maison Alfred Mame et Fils, Tours, 1922, Tome V).

10 de setembro de 2023

ACEPÇÕES DO ADJETIVO REACIONÁRIO”


  Plinio Corrêa de Oliveira 

O qualificativo de “reacionário” é elogioso ou ultrajante? Ora essa — responderá algum leitor progressista —, claro que é ultrajante! 

A meu ver, a resposta é simplista. Com efeito, reacionário é quem reage. O que seria do mundo se ninguém reagisse contra o erro, o mal, a ignorância, a pobreza, a doença etc.? Há reações boas e necessárias. Os que as praticam são reacionários beneméritos.

Assim, a palavra “reacionário” não tem um sentido necessariamente mau. Antes, pelo contrário, pode comportar acepções altamente elogiosas. 

É bem verdade que a propaganda progressista tem dado a esse vocábulo um colorido terrível — mais fácil de ser explicado por meio de comparações do que de definições — e que em alguns ambientes se tornou indissociável dele. 

Assim é que, no linguajar progressista, seria tipicamente reacionário quem desejasse para sua pátria uma ditadura onipotente, na qual todos os direitos dos particulares dependessem de um só dirigente. Este teria o poder de dispor como entendesse do trabalho e da produção de todos. 

Poderia indicar tarefas e horários à vontade. Alterar costumes a seu bel-prazer. Intervir até na religião, marcando, por exemplo, ou deslocando, a seu talante, festas religiosas, como a Páscoa ou o Natal. Diante deste quadro insofismavelmente lúgubre, o progressista se põe a uivar, a falar de tirania, nazismo etc. 

Em consequência, Fidel Castro — em rigor de lógica — deveria ser qualificado como um reacionário arquetípico, para os progressistas. Não, porém. Porque o progressista de bom grado absolve em favor da esquerda ações que — por vezes com razão — ele critica quando praticadas pela direita (ou pseudo-direita, note-se). 

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Excertos do artigo de Plinio Corrêa de Oliveira, publicado na “Folha de S. Paulo” em 9 de novembro de 1969.

8 de setembro de 2023

LULA PROMETE MUITO E NÃO CUMPRE NADA

 

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante cerimônia de lançamento do demagógico programa "Brasil sem Fome", em Teresina (PI) no dia 31-8-2023. [Foto: Ricardo Stuckert/ PR]

  Paulo Roberto Campos

Ao iniciar a redação deste post, havia colocado outro título: LULA MENTE SEM FICAR VERMELHO. Como dá no mesmo, e como ele já é “vermelho”, deixei o título em epígrafe.

Assim como todos socialistas, o PT é um partido de promessas não realizadas. 

No último dia 31 de agosto, em Teresina, no lançamento do programa “Brasil sem fome” [foto acima], Lula da Silva soltou mais uma “pérola” ao dizer: “Alguns podem comer dez vezes por dia, e outros ficam dez dias sem comer”. Tanto a primeira quanto a segunda afirmação são falsas, ninguém come dez vezes por dia e ninguém fica dez dias sem comer. Uma afirmação apropriada na boca de um demagogo ou de alguém que bebe dez vezes por dia... 

Desde 21 de janeiro de 2003, primeiro dia de seu governo, Lula fala em tirar o Brasil do “mapa da fome”, fazendo uma “distribuição justa de renda”, de onde a necessidade de retirar do rico para distribuir ao pobre. 

Por que então o Brasil — segundo a demagogia lulista — está no “mapa da fome”? — Simplesmente porque Lula não fez nada do que prometeu, pois 20 anos se passaram desde que ele se tornou presidente. Se tivesse feito, até os extremamente pobres estariam comendo normalmente pelo menos cinco vezes por dia. Se não estão, a culpa só pode ser de um partido socialista, que se diz “dos trabalhadores”, que governou o Brasil por 20 anos e não tirou o País do alegado “mapa da fome”. Quem acreditará, neste novo mandato, nas novas (as mesmas) promessas do governo lulo-petista?

É impossível o pobre ficar rico com qualquer programa governamental para retirar o dinheiro dos ricos. Como um colega jornalista me disse ironicamente, o sistema socialista é ótimo para transformar os ricos em pobres, os pobres em miseráveis e os governantes em milionários...

Melhor ainda disse o Papa Pio XI: “Os pobres são as maiores vítimas dos embusteiros, que exploram sua miserável condição, para lhes despertar inveja contra os ricos e excitá-los a tomar para si, pela força, aquilo que lhes parece injustamente recusado pela fortuna.” (Pio XI, Divini Redemptoris, Vozes, Petrópolis, p. 31).

