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Tendo o STF julgado a constitucionalidade das pesquisas com células-tronco embrionárias — na lamentável sessão do dia 29 de maio último —, agora o Supremo prepara-se para julgar a constitucionalidade da prática abortiva.
Ademais, na Câmara dos Deputados, a Comissão de Constituição e Justiça e a Comissão de Direitos Humanos, estão novamente discutindo maneiras para se conseguir, por meio de subterfúgios, a legalização do aborto no Brasil, apesar da histórica rejeição do aborto por 33 votos contrários. [vide http://blogdafamiliacatolica.blogspot.com/2008/05/unanimidade-contra-o-aborto-33-x-0.html ] E apesar também de a imensa maioria da população brasileira ser contrária ao aborto. Mesmo assim, os abortistas não param, querem impor o aborto de qualquer jeito.
Arlindo Chinaglia, presidente da Câmara, informou que esse tema somente seria votado no plenário após se ter esgotado os debates entre anti-abortistas e abortistas. A Ministra de Políticas para as Mulheres, Nilcéa Freire, e o Ministro da Saúde, José Gomes Temporão — ambos ferrenhamente favoráveis ao aborto — já se articulam para influenciar em tais debates, tentando “justificar” o que é injustificável.
Não nos desarticulemos também, estejamos sempre atentos a fim de agir contra a legalização do assassinato de inocentes — por assim dizer, a descriminalização do infantício.
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A revista Catolicismo [ www.catolicismo.com.br ], em sua edição deste mês, publicou uma muito oportuna entrevista com o médico português, Dr. Daniel Serrão, docente aposentado da Faculdade de Medicina do Porto, professor de Bioética e Ética Médica na Universidade Católica, no Porto e em Lisboa. Cientista conhecido no mundo inteiro, é membro da Academia de Ciências de Lisboa, da Academia Portuguesa de Medicina e da Academia Pontifícia para a Vida.
O Prof. Dr. Daniel Serrão responde questões que alguns leitores deste Blog da Família têm levantado — como, por exemplo, o problema dos traumas pós-aborto —, por isso aqui transcrevo as respostas do ilustre médico, entrevistado de Catolicismo:
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Catolicismo — No ano passado, Portugal tornou o aborto legal por meio de um referendo popular. No seu entender, faltaram mais pessoas do ambiente católico e de outros setores da sociedade para defender a posição contra o aborto? O Sr. poderia narrar como se deu essa consulta popular, e quais os frutos da aprovação da lei?
Prof. Dr. Daniel Serrão — Perdemos o referendo por uma escassa margem na contagem
global dos votos; mas em muitas mesas de voto e em muitas regiões, ganhamos, e até com maiorias importantes. Tal como no referendo anterior, oito anos antes, nas zonas onde se constituiu um movimento organizado e coerente a favor do não, ganhamos. Só que, no referendo anterior, o cômputo global foi-nos favorável, igualmente por pequena margem, e muitos pensaram que a guerra estava ganha, quando só tínhamos vencido uma batalha.
Quem ganhou, de fato, tanto num como no outro referendo, foi a abstenção: mais da metade dos portugueses não votou. Sendo Portugal um país de grande maioria de católicos, tenho de concluir que, num momento da maior gravidade, em que estava em causa a vida humana, os católicos ficaram em casa, atraiçoando a sua fé. E tenho de concluir que a Igreja institucional, os seus pastores e os seus sacerdotes não souberam chamar os católicos à responsabilidade de não se absterem. Porque, seguramente, nenhum dos adeptos do sim ficou em casa no dia da votação.
A nova lei é a mais laxista da Europa. A mulher grávida decide livremente fazer-se abortar num hospital público, sem encargos, até a 10ª semana de gravidez; ou numa clínica privada de abortos (duas destas empresas espanholas de matar crianças ao abrigo da lei se instalaram logo em Portugal) que tenha acordo com o Serviço Nacional de Saúde, o qual paga o aborto por uma tabela convencionada, que obviamente dá lucro à empresa abortista.
Não se conhecem ainda números oficiais de abortos já realizados, mas os adeptos do sim andam inquietos, porque parece que são menos do que esperavam. Tenho exigido publicamente que esses números sejam divulgados, para que se possa, com segurança, fazer uma análise dos efeitos da lei. E espero conseguir esses números.
Catolicismo — Que conselho o Sr. daria, como médico, como católico e como pai de família, a uma jovem que o procurasse manifestando dúvida se pratica ou não um aborto?