A respeito, no final, seguem mais alguns pensamentos que pobres e ricos devem reter, os primeiros para não serem mais iludidos e os segundos para não ficarem pobres. 

Graças a Deus, parece que povo está percebendo o embuste das falsas promessas petistas. Sintoma disso foi a comemoração despovoada, sem aplausos e silenciosa do recente 7 de setembro — havia muitos militares e autoridades, mas do povão mesmo, muito pouco. 

Como o povo está proibido vaiar, protestar e se manifestar, ele se cala. Seu silêncio é eloquente. Donde o adágio francês “Le silence des peuples est la leçon des rois” (O silêncio dos povos é a lição dos reis). É o instrumento que o povo — a “maioria silenciosa” — dispõe para demonstrar a impopularidade e o descontentamento ao seu rei, no caso brasileiro, ao seu presidente. 

* * *      


“Se os socialistas entendessem de economia, não seriam socialistas”. 

 (Friedrich Hayek) 


“O mundo será socialista ou será cristão; não será liberal. Se o liberalismo não sucumbir ante o catolicismo, que é sua negação, sucumbirá ante o socialismo, que é sua consequência”. 

(Louis Veuillot) 


“O socialismo dura enquanto durar o dinheiro dos outros”. 

(Margaret Thatcher) 


“Quem é a favor do mundo socialista, da Rússia, ou da China, ou de Cuba, é também a favor do Estado assassino”. 

(Nelson Rodrigues) 


“No meu dicionário, ‘socialista’ é o sujeito que alardeia intenções e dispensa resultados, adora ser generoso com o dinheiro alheio e prega igualdade social, mas se considera mais igual que os outros...” 

(Roberto Campos) 


“Ninguém pode feitorizar fazenda alheia sem prestar contas rigorosas à gerência”. 

(Eça de Queirós) 


“É bem típico da mentalidade socialista negar o espírito e pôr o dinheiro acima de tudo. As razões morais não existem; nem o decoro, nem a compostura. Trata-se de tosquiar todos os setores da população, por todos os modos possíveis”.

(Plinio Corrêa de Oliveira)


7 de setembro de 2023

NATIVIDADE DE NOSSA SENHORA


N
este dia 8 de setembro celebramos o aniversário da Santíssima Virgem, nascida na Santa Casa de Nazaré, a mesma que foi transladada pelos Anjos, no século XIII, para a cidade de Loreto na Itália. Nascida para que d´Ela nascesse Nosso Senhor Jesus Cristo. 

Em memória deste grandioso dia reproduzimos alguns versos de Souza Caldas feitos em homenagem a Nossa Senhora. 

DEPRECACÃO À VIRGEM 

Esposa do Deus vivo, Templo augusto 
Do Senhor que governa os Céus e a Terra, 
Escuta os meus gemidos, e do abismo 
Do pecado a minha alma desenterra. 

Ó das filhas dos homens a mais bela, 
Em cujo seio, amigas se abraçaram 
A justiça e a demência, e pelos homens 
Com vínculo divino se ligaram. 

Mãe do meu Deus, refúgio esperançoso 
Do pecador aflito, vem depressa 
Em meu socorro contra o vil imigo, 
Que de bramir em roda nunca cessa. 

Lembra-te que na cruz cruel, o sangue 
Se verteu do teu Filho angustiado, 
Para as chagas lavar torpes e impuras 
Do pecador que a culpa tem manchado. 

Ó doce pensamento, que derramas 
Lisonjeira esperança no meu peito, 
E a proteção benigna me asseguras 
Daquela a quem o Céu vive sujeito.

2 de setembro de 2023

Um milênio de história da fabulosa abadia do Mont-Saint-Michel, um símbolo da Civilização


Fonte: Editorial da e Revista Catolicismo, Nº 873, Setembro/2023

Exatamente há 1000 anos, no feérico Mont-Saint-Michel foi concluída a construção da abadia medieval, com algumas edificações românicas e outras góticas. Fora iniciada no século VIII por Saint Aubert, bispo de Avranches, como fruto bendito de uma aparição do Arcanjo São Miguel. Naquele local sagrado, em comemoração desse milênio, uma série de exposições históricas, conferências e concertos musicais serão apresentados neste ano.

Aquele maravilhoso monumento, no cume do rochedo que brota altaneiro no Canal da Mancha, na Normandia, é um dos dez lugares históricos mais visitados da França, atraindo anualmente 1,3 milhão de turistas. É um dos locais da Cristandade mais procurados para peregrinações. 

Grandes lances da epopeia da França transcorreram naquela cidadela murada do Mont-Saint-Michel, sempre protegida pelo Gloriosíssimo Príncipe dos Exércitos Celestes, São Miguel, a quem o lugar é consagrado e marcado indelevelmente com uma estátua dourada do Arcanjo, revestido de armadura, empunhando espada e esmagando o dragão infernal [foto ao lado].