Prof. Dr. Daniel Serrão — Daria o conselho que tenho dado muitas vezes: não assumas a responsabilidade de decidir em nome de uma vida que não é a tua; o que está dentro de ti é uma vida nova que apela a viver, e tu tens de ouvir esse apelo, que é biológico antes de ser humano. Nenhum dos motivos pelos quais me dizes que queres abortar vai ficar resolvido com o aborto, e tu vais comprar uma guerra contigo própria, que te vai acompanhar ao longo de toda a tua vida.
Não uso argumentos de cariz religioso, porque quem tenha verdadeira fé nunca colocará, a si própria, a possibilidade de se fazer abortar, sejam quais forem as situações da gravidez. Nem mesmo em casos de violação brutal.
Catolicismo — Que papel uma santa e médica –– como Santa Gianna Beretta Molla, que preferiu ter o filho, apesar da recomendação de ordem terapêutica para abortar –– pode representar como exemplo para as mulheres nos dias de hoje?
Prof. Dr. Daniel Serrão — Representa o apelo às virtudes heróicas que devem ser sempre apresentadas à juventude, porque ela é sensível à heroicidade e à dedicação absoluta a ideais, que são vividos até às últimas conseqüências. Infelizmente, à medida que a idade avança, o pragmatismo leva ao enfraquecimento da paixão pelos valores superiores; e os exemplos, como os de Santa Gianna, são menos eficazes.
Catolicismo — Em sua experiência médica, que traumas e conseqüências o aborto pode causar nas mulheres que o praticam?
Prof. Dr. Daniel Serrão — O mais grave, conforme a minha experiência, é a persistência, na memória afetiva, de um sentimento de profunda angústia existencial, que torna a vivência comum muito difícil. Tive um caso grave de suicídio iminente, que só foi controlado com tratamento psiquiátrico especializado durante quase um ano. Uma jovem de 17 anos, que se fez abortar de uma gravidez resultante de uma relação incestuosa consentida, ficou totalmente inibida de ter vida sexual. O aborto de tóxico-dependentes torna a recuperação da dependência muito mais difícil, parecendo que a jovem quer castigar-se pelo que fez. Mas o mais grave é que persiste a memória da decisão e do ato, muitas vezes com representação durante o sonho ou com alucinações. Uma das jovens, que obviamente não “viu” o ato de aborto feito sob anestesia, descrevia com profundo sofrimento a morte do seu filho, com os pormenores que lhe apareciam nos sonhos. A sua angústia era tão profunda, que necessitou de tratamento psicológico durante quatro anos. Na minha experiência, nenhuma mulher se recupera completamente de um ato de aborto. Há uma ferida biológica que muito dificilmente cicatriza.
Catolicismo — Fala-se muito que a legalização tem como finalidade combater os abortos clandestinos. No seu entender, essa é uma razão real?
Prof. Dr. Daniel Serrão — É uma falsa e hipócrita razão. É evidente que, se todos os abortos passarem a ser feitos gratuitamente, à vontade da mulher, sem qualquer condicionalismo, deverão acabar os abortos clandestinos nos hospitais públicos, porque seriam absurdos. Mas não é isto que acontece. Em Portugal não há números fidedignos, mas os abortistas lamentam o número baixo de abortos hospitalares; e insinuam, eles próprios, que os clandestinos continuam. É claro que continuam, porque muitas mulheres que decidem fazer-se abortar, por este ou aquele motivo, desejam que esse ato lhes seja praticado de forma clandestina, e não numa enfermaria de um hospital onde toda a gente vai saber que ela está internada para fazer aborto.
Catolicismo — Na Esparta pagã, e em outras culturas afastadas do Direito Natural, praticava-se o infanticídio no caso de crianças nascidas com defeitos físicos. No caso de prosseguir a atual ofensiva contra a vida, não é de se recear que cheguemos a esse ponto?
Prof. Dr. Daniel Serrão — Sem nenhuma dúvida. Na Holanda o infanticídio é já praticado como uma extensão, tolerada pelos tribunais, da lei atual da eutanásia. De acordo com esta lei, a eutanásia deixou de ser um homicídio despenalizado, e tornou-se uma decisão dos médicos como qualquer outra. O infanticídio, por assimilação da lei, deixou de ser um crime e passou a ser, igualmente, uma decisão do médico.
Catolicismo — Muitas abortistas alegam que a mulher é dona de seu corpo, e portanto caberia a ela a escolha e o direito de abortar. O que a ciência diz a respeito disso?