A fabulosa estátua, de quatro metros de altura, é obra do escultor francês Emmanuel Frémiet (1824-1910). Concluída em 1897, ela foi instalada no vértice da flecha projetada por Eugène Viollet-le Duc (1814-1879), o mesmo arquiteto que construiu a imponente flecha da Catedral de Notre-Dame de Paris.

Dos fatos prodigiosos que se passaram nesse local — muito apropriadamente denominado Merveille du Monde Occidental —, podemos lembrar, por exemplo, aqueles durante a “Guerra dos 100 anos” (entre a França e a Inglaterra), no final da Idade Média. Esses e outros temas relacionados com a “Maravilha do Mundo Ocidental”, a ilha-rochedo e a abadia-fortaleza, nossos leitores conhecerão melhor na matéria de capa da revista Catolicismo deste mês [foto no topo], de autoria de nosso colaborador na Itália, Samuele Maniscalco. 

Ainda em tal edição, o leitor encontrará outra matéria relacionada aos Anjos, escrita por Luis Dufaur, assíduo colaborador da supracitada revista de cultura e atualidades, na qual ele expõe um tema muito conhecido na América espanhola, mas quase ignorado no Brasil: o dos “Anjos Arcabuzeiros” [quadro ao lado], devoção e escola artística que teve origem entre os índios católicos da região peruana de Cuzco, e sua vinculação com a vocação do nosso Continente. 

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* Para fazer uma assinatura da revista Catolicismo envie um e-mail para: catolicismo@terra.com.br


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Aqueles que desejarem assistir a transladação e recolocação da estátua de São Miguel Arcanjo no topo da flecha da Abadia do Mont-Saint-Michel vejam o vídeo abaixo. Esta tocante e perigosa operação ocorreu em 2016 após a restauração e redouramento da magnífica estátua feita por Emmanuel Frémiet em 1897.

1 de setembro de 2023

Oração pelo triunfo da Fé Católica


[Composta por Dom Athanasius Schneider, Bispo Auxiliar da Arquidiocese de Santa Maria em Astana, no Cazaquistão] 


Deus onipotente e eterno, Pai, Filho e Espírito Santo, prostrados diante de Vossa Majestade agradecemos do fundo de nossa alma pelo dom inestimável da fé católica, que Vos dignastes revelar-nos por meio de Jesus Cristo, verdadeiro Deus e verdadeiro homem. Recebemos esta luz divina no santo batismo e Vos prometemos manter esta fé inviolada até a morte. 

Aumentai em nós o dom da fé católica. Que por Vossa graça ela se fortaleça e se torne inabalável. Aumentai diariamente em nós a compreensão da beleza e profundidade da fé católica, para que possamos viver na profunda alegria de Vossa verdade divina e estar prontos para antes sacrificar tudo, do que fazer compromissos nesta fé ou traí-la. Concedei-nos a graça de estarmos decididos a sofrer mil mortes por um único artigo do Credo. 

Recebei de bom grado o nosso ato de humilde reparação por todos os pecados cometidos contra a fé católica pelos leigos e clérigos, especialmente pelos altos clérigos que, contrariando a promessa solene que fizeram na sua Ordenação de serem mestres e defensores da integridade da fé católica, se tornaram campeões da heresia, envenenando o rebanho a eles confiado e ofendendo gravemente a Divina Majestade de Jesus Cristo, a Verdade encarnada. 

Concedei-nos a graça de ver todos os acontecimentos da nossa vida, e as imensas provações que nossa santa Mãe Igreja está agora passando, na luz sobrenatural da fé. Fazei-nos acreditar que Vós fareis surgir do vasto deserto espiritual de hoje um renovado florescimento da fé, que adornará o jardim da Igreja com novas obras de fé e dará origem a uma nova era de fé. 

Cremos firmemente que a fé católica é a única verdadeira fé e religião, que Vós convidais cada pessoa a abraçar livremente. Pela intercessão da bem-aventurada Virgem Maria, a destruidora de todas as heresias, e dos grandes mártires e confessores da fé, possa a fé santa, católica e apostólica triunfar novamente na Igreja e no mundo, para que nenhuma alma se perca, mas antes, chegue ao conhecimento de Jesus Cristo, o único Salvador da humanidade, e, mediante uma fé reta e uma vida justa, alcance a bem-aventurança eterna em Vós, ó Santíssima Trindade, Pai, Filho e Espírito Santo. A Vós seja dada toda honra e glória pelos séculos dos séculos. 

Amém!