Prof. Dr. Daniel Serrão — Não é preciso a ciência, basta o senso comum. É evidente que a mulher é “dona” do seu corpo e deve procurar para este, sempre, o seu melhor bem. A cirurgia estética é um bom exemplo dessa espécie de propriedade sobre o corpo. Só que o embrião em desenvolvimento durante nove meses é um corpo próprio, que se serve do corpo da mãe para se alimentar e desenvolver, e a partir de 500 gramas de peso já pode dispensar o corpo da mãe. A mãe é dona do seu corpo, mas não é dona do corpo do seu filho ou filha.
Catolicismo — Freqüentemente acusa-se a Igreja Católica de ser inimiga do progresso e da ciência. O Prof. Plinio Corrêa de Oliveira, inspirador da revista Catolicismo, sempre sustentou o contrário. Sempre ensinou que a Igreja é a grande benfeitora do autêntico progresso, da cultura e da civilização. Gostaríamos de conhecer sua opinião a respeito.
Prof. Dr. Daniel Serrão — Tinha Plinio Corrêa de Oliveira — que tive o ensejo de conhecer em uma de suas visitas a Portugal — toda a razão. O recente caso das células-tronco ou estaminais é uma demonstração eloqüente disso. A oposição da Igreja à destruição de embriões para se obterem estas células levou investigadores em todo o mundo a procurarem fontes alternativas. Essas fontes apareceram pelo trabalho científico, e hoje pode dizer-se que, para se conseguirem resultados terapêuticos, não são necessárias células tiradas de embriões, destruindo-os, já que as encontramos no líquido amniótico e no sangue do cordão umbilical.
Catolicismo — Discute-se na Supremo Tribunal Federal o tema da utilização de células-tronco embrionárias em pesquisas médicas. Em caso de aprovação por parte dos magistrados, o Sr. acha que isso trará mesmo algum avanço para o mundo científico brasileiro?
Prof. Dr. Daniel Serrão — Como acabo de responder, não há hoje necessidade de usar células-tronco de origem em embriões. No recente livro Cell Therapy, editado pela McGrawHill, e no qual tive a honra de colaborar, estão apresentados os resultados, nos diferentes campos, do uso terapêutico de células somáticas com função estaminal. No interesse dos doentes, os países que têm condições para fazer investigação com estas células devem subsidiar os ensaios com as células de adultos, pois com estas podem obter-se, em curto prazo, resultados positivos, particularmente em doenças cardíacas e do sistema nervoso.
Catolicismo — Sabe-se que em alguns países essas pesquisas com células-tronco embrionárias já se fazem há algum tempo. Divulga-se algum fruto real dessas pesquisas?
Prof. Dr. Daniel Serrão — Não há um único resultado terapêutico em seres humanos com células-tronco de origem em embriões humanos. Os principais problemas –– que são o controle da capacidade de transformação dessas células-tronco embrionárias em células tumorais, e a própria estabilidade do fenótipo de célula-tronco não diferenciada e das células diferenciadas obtidas das células-tronco –– não estão resolvidos. E sem estarem resolvidos, não se vislumbra qualquer aplicação em doentes. Pelo contrário, as células-tronco obtidas em estruturas adultas, em particular na medula óssea, há muitos anos dão resultados excelentes em leucemias e linfomas, e nos casos de neoplasias em que é necessário aplicar terapias que destroem a medula óssea. Atualmente é possível “guardar” células-tronco obtidas da criança logo após nascer, e se for necessário, usá-las anos depois, sem nenhum problema de rejeição imunológica. Se os resultados dos investigadores japoneses e americanos vierem a ser desenvolvidos com sucesso, qualquer célula do nosso organismo adulto poderá ser transformada, por engenharia de genética molecular, em célula com as características de célula-tronco embrionária.
Catolicismo — Que mensagem o Sr. gostaria de dar aos leitores de Catolicismo, para incentivá-los na luta contra a prática do aborto?
Prof. Dr. Daniel Serrão — A mensagem é só uma: aprender a ter respeito pelo corpo próprio e pelo corpo do outro. Respeito, antes de mais, biológico, pois todo corpo vivo apela a viver, e esse apelo tem de ser escutado e respeitado. A criança que está a desenvolver-se apela à mãe para viver, com a linguagem própria do equilíbrio biológico. Depois, respeito ao nível humano, porque o feto é já da nossa família humana, mesmo que ainda não fale conosco; mas vai falar em breve, e se já falasse, pediria que não fosse morto. Finalmente, respeito espiritual, porque o ser que se desenvolve no útero da mãe não é uma coisa, mas uma estrutura pessoal, que irá manifestar-se como pessoa espiritual à medida que o tempo passar.
No ato de abortar, o abortador destrói uma vida biológica, mata um corpo humano pessoal e anula a expressão de um espírito. Espírito que, para nós católicos, é a marca do Criador em nosso corpo, desde a concepção.